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Emily Dickinson por Ana Cristina Cesar

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2 de junho assinala a passagem do aniversário da poeta brasileira Ana Cristina Cesar . Abaixo, por essa ocasião, relembramos um texto crítico seu sobre a obra da poeta estadunidense Emily Dickinson mais um conjunto de poemas traduzidos pela própria Ana C. Este texto é uma cópia do que foi publicado no caderno Folhetim , de 06 de novembro de 1983. Ao lado de Walt Whitman, Emily Dickinson é o grande nome da poesia norte-americana do século 19. Seus nomes sugerem um contraponto que raia a simetria dos opostos. A exuberância, o excesso, a retórica desmedida da voz de Whitman, cujo imenso épico Leaves of Grass canta o desejo eufórico de mapear a terra americana e jogar-se nos braços do leitor - em oposição à tensão crítica e à secura dos poemas lacônicos de Emily, sua voz baixa que fala da morte sem drama e da renúncia sem lamento. O contraponto pode ser desdobrado quando se pensa nos dois personagens que a imaginação desejaria biografar: Whitman todo exterioridade, peregrino e ...

Paulina Chiziane

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Paulina Chiziane. Foto: Douglas Freitas. A chegada da obra de Paulina Chiziane por uma importante casa editorial no Brasil reafirma o destaque da sua obra fora de seu país e, ao mesmo tempo, nos oferece uma possibilidade de ampliar o reconhecimento sobre as literaturas produzidas em África, este vasto território de rica variedade cultural sempre silenciado ou colocado à margem pelas expressões ocidentais.   Sabe-se que a escritora pertence à terceira linha na recente historiografia literária de seu país, Moçambique. Isso significa que a memória cultural, a formação da identidade e os horrores do passado colonial estão recorrentes na sua literatura. Esse envolvimento ressalta a proximidade que a literatura sempre mantém com o social, naquilo que em “Literatura e Sociedade” Antonio Candido designa como dialética da criação. Não se pressupõe, é claro, numa representação no sentido de reflexo ou transposição imediata da história, por exemplo, mas esta enquanto contexto participa ativam...

Os Sete Samurais, de Akira Kurosawa

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Acusado de dar as costas para sua cultura, nesta obra o cineasta mescla uma dinâmica de ação com uma tradição tipicamente japonesa Na juventude, Akira Kurosawa desejava ser pintor. Incentivado pelo irmão mais velho, cinéfilo de carteirinha, e apaixonado pela produção americana (sobretudo a de seu ídolo John Ford), enveredou pelos caminhos da Sétima Arte para não sair mais. O passado artístico, porém, nunca deixou de influenciar os métodos de trabalho do diretor: todos os seus longas foram concebidos por meio de um meticuloso trabalho de composição. Kurosawa fazia storyboards enormes em forma de quadros, levava meses filmando e utilizava no mínimo três câmeras para cada cena. Tanto esforço deu resultado: tornou-se o mais respeitado cineasta japonês. Deixou marcas em obras tão distintas quanto os westerns de Sergio Leone, a saga de Guerra nas Estrelas (1982-86) e os pontos de vista múltiplos de Quentin Tarantino (saídos de Rashomon , de 1950). Só sofreu a resistência em seu país n...

Ai, saudades da palmatória!

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Por Pedro Fernandes “Ó palmatória, terror dos meus dias, tu que foste o compelle intrare  com que um velho mestre, ossudo e calvo, me incutiu no cérebro o alfabeto, a prosódia, a sintaxe, e o mais que ele sabia, benta palmatória, tão praguejada dos modernos, quem me dera ter ficado sob o teu jugo, com a minha alma imberbe, as minhas ignorâncias, e o meu espadim, aquele espadim de 1814, tão superior à espada de Napoleão!” – Memórias póstumas de Brás Cubas , de Machado de Assis. O caso se deu nesta semana. Uma professora da rede estadual do Rio de Janeiro foi condenada a pagar uma multa de R$ 5 mil por um puxão de orelha num aluno. O fato me chama atenção por dois motivos: a bancarrota de uma pedagogia do cetim fez do aluno uma figura intocável. Fato humano – quando não é oito é oitenta. Houve o tempo em que apanhar de palmatória era útil para a formação educacional. Era um corretivo necessário à docilização dos corpos. Depois desse motivo primeiro, é fato que a pedagogia ...

Raduan Nassar

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Raduan Nassar nasceu em Pindorama, cidade do interior do Estado de São Paulo. Seus pais, João Nassar e Chafika Cassis, haviam se casado em 1919 na aldeia de Ibel-Saki, no sul do Líbano e em 1920 imigraram para o Brasil; a família junta-se a parentes que já estavam no país e começam a trabalhar no ramo do comércio, no interior do Rio de Janeiro. Um ano depois, mudam-se para a cidade de Itajobi, interior de São Paulo e mais tarde, em 1923, para Pindorama. Na cidade onde nasceu, o pai do escritor abriu uma venda que logo seria transformada numa loja de tecidos, a   C asa Nassar. Em 1943, Raduan inicia seus estudos no Grupo Escolar de Pindorama. Expansivo e de ótima memória, o aluno é freqüentemente chamado para recitar poemas nas datas comemorativas, mesmo com sua dificuldade em pronunciar corretamente o r  fraco. Segundo ele, neste ano tem "uma das melhores alegrias da infância" de que se lembra, ao ganhar um casal de galinhas-de-angola do pai. Como é de...

Fernando Pessoa e a Coca-Cola

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Fernando Pessoa, Moitinho de Almeida e um casal de estrangeiros apreciadores da ideia do refrigerante estadunidense. Foto: Jornal de Letras Fernando Pessoa foi um homem de ideias – ninguém duvidará disso. Mas, realizá-las, bem, realizá-las é outra história. Ganhou a vida mais como tradutor de inglês para o português, numa época em que Portugal mantinha uma profunda dependência com a Inglaterra. E como sujeito tido para ideias poderia, se tivesse jeito com elas se tornado um homem de negócios? Possivelmente. Sabe-se que foi um dos inventores da famosa revista responsável pela consolidação do modernismo em terras portuguesas, a Orpheu ; esta talvez um dos seus primeiros empreendimentos, mas que só durou três edições, uma delas não publicada. Antes, havia criada a editora e tipografia Íbis, instalada em 1907 no Bairro da Glória e mal funcionou; no mesmo ramo, criou em 1921, a Editora Olisipo que só publicou três antologias de poemas em língua inglesa, A invenção do dia cla...