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Memorial do convento, de José Saramago

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Por Pedro Fernandes Acabei de reler e tenho obrigação de postar minhas reimpressões acerca desta grande obra da literatura em língua portuguesa. Falo de Memorial do convento , do escritor português José Saramago. O texto está em sua 33ª edição, publicada em 2007, no Brasil, pela editora Bertrand Brasil. Este título e Levantado do chão , enquanto todos os demais estão sob a publicação da Companhia das Letras. Uma suposta impressão sobre o mercado editorial: parece que a Bertrand tinha interesse, mas a outra editora atravessou-se no caminho e fez, certamente, uma boa escolha. Se o Memorial  encontra-se no Brasil na edição em que se encontra (e o nosso país é não raras vezes acusado de ser um país de maus leitores) é prova de Saramago é, além de bom escritor, alguém que vende muito. De fato, este livro assinala uma ruptura com o esquecimento em torno da obra do português. Basta uma pesquisa simples em torno de quem era José Saramago desde a publicação de seu primeiro ...

Roma, Cidade Aberta, de Roberto Rossellini

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 A imagem que ficou na história do cinema é a de Anna Magnani caindo na rua, abatida por soldados alemães, em Roma, Cidade Aberta . A crítica de cinema norte-americana Pauline Kael tem uma boa definição sobre Roma, Cidade Aberta : parece mais captado do que representado. Foi assim mesmo, com esse senso de realidade típico dos documentaristas, com alguma ação mas nenhum floreio cênico, que Roberto Rossellini fez o primeiro longa do chamado neo-realismo italiano. Numa Roma destruída, dias depois da chegada das tropas aliadas, em 1945, o cineasta, com uma câmera e restos de negativos não utilizados, filmou uma ficção inspirada em fatos reais, mostrando a resistência do povo contra a dominação nazista. Com improvisos e atores não profissionais, rodado nas ruas, sem cenários ou as usuais "maquiagens" do cinema de estúdio, Rossellini criou imagens brutas, "sujas", retratando uma realidade material terrível e jamais vista antes no cinema comercial. O impacto ...

Gil Vicente, o pai do teatro português

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Todo o Mundo: Folgo muito d’enganar e mentir nasceu comigo. Ninguém: Eu sempre verdade digo sem nunca me desviar. (Berzebu para Dinato) Berzebu: Ora escreve lá, compadre. Não sejas tu preguiçoso! Dinato: Quê? Berzebu: Que Todo o Mundo é mentiroso e Ninguém diz a verdade.   (Gil Vicente,  Auto da Lusitânia )   Não é redundante afirmar que o caráter da literatura, dentre vários outros, é o do desvelo para com as questões que regem a realidade empírica. Mas do que isso é o teatro de Gil Vicente. Ao passo que figura o desvelo, figura também certa “denúncia” da sociedade da qual fazia parte. Uma sociedade predominantemente voltada aos ricos e à marginalização dos pobres. Uma sociedade que até hoje permanece abarcada pela hipocrisia.   Mesmo sendo incertas as datas de seu nascimento e morte, é sabido que Gil Vicente viveu durante o reinado de D. João II. Testemunhou a aventura portuguesa das grandes navegações e grandes descobertas ultramarinas. Muitos de seus autos e peça...

José Lino Grünewald, José Lino, Zé Lino, Zèlino ou Zelino

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“Todos os dias, antes de sair de casa, o José Lingo Grünewald vai ao guarda-roupa e apanha uma pose. Não uma pose qualquer, intranscendente. O neopagão não se pode comportar como um vago e convencional pai de família. A pose que ele veste, calça e abotoa é a de um cínico, de um amoral, de um perverso. Por outro lado, a soma dos dados já referidos ― neopagão, poeta concreto e amigo de Ezra Pound ― sugere não sei que abjeções inenarráveis.” (Nelson Rodrigues, “O aniversariante”) José Lino Grünewald, início dos anos 1960. Foto: Augusto de Campos.   O estranho no ninho. Assim se poderia definir a presença de José Lino Grünewald entre os concretistas. Não pelos distanciamentos entre ele e os nomes do movimento vanguardista; não que sua obra deixasse de se ligar abertamente ao estilo e à criatividade desse grupo. É que numa vanguarda genuinamente paulista, este foi o único participante vindo de fora. O autor de Escreviver nasceu no Rio de Janeiro a 13 de fevereiro de 1931 e foi com ...

Ortografia em reforma

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Por Pedro Fernandes Bem, se nada em nossa vida pessoal está, pós-réveillon, a passar por alguma mudança, este fato não se estende a tudo que nos cerca. Algo sutil está a passar por alguma mudança pós-réveillon. Algo que até o presente não tem causado ainda tanta estranheza a nós. A mudança que está para acontecer, ou melhor, que já vigora, diz respeito ao mundo das letras portuguesas. A partir deste mês de janeiro entrou em vigor - finalmente! - as novas regras do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. O acordo que em papel já há muito que bolava pelas gavetas e que passou por umas quantas cabeças de vários lados foi enfim passado à caneta oficialmente - aqui no Brasil em setembro do ano passado. Tudo começou em 1990, quando representantes dos oitos países que integram a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa - CPLP -, que corresponde a Portugal, Brasil, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Timor Leste, decidiram simplificar a grafia e unifi...

Era Bush

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Por Pedro Fernandes – Atenção, todos! Vai falar agora o excelentíssimo senhor presidente dos Estados Unidos, do mundo e da cocada preta, o Sr. George W. C. Bush. Todos, por favor, quer dizer, por favor, não, que supremo não pede por favor; todos, dobrem-se diante do superior! Lembrete: quem desobedecê-lo estará assinando um tratado de paz armada. (A cena é interrompida por sapatos voadores de um dos jornalistas da sessão). Associando a charge à cena real estamos diante de um painel significativo do que foi o mandato que se finda hoje. Durante esse período assistimos perplexo o desenrolar de cenas muitas delas comuns às ditaduras num país cujo vocábulo liberdade tremula nos principais veios da história da democracia, esta que ainda caminha, mesmo já capenga das pernas. O governo Bush definiu-se na mentira. Através dela criou-se um pretexto para guerras – as guerras pela liberdade (olha aí o vocabulozinho) do povo afegão, do povo iraquiano. Um bom argumento, não fosse o pe...