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Fernando Pessoa e a Coca-Cola

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Fernando Pessoa, Moitinho de Almeida e um casal de estrangeiros apreciadores da ideia do refrigerante estadunidense. Foto: Jornal de Letras Fernando Pessoa foi um homem de ideias – ninguém duvidará disso. Mas, realizá-las, bem, realizá-las é outra história. Ganhou a vida mais como tradutor de inglês para o português, numa época em que Portugal mantinha uma profunda dependência com a Inglaterra. E como sujeito tido para ideias poderia, se tivesse jeito com elas se tornado um homem de negócios? Possivelmente. Sabe-se que foi um dos inventores da famosa revista responsável pela consolidação do modernismo em terras portuguesas, a Orpheu ; esta talvez um dos seus primeiros empreendimentos, mas que só durou três edições, uma delas não publicada. Antes, havia criada a editora e tipografia Íbis, instalada em 1907 no Bairro da Glória e mal funcionou; no mesmo ramo, criou em 1921, a Editora Olisipo que só publicou três antologias de poemas em língua inglesa, A invenção do dia cla...

Marguerite Yourcenar

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Durante toda sua vida, Marguerite Yourcenar se esquivou de qualquer tipo de confidência, inclusive quando escreveu sua autobiografia,  O labirinto do mundo . O primeiro volume,  Recordações de família  (1974) está dedicado à figura de sua mãe e à sua família, e o segundo,  Arquivos do norte  (1977) à família de seu pai, um homem aventureiro. Segundo muitos críticos, a ideologia, as paixões e a concepção de mundo da escritora devem ser buscadas nos seus livros e não nos acontecimentos de sua biografia, que ela simplesmente cuidou de manter em silêncio por considerar, provavelmente, que não tinham o menor interesse para os seus leitores. Em meio século de literatura, Marguerite Yourcenar compôs uma obra breve e de alta qualidade: catorze livros em prosa, dois de poemas, seis peças de teatro e seis volumes de traduções. Nunca deu nenhum por terminado e toda sua obra foi reescrita uma e outra vez. A escritora deixava que as edições esgotassem e impe...

2001 - Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick

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Ficção científica revolucionária discute a aventura do homem para compreender o mistério da criação A Odisséia no Espaço narrado em 1968 pelo genial Stanley Kubrick pode parecer tediosa quando vista por olhos acostumados ao ritmo incessante das aventuras intergaláticas de Guerra nas Estrelas (1977). Mas, desde seu ponto de partida, trata-se de uma obra surpreendente: o diretor filma um grupo de hominídeos da pré-história disputando domínios à base de paus e pedras. Por perto, um enigmático monólito, que reaparecerá em outra etapa do filme como seu símbolo mais marcante. Até que um pedaço de ferramenta arremessado para o alto funde-se com a imagem de uma espaçonave cruzando o cosmos. Assim, neste famoso plano que esboça um salto no tempo de milênios, está dado o tom filosófico que só cresce ao longo da narrativa. Sabe-se que os astronautas terão de enfrentar um computador que assumiu o controle da nave, HAL 9000. Construído para gerenciar a missão a Júpiter, ...

John Steinbeck no cinema

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cena de As vinhas da ira , um dos filmes a partir de uma obra de John Steinbeck mais conhecidos. O cinema foi generoso como Steinbeck e ele com o cinema. Foram feitas, desde que alcançou a notoriedade ainda jovem (publicou em plena efervescência liberal rooseveltiana As vinhas da ira em 1937 e havia nascido em 1902, tinha, portanto, 35 anos) 17 filmes sobre obras suas e não seria estranho ver outras nos próximos anos. O sucesso cedo levou também a ser quisto para a escrita de alguns roteiros – tarefa que levou ser indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Original pelo filme Um barco e nove destinos , de Alfred Hitchcock. Da extensa leva de títulos há quatro filmes mais famosos cuja narrativa é produto de uma adaptação da obra de Steinbeck. Além de As vinhas da ira , adaptada por John Ford em 1940, houve Boêmios errantes , dirigido pela solvência e sutileza com que Victor Fleming representava as ambiguidades sexuais nas relações entre amigos – Spencer Tracy e John Garfield exec...

Por que ler os clássicos: os livros de Italo Calvino (Parte 1)

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Se uma parte dos escritores preferem não avançar sobre o tema de quais são os seus livros preferidos a título de não causar mal-entendidos entre os da sua comunidade, uma pequena quantidade prefere citar os clássicos, outra esnobá-los, outra só falar sobre o assunto quando interpelado por gente muito próxima e mais outra que prefere não citar ninguém, mesmo tendo sua lista de preferidos, como sabemos que todos têm. Italo Calvino foi um dos poucos que preferiu, não só registrar suas leituras fundamentais no extenso trabalho de crítica literária que é exemplo para qualquer iniciante ou reconhecido na área, como comentá-las sistematicamente ao ponto de, naturalmente, oferecer-nos uma resposta para uma das perguntas mais cabeludas da literatura: o que é um clássico? E todo esse itinerário de leitor lhe forneceu algumas especulações e formulações só dadas à aproximação aos que guardam pelos livros uma paixão fora do limite de culto ao objeto, mas pela sua forma e o conteúdo. Em ...

Manual de pintura de caligrafia, de José Saramago

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Uma das capas para uma edição brasileira de Manual de pintura e caligrafia.  Manual de pintura e caligrafia é o primeiro romance de José Saramago; pelo menos até enquanto o escritor português não admitiu publicamente que aquele A viúva , publicado em 1947, com outro nome,  Terra do pecado  era um romance que estaria na sua tábua bibliográfica. Até meados dos anos noventa, ele relutou que o livro publicado quando era um moço de vinte e poucos anos merecesse a permanência entre os seus trabalhos posteriores. Nesse périplo difícil de estabelecimento do escritor, sabe-se que além de textos de variada espécie (crítica literária, crônica, artigos de opinião, poesia e o romance fracassado ) também existiu a decepção pelo esquecimento de um datiloscrito que até agora permanece inédito: A Clarabóia . Falemos alguma coisa sobre o romance de 1977, publicado pela Moraes Editora com o paratexto de "Ensaio de romance", como se apontasse uma tentativa tímida do escritor tr...