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Mostrando postagens de julho, 2018

Séries, sagas, ciclos... que tal chamá-los “romances-rio”? Um jeito diferente de pensar o narrar maximalista

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Por Kent Wascom Yukio Mishima, do culto ao corpo a autor de um romance-rio. Dizem que o escopo de atenção de leitores encolheu, se não desapareceu de todo. Dos cronicamente distraídos não se pode sequer esperar que sentem e leiam um romance, ainda mais um romance que gera outros romances. E, no entanto, olhe em volta na sua livraria favorita e você nos verá: os Ferrante-febris, os   Knausgård-exaustos , amantes do romance em sua forma mais esgotada e potencialmente exaurida. Aguardamos ansiosamente o último fascículo dos romances Cromwell ,   de Hilary Mantel e o primeiro de Dark Star , de Marlon James¹. E nós dificilmente somos minoria. De fato, como Alexander Chee apontou anos atrás aqui , nossos primeiros amores narrativos são frequentemente seriais, nossa afeição livresca nascida em Nárnia, Arrakis ou Hogwarts. Não importa quão diminuto nosso escopo de atenção, ainda lemos (e mesmo escrevemos ou desejamos escrever) ficções que se espraiam por múltiplos volumes e com

Breve elogio do sexo

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Por Carlos Mayoral  La Nouvelle Justine ou Les Malheurs de la Vertu, de Sade Como alguém tende, comumente, a buscar na literatura o que não encontra na vida, é muito comum que o leitor (ou o escritor, se é que não é o mesmo) idealize a página por sobre suas possibilidades. A arte é uma vida hiperbolizada. O amor é mais amor se o descobres num soneto medieval, como a amizade é mais amizade se serve para que cavaleiro e escudeiro lutem com gigantes ou a infidelidade é mais infidelidade se aparece num romance russo. Também Londres é mais Londres se narrada sob a pena de Dickens ou, a vida em um mosteiro dos Apeninos é atrativa se a descreve Umberto Eco. E este exagero não tem por que ter somente um tom alegre. Também o medo é o mais medo sob as letras de Maese Pérez, o assassinato dói mais nas linhas de Capote que durante os trinta e cinco minuto s do jornal e a agonia se saboreia com mais amargura se é Ivan Ilitch que a padece. Até aqui, tudo bem. Agora, e o que ocorre qua

Boletim Letras 360º #281

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Gostaríamos de aproveitar a ocasião deste Boletim para lembrar algo que sempre dizemos em nossa conta no Twitter @Letrasinverso: este blog recebe textos com possibilidade de publicação. Nas guias Contato e  Expediente  (ou diretamente aqui ) o leitor encontra informações sobre como enviar seus trabalhos e quais nossas linhas editoriais. Aviso dado, vamos às notícias que foram divulgadas esta semana em nossa página no Facebook . A descoberta de um recibo que esclarece qual o primeiro comprador de um livro de Jane Austen. Mais detalhes ao longo deste Boletim. Segunda-feira, 23/07 >>> Brasil: Primeira biografia do escritor Wander Pirolli De janeiro a outubro de 2017, o biógrafo Fabrício Marques investigou a história de vivacidade do autor belo-horizontino. O resultado está no livro Wander Piroli: uma manada de búfalos dentro do peito  que sai pela Conceito Editorial. A biografia explora a destaca a importância do escritor para a literatura e o jornalismo brasi

White e Pink, de alunos de Cães de Aluguel a traficantes de Breaking Bad

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Por Wagner Silva Gomes No filme Cães de Aluguel , o mandante do crime, o que organiza a quadrilha, ao contratá-la e reuni-la para passar a tática do assalto a joalheria, discutindo como seria o processo para a execução do crime, numa espécie de aula, com quadro-negro, giz e tudo o mais, no estilo clássico de sala de aula, dá a cada um dos contratados um codinome. Dentre eles está White e Pink, os dois parceiros de Breaking Bad . O então Pink, um jovem rapaz, recusa o apelido, manifestando uma atitude de adolescentes machistas que internalizaram a moralidade patriarcal burguesa comumente externada em ocasiões do tipo para reforçar sua masculinidade para se autoafirmar ou se impor diante de um grupo de perfil igual. Com isso o então White, um homem já de meia-idade, maduro, o aconselha como um pai, que zela pelos rebentos e quer ensinar o filho a respeitar as regras, começando por saber brincar com os coleguinhas, aceitando o tal apelido, pois é apenas um dentre tan

O garoto do riquixá, de Lao She

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Por Pedro Fernandes Possivelmente este romance se integra na ampla lista das produções literárias no Oriente que receberam os refluxos das desse lado do globo. O tema e a escrita de Lao She em nada deixa a desejar do exercício de um Émile Zola, um Balzac ou mesmo um Charles Dickens, para citar três importantes nomes da literatura Ocidental que elegeram a periferia o reduto principal para os dramas de seus romances, descortinando a miséria e a luta do homem por driblá-la em oposição ao mundo mais ou menos fixo de uma elite burguesa. E com um feito: apesar de a narrativa de O garoto do riquixá se desenvolver na Beijing de início do século XX, os conflitos ajustam-se perfeitamente a qualquer contexto ou temporalidade, se observarmos que os quadros de exploração do homem sobre o homem só se mantiveram quando não se agravaram no decorrer da modernidade. Embora, é claro, o interesse do romancista é por estabelecer um retrato vivo e comovente sobre as transformações sociais e o

Oito adaptações de Edgar Allan Poe realizadas por Roger Corman

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Corvos malditos, castelos mal-assombrados, noites de tormenta e névoa, instrumentos de tortura, gatos pretos, hipnoses, loucura... e sobretudo a morte em suas variantes: seja o desassossego que provoca sua aproximação, a nostalgia pelos seres queridos que nos arrebatou ou o terror que infunde a possibilidade de que se apague a linha entre a vida e o além, a terra de ninguém habitada pelos fantasmas. Esse foi o universo de um dos escritores mais enigmáticos da literatura e nele Roger Corman encontrou a pedra no seu sapato. De forma paralela ao que fazia a produtora Hammer no Reino Unido (e muitas vezes tomando-a como inspiração) em princípios dos anos sessenta este prolífico diretor rodou uma série de adaptações dos contos e poemas de Edgar Allan Poe. Às vezes relativamente fiéis e noutros casos leituras muito livres, mas sempre recriando uma característica atmosférica gótica que fez história para o cinema. Alguns dos títulos foram rodados quase consecutivamente, de maneira qu

Dostoiévski: amor, patologia e desordem

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Por Andres Trapiello Se a vida de Cervantes é cervantina e a de Kafka kafkiana, a de Fiódor Dostoiévski não poderia ter sido mais dostoievskiana. Nasceu em Moscou em 1821 e se criou hospital, onde seu pai era médico, um homem despótico, casado com uma mulher enferma que morreu cedo. O pai desapareceu então num alcoolismo violento dificilmente compatível com a aproximação ao filho, de quem se livrou enviando para estudar em São Petersburgo. Quando tinha 18 anos, os trabalhadores da aldeia de propriedade da família, fartos da brutalidade de seu senhor, acabaram com a vida do médico depois de torturá-lo de modo selvagem. Seu primeiro conto escrito dois anos mais tarde, teve um sucesso considerável (sobre esse episódio se fala em Diário de um escritor ), mas o que se seguiu foi puro fracasso – e as pessoas logo o esqueceram. Participou numa conspiração liberal contra o czar Nicolau I e depois de oito meses na prisão, foi condenado à morte, pena da qual foi indultado minutos

Golpes de versos afro-potiguares do poeta Antonio Eliano

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Por Ciro Leandro Costa da Fonsêca O escritor angolano Ondjaki tece em suas obras uma imagem da escuridão com um viés belo e positivo, pensamento presente, por exemplo, no título da sua obra Uma escuridão bonita (2013). A escuridão para esse autor revela um lugar na história, um espaço que permite o tempo narrativo. Nessa obra a escuridão está relacionada à proteção de um jovem garoto ao faltar nas ruas de Luanda capital de Angola, criando uma oportunidade para o diálogo com sua amiga. Essa discussão sobre o autor angolano se constrói como bastidor para que cheguemos aos poemas do jovem potiguar Antonio Eliano Juvêncio da Silva, um poeta e compositor que lançou no ano de 2015 o seu primeiro álbum intitulado Ecdemomania e que se assume negro versando sobre a sua identidade. Natural de Pau dos Ferros, no interior do Rio Grande do Norte, onde faz mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, é descendente dos povos ne