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Mostrando postagens de março, 2009

A um Passo da Eternidade, de Fred Zinnemann

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O beijo acalorado entre Burt Lancaster e Deborah Kerr, rolando na areia da praia, é uma das cenas mais românticas da história do cinema No começo da década de 1950, os Estados Unidos já começavam a se recompor dos traumas da Segunda Guerra Mundial, mas algumas feridas ainda não estavam cicatrizadas. Entre elas, o ataque sofrido em Pearl Harbor, um assunto dolorido para os americanos e exorcizado em A um Passo da Eternidade , filme baseado no best-seller de mesmo nome de James Jones e uma das maiores bilheterias da época. A direção é de Fred Zinnemann, que já havia cutucado a caça às bruxas do senador Joseph MacCarthy em Matar ou Morrer (1952). Em seu outro grande trabalho, o cineasta de origem austríaca filmou o cotidiano de uma base militar americana no Haví, alguns dias antes do ataque japonês. Montgomery Clift vive Robert Prewitt, um soldado que acaba de ser transferido. Boxeador talentoso, Prewitt largou o esporte após um acidente e recusa-se a voltar a lutar. Acaba ho

Notas de viagem

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Por Pedro Fernandes 1.  Na primeira viagem a Mossoró há duas semanas, um pequeno desgosto, porque não pude acompanhar na noite de 19 de março, o lançamento da 3ª edição do Jornal Trabuco e o lançamento do Projeto Caderno Sarau. O que rolou foi apenas uma curta conversa com o poeta mossoroense Gustavo Luz. Na pauta desse encontro não programado estavam assuntos pessoais e assuntos que dizem respeito à organização do Caderno de Poesia Sarau – projeto que terá lançamento junto com a quarta edição do Jornal Trabuco , prevista para maio – e ao seu livro de poesia, agora em segunda edição, sem data para relançamento, o Das máquinas . 2. A reedição de Das máquinas  tem o texto da quarta capa escrito por mim, depois de uma leitura na íntegra do conjunto de poemas; abaixo tomo a liberdade de transcrever alguns inéditos da obra. Tão logo o livro seja publicado copio por aqui o referido texto que escrevi. 3.  Desta conversa com Gustavo, outra novidade: as publicações da editora do poeta

Tempos Modernos, de Charles Chaplin

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Tempos Modernos tornou-se um dos filmes mais conhecidos de Charles Chaplin muito por causa das cenas da primeira parte da história, nas quais o personagem Carlitos aparece como empregado de uma linha de montagem que acaba sendo engolido pela máquina. O trabalho de apertar parafusos é tão repetitivo que produz no protagonista comportamentos obsessivos mesmo fora do ambiente da fábrica. Amalucado, ele passa a apertar qualquer botão que encontra pela frente, como os que vê no vestido de uma senhora que cruza a rua. A crítica à forma mecânica da exploração do trabalho em linhas de produção é evidente, mas não é a única que o filme faz. Na rua, Carlitos vê passar um caminhão, de onde cai uma bandeira, possivelmente vermelha (o filme é em preto-e-branco). Ele a pega para devolver e logo aparece, atrás dele, uma manifestação de trabalhadores. O personagem é então preso e acusado de ser comunista. Por esta e outras o filme, supostamente de conteúdo socialista, foi proibido na Alema

José de Alencar

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Em 1856 saía publicado A confederação dos Tamoios , poema do escritor Gonçalves de Magalhães. Quase que em paralelo saía uma crítica de um desconhecido. Assinava-se Ig. “[...] se algum dia fosse poeta, e quisesse cantar a minha terra e as suas belezas, se quisesse compor um poema nacional, pediria a Deus que me fizesse esquecer por um momento as minhas idéias de homem civilizado. Filho da natureza embrenhar-me-ia por essas matas seculares; contemplaria as maravilhas de Deus, veria o sol erguer-se no seu mar de ouro, a lua deslizar-se no azul do céu; ouviria o murmúrio das ondas e o eco profundo e solene das florestas. E se tudo isso não me inspirasse uma poesia nova, se não desse ao meu pensamento outros vôos que não esses adejos de uma musa clássica ou romântica, quebraria a minha pena com desespero mas não a mancharia numa poesia menos digna de meu nobre país.”* Ig era José de Alencar. E esse texto daria início a uma das mais acaloradas polêmicas da ainda nascente lite

O hábito da leitura

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Por Pedro Fernandes Ser culto é não ser curto Imaginemos viver um só dia apenas como analfabeto. Sem ler. Será que conseguiríamos? Num mundo como este, em que a leitura é fundamental, seria possível passar por tal experiência? Bom, creio que não há como ou necessidade de passarmos por essa experiência se ao menos não formos atingido por alguma dessas fatalidades neurológicas. Entretanto, conhecemos os que ainda não tiveram a oportunidade de aprender a ler e são pessoas que vivem essa experiência diariamente. Não saber ler devia ser considerado deficiência. O analfabeto vive preso apenas a um mundo e os múltiplos mundos feito com palavras só acessa pela intuição. É como andar no escuro. Agora, o Brasil padece de uma deficiência outra. Os que sabem ler não sabem o que leem. Não tiram proveito da leitura. Nesse grupo, estão aqueles que quando leem alguma obra literária, por exemplo, não sabem ou não conseguem construir um sentido que valha sobre o que leram.  Ler não é ap

Crise, crises (parte II)

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Por Pedro Fernandes Por esses dias saiu neste espaço uma fala minha sobre uma crise que anda a assolar o mundo inteiro, conhecidamente de todos, porque tem sido sobre que a maior parte dos jornais e telejornais tem falado ultimamente, a crise econômica. Haveremos de concordar que esta é uma das muitas crises que vem atormentando a tão frágil organização humana. Mas junto com ela vem ou já estavam várias outras crises. Há a crise financeira. Há a crise política, a crise religiosa, a crise energética, a crise ambiental, a crise... Há crise para todos os gostos. Devo ter enumerado parte significativa delas. Ou senão as mais faladas ao lado da econômica. Umas não tão recentes assim, outras tão velhas quanto à existência humana nesse planeta. Houve crises, há crises e crises ainda haverá. Crises. A história humana é, pelas crises, permeada. Mas, tenhamos calma, isso ainda não é o fim dos tempos, como muitos fanáticos religiosos querem – uns até mesmo pedem em suas orações pela volta

“Não Matarás”

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Por Pedro Fernandes Estava depois dos últimos acontecidos por entre os terrenos da igreja católica - enumero alguns para os de mente esquecida ou que padecem da mesma esquizofrenia sobre a qual se erige os muros das religiões: Inquisição, moléstia sexual de crianças, negação do Holocausto, e, entre estes, um bem recente, cá entre nós, que esteve a povoar a mídia, a excomunhão de uma equipe médica e dos envolvidos num aborto legal de gêmeos feito numa criança de nove anos grávida depois de molestada sexualmente pelo padrasto - e junto com esse painel de horrores fico lembrando-me de meu tempo de catecismo, quando a professora punha os alunos, entre eles eu, para ditar a tábua dos Dez Mandamentos da Lei de Deus. Dentre os mandamentos que ditávamos estava um, que não me lembro bem ao certo agora qual é, mas lembro-me claramente o conteúdo, "Não matarás". Associado a isso estive a lembrar também dos tantos discursos que a Igreja tem mostrado a favor da vida humana. Por esta

Rimbaud, além do mito

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Para Albert Camus era “o maior de todos”, e Patti Smith o considerava “o primeiro poeta punk”. A Arthur Rimbaud (1854-1891) bastou um livro, Uma temporada no inferno , para converter-se em mito. Tinha 18 anos e pouco depois decidiu que a literatura havia morrido para ele. Queria viver todas a vidas. E, embora tenha morrido aos 37 anos de câncer nos ossos, quase conseguiu. As correspondências do poeta revelam os medos e anseios na desesperada voz de um homem condenado a ser errante, que viajou incansavelmente, foi professor, mendigo, explorador, comerciante, traficante de armas e até membro de um circo. O desemparado voo de um poeta cujas ordens visionárias – “Eu sou outro”, “Há que ser absolutamente moderno”, “A verdadeira vida está ausente” – o converteu no grande mito da rebeldia adolescente. Longe dessa imagem, sua correspondência inédita descobre outro Rimbaud. Mais íntimo e distante da lenda. Inquieto, irascível e insensato, também ansiava descansar o cabeça. Em 188

Dez músicas a partir de Charles Bukowski

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No dia 9 de março de 1994 morria um dos últimos escritores malditos do nosso tempo, Charles Bukowski. Um desses criadores que não nos deixa indiferente e que gerou uma paixão algumas vezes incondicional. Claro, cultivou e cultiva uma extensa galeria de gente que não gosta ou não tem qualquer simpatia por sua obra. As razões para as duas condições é uma só: amar e desamar um tipo piadista, misógino (e mulherengo), sujo, violento e interessado em todos os vícios imagináveis.  É neste ponto de reflexão sobre o lado escuro da lua, onde Bukowski, através de seu alter ego Henry Chinaski, consegue encontrar ouro ao aprofundar-se na miséria dos perdedores mais defenestrados da sociedade. O escritor fez-se personagem de um tipo colocado à margem pelos mandos de gosto e consumo da sociedade a qual pertencia: os Estados Unidos e seus tentáculos capitalistas. E é neste ponto onde reside sua influência sobre a cultura popular, a revisão de alguns traços do erudito e um dos elementos cruciai

Alexandre Herculano, entre o romance e a História

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Alexandre Herculano. Pintura atribuída a José Balaca, 1849. A autora Leyla Perrone-Moisés associa o escritor português José Saramago a uma tradição da literatura portuguesa que inclui nome de Alexandre Herculano, dada a sua capacidade de apropriação da História a fim de extrair dela o material literário para compor seus escritos.  Essa característica comum ao escritor Prêmio Nobel, quando lembramos de romances como  Levantado do chão ,  Memorial do convento ,  O ano e a morte de Ricardo Reis , entre outros, teve em Herculano um dos precursores. Ele foi, ao lado de Almeida Garrett, o responsável pelo desenvolvimento de um programa estético que objetivava uma reconstrução da cultura portuguesa.   Consciente da crise de identidade por que passava Portugal desde 1580, ano da trágica perda da soberania para o território de Espanha, Alexandre Herculano cria ser aquele o momento de investir na reconstrução dos valores nacionais e toda sua obra, aclara a crítica, está dedicada a esse intere

Antônio Francisco

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Por Pedro Fernandes Eu com o poeta Antônio Francisco (ao centro), durante o encerramento de um minicurso na Faculdade de Letras da UERN, em Mossoró, 2008. foto de meu arquivo pessoal. Deus é sol, sal e farinha O sol cochilava no meio do céu, Jogando seus raios na cara do chão. A gaita estridente de uma cigarra Tocava sem graça a triste canção Daqueles que vivem nos braços da secas Tirando da fé um pouco de pão. Enquanto os soluços do vento da seca Passavam tocando seu sax tenor, De uma cabana coberta de palha Subiam os gemidos de um armador Debaixo dos gritos de uma mulher, Tingidos de mágoas, medo e rancor. “José, oh, José, onde é que tu ta? Responda, infeliz, acabou-se o feijão! Se o menino acorda pedindo comida? Só resta farinha e sal no caixão. Maldita hora, José, que te vi. Que vida, meu Deus, que vida de cão!” E lá no aceiro do fim do quintal, Sentado na sombra de um marizeiro, Um homem responde: “Maria, Maria,

Quem quer ser um milionário?, de Danny Boyle

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Por Pedro Fernandes Quem quer ser um milionário?  é já descrito como a surpresa do Oscar 2009 por se colocar à frente de O   c urioso caso de Benjamin Button . Bem, como não sou bom entendedor de cinema (e não sou bom entendedor de nada), o julgamento ou o parecer crítico (o leitor que julgue o que achar necessário) que faço sobre o filme é meramente um composto de notas do senso comum, de que alguém que diz gostar de cinema o tanto/quase como gosta de literatura. (O leitor não especializado também poderá se sentir do meu lado ao ler meu posicionamento acerca do filme, porque meu julgamento não é o de uma crítica especializada e por um lado tem orgulho de ser assim, porque se for para se prestar ao papel de algumas críticas que circulam por jornais, revistas e endereços da rede, me perdoe, da expressão, não valem mais que um julgamento do senso comum. Isso porque não gosto da opinião crítica que se coloca superior ao objeto de arte, e que descaradamente faz uso do obj

Adultecimentos

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Talvez das escusas de meu corpo Pelas frinchas da alma Ainda ingênua de amar Deixei-te escapar Fria e nua na calma da noite Fomos, ela e eu, em dormidas Cabeceira-pés, pés-cabeceira Rodopiando por entre astros, os céus Em brincadeiras ativas, curiosas Que o corpo já adultescendo reclama Tocando o que existe para ser tocado Por entre os lençóis Em mim ficaram inapagáveis lembranças Daqui estou a vê-la deslizando nua No espelho da memória No corpo das palavras Num mover-se erótico Debaixo do lençol. Daqui estou a ver Encobertos pela noite, às escusas, Uma exploração tátil dos nossos corpos No corpo das palavras sussurrantes Ou mesmo no silêncio da respiração ofegante Uma vivacidade de almas palpitantes Aceleradas na caixa do peito E dormíamos como anjos Em falso sono adultecíamos. * Este poema foi publicado inicialmente em Jornal Trabuco , ano II, n. 3. jan. fev. março de 2009. Acesse  o e-book  Palavras de pedra e cal  e leia outros poemas de Pedro

... E o Vento Levou, de Victor Fleming

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O exemplo mais bem acabado do sistema clássico de produção dominado pelos estúdios de Hollywood Catorze indicações ao Oscar, dez prêmios conquistados, a maior bilheteria de todos os tempos em termos relativos (se atualizarmos os valores) e exibições anuais na televisão. Hoje ninguém duvida da importância e da dimensão de ... E o Vento Levou , mas nem sempre foi assim. A mistura de épico e melodrama recheada com amor, tapas e beijos entre Scarlett O'harra (Vivien Leigh) e Rhett Butler (Clark Gable) é mérito do megalomaníaco produtor David O. Selznick. O chefão da Metro-Goldwin-Mayer (MGM) comprou os direitos do romance homônimo de Margaret Mitchell antes mesmo de ser lançado. E o sucesso do filme ajudou a transformar o livro num fenômeno editorial: durante muito tempo, foi a obra mais vendida do mundo depois da Bíblia.  Devido à grandiosidade da produção, ninguém, a não ser Selznick, acreditava no potencial mercadológico do projeto. Gary Cooper, ao se recusar a viver Rhe

Obra imatura, de Mário de Andrade

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Por Pedro Fernandes Mário de Andrade se dedicou à ficção (em suas mais variadas formas), à poesia, à crítica de arte, à música, e à pesquisa sobre manifestações da cultura popular brasileira; autor de vasta obra e nome dos mais importantes para o Modernismo no Brasil, o escritor morreu em 1945 e deixou-nos mais de vinte livros, alguns deles já clássicos, como Paulicéia desvairada ,  Macunaíma e Amar, verbo intransitivo . O que os leitores de sua obra davam por falta é da edição  Obra imatura  que foi relançado agora em fevereiro pela Editora Agir; esse título reúne três obras essenciais para entender parte das múltiplas faces de Mário:  Há uma gota de sangue em cada poema , seu primeiro livro do autor, publicado em 1917 e que apresenta treze poemas, alguns incluídos em Paulicéia desvairada ; Primeiro andar , uma seleção de contos escritos entre 1914 e 1922, portanto, também de seu início de carreira; e o ensaio A escrava que não é Isaura , que mostra o pensador e estudioso da

A terceira edição do Jornal Trabuco

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Acontece na sexta-feira, dia 13 de março de 2009, na Faculdade de Letras e Artes (FALA), da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), a apresentação do terceiro número do Trabuco ; o jornal é produzido pelos alunos do curso de Letras. A partir da quarta edição, o jornal trará um caderno dedicado somente à poesia. A idéia já tem nome: Sarau, uma das colunas do atual Trabuco. Por aqui irei postar mais sobre em posts posteriores. Aguardemos. Para conhecer o blog do jornal clique aqui

José Luandino Vieira, a revolução é uma maneira de estar no mundo

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José Luandino Vieira.   “A Literatura se alimenta de Literatura. Ninguém pode chegar a escritor se não foi um grande leitor.”   A afirmativa que poderia sair de qualquer escritor aparece numa entrevista de José Luandino Vieira realizada por Joelma G. dos Santos e publicada na edição 21 da Revista Investigações , do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Pernambuco. No caso do escritor, trata-se de uma expressão importante, uma vez que, noutra passagem desse referido diálogo ele afirma que sua obra se baseia a partir da sua experiência e das leituras, sendo que a primeira foi obtida em grande parte da segunda.   Seja como for, para ele a memória guarda importância singular para a feitura de sua literatura. Diz noutra entrevista, agora para o jornal O Globo , de 17 de novembro de 2007: “Minha ficção sempre se alimentou da memória. É do que se inscreveu na memória que retiro o material que submeto a todos os maus-tratos possíveis até perceber se é válido para just