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Memória de elefante, de António Lobo Antunes

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Por Pedro Fernandes Memória de elefante é o primeiro romance escrito por António Lobo Antunes ; foi publicado em 1979, depois de voltar de uma permanência na Guerra Colonial na África, experiência que irá perpassar como material temático boa parte da sua obra. É o primeiro romance de uma trilogia que continua com Os cus de Judas e Conhecimento do inferno ; os três, talvez se configurem como os mais importantes da carreira, não por razões estéticas, certamente, porque Lobo Antunes possui outros mais bem acabados romances (entre nós, é um autor ainda por se conhecer), mas esses três livros dizem a que veio o médico meter-se com a escrita. Os três são sucessos de crítica e inauguram em Portugal uma visão nada romântica da desenhada entre os daquele país sobre o que foram os anos de ocupação portuguesa nos territórios africanos. Não que estejam esses romances reduzidos a esse propósito, mas é o tema um dos mais caros à ficção contemporânea que se forma no pós-74.  O roman...

Branca de Neve e o caçador, de Rupert Sanders

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Por Pedro Fernandes Charlize Theron em cena como a rainha má. Seu papel convence e é responsável pelos melhores momentos de Branca de neve e o caçador . É lógico que nunca haveria de passar pela cabeça dos irmãos Grimm, os que primeiro registraram o conto da tradição oral europeia do século XIX, que a história pudesse se manter tão atual e capaz ainda de duas ressignificações como as que recebeu neste ano. A de agora, infinitamente superior à anterior, que trouxe a rainha má sob a bela interpretação de Julia Roberts e que comentei aqui . Também é a versão superior às que foram feitas por exemplo pelo Walt Disney, que, méritos à parte, saiu adocicando tudo quanto foi narrativa vista pelos olhos inocentes da cultura pop. E que não nos esqueçamos que as narrativas coletadas pelos Grimm nunca tiveram esse tom desenhado depois. O filme de Rupert Sanders parece não ter esquecido disso e conseguiu colocar na tela uma Branca de Neve com um tom muito próximo da violência psic...

Mais uma página da novela Kafka

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Franz Kafka, verão de 1906, quando se formou em Direito. Arquivo Klaus Wagenbach. Já havia comentado por aqui   sobre outros possíveis inéditos de Franz Kafka ainda fruto da decisão do amigo e editor Max Brod de não se desfazer dos papéis deixados pelo escritor, contrariando seu desejo. Se a desobediência de Brod beneficiou a nós leitores porque o escritor quando morreu só havia deixado alguns contos e uma novela publicados e hoje conhecemos dele mais que isso, por outro lado, formou-se uma história digna do próprio escritor tcheco. Ironicamente, Kafka previa esse imbróglio? Talvez todo escritor saiba da briga que pode causar entre herdeiros por causa de uns papéis valiosos. Mas, vamos lá. É que já entra para três anos que se descobriu os tais manuscritos de Kafka num apartamento em Tel Aviv. Eva Hoffe, no alto dos seus 70 anos e o estado de Israel se colocam num ringue pelos direitos aos papéis. O arquivo pode conter cartas, desenhos e, até manuscritos inéditos de Kaf...

Uma nova adaptação cinematográfica para Os miseráveis, de Victor Hugo

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Anne Hathaway caracterizada por Fantine na nova adaptação de Os miseráveis para o cinema. A adaptação mais recente para  Os miseráveis , de Victor Hugo, data de 1998. Antes, passou por uma série de outras releituras para a grande tela desde 1909, ano quando foi realizada a primeira versão cinematográfica, então dirigida por J. Stuart Blackton.  Agora, para finais de 2012, nos Estados Unidos, e fevereiro de 2013, no Brasil, o grande romance da literatura francesa volta às telas. O longa-metragem é dirigido por Tom Hooper, o mesmo diretor de O discurso do rei , e foi divulgado, por esses dias, o primeiro trailer.  A apresentação do livro de Hugo fecha um ano de ouro para o cinema. Não apenas porque relembra a altura os 150 anos do principal romance do escritor francês, como pela leitura inovadora proposta, já que a versão a ser apresentada agora é um musical com o repertório integral ao de 1985, quando foi montado na Broadway. Também foi em 2012 que o romance...

Ilustrar o Dom Quixote

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Por Pedro Fernandes Gustave Doré, um dos mais conhecidos ilustradores para o Dom Quixote . Imagem: BNP A edição do Dom Quixote que li foi a publicada pela Editora Nova Aguilar; tradução retrógrada, dizem os entendidos da arte de traduzir. Eu cá não tenho muitos méritos para sair julgando traduções. Depois, bem recente, saíram versões elogiadas em termos de tradução, pela Editora 34, inclusive em volumes de bolso. Mas, não estou aqui para tratar de traduções e nem de edições melhores ou piores.  É que a edição da Nova Aguilar vinha com ilustrações do multiartista da gravura, Gustave Doré, também reproduzidas nos dois volumes editados pela 34. O nome do francês não é incomum aos nossos ouvidos porque dificilmente terá existido algum clássico que ele não tenha ilustrado. A Bíblia deve ter sido o maior deles. Mas, compôs ilustrações ainda para a obra de Rabelais, Taine, Dante, Victor Hugo, Charles Perrault, entre outros. Das ilustrações do Dom Quixote , o seu trabalho ...

Ray Bradbury: um lugar entre outros mundos

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Por Jacinto Antón Luto em Marte e em nossos corações. A morte de Ray Bradbury, na terça-feira (5) à noite, aos 91 anos, o mestre da ficção mais lírica, deixa órfãos eles, os marcianos de olhos amarelos em seus crepusculares canais de sonhos, mas também a todos os que aqui embaixo, seus filhos leitores, temos viajado com ele em astronaves às estrelas e bebido o licor de verão das infâncias perdidas sob os alpendres da mítica Green Town, Illinois. Bradbury, que dispõe já de uma cratera com seu nome em Marte e que pediu que suas cinzas sejam espalhadas no planeta vermelho, será lembrado por muitas coisas, pelas Crônicas marcianas , essa excepcional coleção de contos sobre a colonização do planeta Marte que mudou para sempre o gênero fantástico e entusiasmou nomes como o de Jorge Luis Borges; O vinho da alegria e O campanário das trevas , dois dos romances mais comovedores escritos sobre o delicado momento em que as crianças descobrem a existência do tempo, da morte e da res...