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Os escritores perante o racismo

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Por José Saramago Imagem: F. E. Dean.  Aí está o racismo, aqui estão os escritores. A questão parece bastante clara à simples vista: sendo o racismo uma expressão configuradora, e até agora inseparável, da espécie humana, com raízes tão antigas, provavelmente, como o dia em que se deu o primeiro encontro entre hominídeos ruivos e hominídeos negros; presumindo os escritores, por sua vez, de serem e merecerem ser os guias espirituais da nossa confusa humanidade, mesmo se, por ela lhes ter virado as costas, deixaram de estar em moda os  maître-à-penser  – a resposta a uma interpelação a eles dirigida seria, provavelmente, a redacção de um milésimo manifesto, de uma milésima condenação do racismo e da intolerância xenófoba, subscrita por todos os escritores deste nosso prolixo mundo, do primeiro ao último, se é que para eles também existe, algures, uma classificação por pontos, como a dos tenistas, que só precisa de olhar a tabela para saberem quanto valem. ...

Os Imperdoáveis, de Clint Eastwood

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Reflexão madura e desencantada do universo dos velhos westerns  na visão de um de seus protagonistas Os Imperdoáveis  é um western  sobre o fim dos westerns . Talvez na última obra-prima do gênero eternizado por John Ford, Howard Hawks e Sergio Leone, Clint Eastwood maquinou, ao mesmo tempo, uma homenagem aos seus mestres (há dedicatórias a Leone e a Don Diegel), um crepúsculo do estilo e uma revisão dos aspectos morais do bom e velho bangue-bangue, da figura do cowboy  e do seu universo. Eastwood revisita também a própria carreira, que começou a se destacar na trilogia spaghetti  de Leone e se solidificou com a série Dirty Harry . Nela, ele geralmente vive um homem solitário, amargo, bêbado e violento a ponto de não perdoar ninguém. William Munny (interpretado pelo próprio Clint) teve um passado assim. Até que conheceu sua futura esposa, teve filhos e se tornou humilde criador de porcos. Agora viúvo, ele dedica-se a cuidar das crianças e a admini...

Um poema recortado do jornal Trabuco

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Por Pedro Fernandes O jornal Trabuco  fez parte do meu início nessa aventura da editoração. O periódico impresso tratou de reunir as atividades do universo literário do curso de Letras na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Dentre as colunas que formam as publicações uma que se chamava  Sarau era dedicada à produção poética. Em sua primeira edição lançada no início do mês de julho de 2008, incluímos dois exercícios literários meus: os poemas "Salvação" ( publicado aqui em 2007 ) e este outro, uma amostra dos textos incluídos no livro Sertanices.  Alberto Burri Previsões Minha avó costumava em certos meses do ano Pôr sobre a casa numa tabua morros de sal, Doze ao todo, os doze meses do ano: Janeiro. Fevereiro. Março. Abril. Maio. São João. Santana. Agosto. Setembro. Outubro. Novembro. Dezembro. No dia seguinte contava a quantidade do derreter E dessa quantidade via os meses chuvosos, Os menos e os mais, Também os meses secos – Estes, de...

Dez filmes mais um que contam sobre a vida de escritores

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Cena de A última estação Este ano os cinemas trouxeram para as telas A última estação , filme de Michael Hoffman sobre os últimos anos da vida de Liev Tolstói. Estamos no ano de 1910 em Yasnaia Poliana, a propriedade rural onde o escritor de  Guerra e paz  viveu boa parte de sua vida. O título conta os período em que Tolstói esteve envolvido em levar adiante organizar seus direitos e seus ideias trabalhados em Poliana. O filme traz ainda a relação desenvolvida entre Tolstói e Bulgákov, quem trabalhou como seu secretário particular nesse período e, claro, toca em pontos conturbados do casamento com Sofía que temia uma retaliação do companheiro em não lhe deixar sequer os direitos sobre a obra. Mas, depois de amarmos esse filme, fomos catar outros cujo tema é também a vida de escritores e deixamos essa listinha aos amigos leitores. Claro, há outros títulos que estarão a serviço de outra lista do gênero, se esta tiver a atenção merecida. Anti-herói americano , 2003. Di...

Uma francesa trabalhadora

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Por Alberto Manguel Em 23 de fevereiro de 1937, Virginia Woolf anota em seu diário que, no dia anterior, a tradutora para o francês de seu romance As ondas havia vindo consultá-la: “Não tenho nem tempo nem espaço para descrever a tradutora, salvo para dizer que levava umas lindas folhas de ouro em seu vestido negro; é uma mulher que suponho ocultar algo em seu passado; dada ao amor, intelectual; vive a metade do ano em Atenas; é parte do grupo de Jaloux [o influente crítico francês]; de lábios vermelhos; tenaz; uma francesa trabalhadora; amiga dos Margerie; prosaica”. Trata-se, acrescenta Woolf apressadamente, de uma “senhora ou senhorita Youniac (?) Não é esse seu nome”. Seu nome (ou o nome que havia elegido) era Yourcenar. Por razões econômicas havia aceitado traduzir o romance de Woolf; o encargo lhe brindava com o privilégio de conhecê-la. Anos mais tarde, Yourcenar descreveria aquele encontro “na escuridão de um salão iluminado apenas pelo fulgor da casa”, onde as duas ...

Novo projeto editorial para as obras Jorge Amado

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Desde março de 2008 a editora Companhia das Letras tem iniciado a empreitada de reunir numa coleção a obra completa de Jorge Amado. Trata-se de um vigoroso e belo projeto que traz novamente às rodas das discussões literárias a obra do escritor; não que esta alguma vez tenha deixado de ser uma constante entre os leitores, porque o baiano é um dos mais valiosos nomes da nossa literatura e um dos que obtiveram, desde sempre, uma presença constante em diversos universos dentro e fora do Brasil. Jorge Amado nasceu em 10 de agosto de 1912, em Itabuna, na Bahia. Aos dois anos, a família mudou-se para Ilhéus, onde o menino passou a infância e viveu várias experiências que marcariam sua literatura: a vida no mar, o universo da cultura do cacau e as disputas por terra estão entre elas. Começou a escrever profissionalmente como repórter aos catorze anos, em veículos como  Diário da Bahia ,  O Imparcial  e  O Jornal . Na década de 1930 foi para o Rio de Janeiro, onde...