Mais dez filmes inspirados em clássicos da literatura brasileira

No começo do mês de agosto organizamos uma lista com dez filmes que tiveram seu enredo adaptado a partir de alguns clássicos da literatura brasileiro. Mas, o leitor bem sabe que uma lista que dá conta de apenas dez títulos não abarca nem uma milésima parte da quantidade de trabalhos dessa natureza já apresentados; nem esgotaríamos se ampliássemos para uma centena deles. Bem, como toda lista é sempre injusta, mesmo depois dessas duas publicadas aqui no blog, certamente ficaremos sem mencionar outros filmes que caberiam aqui. E, com um tema vasto desses, o bom que poderemos voltar a ele quantas vezes acharmos necessário e escrever outras tantas e tantas listinhas de dez filmes. Por enquanto, fiquemos com esses. Nunca é demais lembrar que não é propósito estabelecermos um ranking por melhor ou pior filme; os títulos foram se apresentando aleatoriamente e depois só organizamos por ano de lançamento.

Grande Otelo em Macunaíma

Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade (1969): Quem não se lembra de encontrar na obra de Mário de Andrade esse herói, genuinamente brasileiro, preguiçoso, safado, sem-caráter. O filme aproveita o lado cômico da obra do modernista brasileiro e segue à risca sua trama, desde o nascimento esdrúxulo de Macunaíma no meio do selva ao seu trânsito pelo sertão, pela cidade e toda parte do Brasil,conhecendo e amando guerrilheiras e prostitutas, enfrentando vilões milionários e policiais. Rodado em alguns festivais e premiado, o destaque na obra de Joaquim Pedro é o inesquecível Grande Otelo, de quem o espectador jamais esquecerá ou terá outra imagem da personagem de Mário de Andrade.

Ana Terra, de Durval Garcia (1971): O longa é adaptação centrada na personagem criada por Erico Verissimo em sua obra O tempo e o vento. Ana é uma jovem que vive com a família em um sítio, em terras gaúchas, no século XVII quando se apaixona pelo índio Pedro Missioneiro; ao engravidar dele é obrigada a cuidar sozinha da cria e proteger a propriedade de seus pais contra a invasão de bárbaros bandoleiros castelhanos. Uma ideia antiga de Alberto Ruschel e Tonia Carrero quando da época da Companhia Vera Cruz, projeto que não chegou a sair do papel, o filme enfim realizado tantos anos mais tarde é o retrato documental da formação histórica do sul do país. Rossana Ghessa, quem fez o papel da personagem principal, foi premiada no Festival de Cinema de Nápoles com a Placa de Ouro de Melhor Atriz, em 1972.

Jubiabá, de Nelson Pereira do Santos (1987): Possivelmente nenhum escritor da literatura brasileira terá alcançado o feito de ser um dos mais adaptados para o cinema e televisão do que Jorge Amado. Dona flor e seus dois maridos (1976), Tenda dos milagres (1977), Gabriela, cravo e canela (1983), Tieta do agreste (1996), para citar alguns dos mais conhecidos. O filme é a história de Antonio Balduíno que vive com a tia até quando ela enlouquece e ele passa a morar com um comendador muito rico, apaixona-se pela filha, mas viverá todas as agruras que envolve o preconceito de raça e perseguição de ricos para com o pobres. Uma peça que recupera muito das relações de formação do povo brasileiro algumas com raízes tão profundas que comuns nos dias de hoje.

O que é isso companheiro?, de Bruno Barreto (1997): Durante a Ditadura Militar, Fernando Gabeira envolveu-se num grupo de luta armada contra o regime e uma das ações foi o sequestro do embaixador estadunidense Charles Burke. O período serviu-lhe para a escrita de um relato dos mais convincentes sobre uma das épocas mais negras da história nacional. É em parte dessa obra que a peça de Bruno Barreto se baseia. O filme concorreu ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro no ano de estreia.

Selton Mello e Mateus Nachtergaele em cena de O auto da compadecida


O auto da compadecida, de Guel Arraes (1999): Devido às sucessivas que filme já foi exibido na TV aberta é bem possível que muitos leitores tenham conhecido o nome e a obra de Ariano Suassuna através da adaptação dessa peça de teatro de mesmo nome. Em cena, as inesquecíveis personagens João Grilo e Chicó vivem, entre a capacidade de escapar da melhor maneira possível o drama do sertão nordestino. Nesse universo povoado de histórias engraçadas, os dois protagonistas vão da terra ao céu em suas peripécias. Destaque na cena é a figura de um Jesus Cristo negro.

Lavoura arcaica, de Luis Fernando de Carvalho (2001): Este mesmo título é de um dos romances mais significativos da literatura brasileira contemporânea. Seu autor, Raduan Nassar, depois de escrevê-lo, largou a escrita para trabalhar, de fato, com uma lavoura. E uma obra tão rica conseguiu alcançar projeção semelhante na grande tela. Na figura principal da obra, a interpretação convincente de Selton Melo que vive André quem se rebela contra as tradições agrárias e patriarcais impostas pelo pai e foge para a cidade onde espera encontrar outro modo de vida diferente do que vivia na fazenda.

Desmundo, de Alain Fresnot (2003): A produção poderia receber o selo de altamente recomendável. Falado em português arcaico ao ponto de precisar de legenda, o texto toma por base o romance da escritora Ana Miranda. Ambientado nos anos de colonização do Brasil, a narrativa recupera a história das órfãs que eram enviadas pelo governo português para que se casassem com os colonos a fim de procriar uma raça pura distinta daquela que se formava da relação entre brancos e índios.

Paulo José é Benjamim, personagem que dá nome ao romance de Chico Buarque adaptado por Monique Gardenberg

Benjamim, de Monique Gardenberg (2004): Este não é o primeiro título de um romance de Chico Buarque que ganha as telas. Vale a pena assistir também Estorvo (2004) e Budapeste (2009). Mas, a narrativa dessa peça de Monique tem todos os benefícios do romance, aliás, um dos melhores da ainda breve carreira de escritor, do cantor e compositor. Benjamim foi na juventude um modelo fotográfico que viveu uma grande paixão por uma colega de trabalho, Castana, filha de um milionário que tinha relações muito próximas com o poder dos militares. Sim, estamos novamente num cenário dos mais escuros da recente história brasileira. Mas, depois do fim da relação com Benjamim, Castana se apaixona por um professor universitário perseguido pela Ditadura Militar enquanto Benjamin, ainda na carreira artística, vive só; é depois do contato com Ariela, um mulher que tem todos os traços da antiga paixão que ele buscará recompor essa história mal fadada do passado. Se conseguirá, bem, isso fica para quem for ver o filme.

O coronel e o lobisomem, de Maurício Farias (2005): Baseado no romance homônimo de José Cândido de Carvalho, o filme é a história de Ponciano de Azeredo Furtado, coronel de patente e fazendeiro em luta com seu irmão Pernambuco Nogueira, irmão de criação, para manter as terras da Fazenda Sobradinho; entre os dois está o amor na figura de Esmeraldina. O título é estreia do diretor à frente de um longa-metragem e, antes de ganhar as telas do cinema, foi série produzida por Guel Arraes para a TV Globo.

O cheiro do ralo, de Heitor Dhalia (2007): É o segundo longa-metragem do diretor brasileiro; sua narrativa baseia-se no romance de Lourenço Mutarelli e teve o roteiro escrito por outro escritor, Marçal Aquino. Toda trama se passa em São Paulo e é a história de Lourenço, dono de loja de objetos usados. A personagem acaba por desenvolver jogos de pura perversão com seus clientes e vai, pouco a pouco, substituindo seu relacionamento com eles pelo prazer que sente em explorá-los nos momentos de maior aflição financeira.

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