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Livro do Desassossego: o romance possível (var.: impossível)

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Por Richard Zenith Cena do Filme do desassossego . Citamos o Livro do Desassossego como se fosse um tesouro de frases geniais, um compêndio de ideias, ora mais ora menos desenvolvidas, uma miscelânea de fragmentos avulsos. E é natural que o encaremos desta maneira, pois corresponde ao estado em que efectivamente foi deixado. Em boa verdade, mesmo que Pessoa tivesse revisto e organizado o Livro , e por mais que o tivesse domado e domesticado, seria sempre uma obra constituída por fragmentos. Isso nada tem a ver com um projecto putativamente modernista de pôr em causa o livro enquanto formato literário. Muito menos se deve à impossibilidade de encontrar uma forma adequada para ele. Pessoa encontrou-a logo no início. O fragmento – aliás, umas centenas de textos de variado tamanho e relativa autonomia a que chamamos fragmentos – é precisamente a forma que lhe convinha, dado o livro ser narrado por alguém cujo estado de alma é um devaneio permanente. Não é que o narrador ...

O Livro de Cesário Verde – Cesário Verde (Parte II)

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Por Pedro Belo Clara Se o caro leitor bem se recorda, na primeira parte deste artigo ( leia aqui ) foram abordadas as principais características da temática de Cesário Verde, o mais proeminente poeta parnasiano português. De entre elas, foi sublinhada a constante dicotomia entre o campo e a cidade, o principal aspecto antagónico da obra deste autor. Mas será ele caso único? De todo. Curiosamente, o génio criativo do poeta aplica essa mesma dualidade aos alvos de suas paixões. Desenterrando os antigos conceitos de “ Mulher-Anjo ” e de “ Mulher-Demónio ”, tão presentes na poesia medieval europeia, adapta-os às diferentes realidades circundantes, fazendo nascer três distintos tipos de mulher: a campestre , a citadina e a do povo . Assim, facilmente se depreende que a mulher do campo é, por aquilo que os bucólicos cenários representavam para o poeta, a mulher tipicamente angelical, tímida, singela, dona de uma beleza bem peculiar e natural. É também frequente adaptar, à sua ...

Boletim Letras 360º #41

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Já estamos um ano mais velho. Aumentam responsabilidades, é óbvio; mas estamos buscando ainda rejuvenescer. Fizemos alguns ajustes no blog. Os que nos conheciam de antes, já perceberam que tudo está, como dissemos outro dia no Facebook, mais clean . E tivemos a estreia nesta semana de mais um colunista: Cesar Kiraly, ensaísta, poeta, professor.  Por falar em aniversário, a nossa promoção como celebração pela data foi um sucesso! 145 inscritos. Mas, uma pena, seis sorteados. Quiséramos ter dinheiro para presentear todos os 145 com um livro. Todos os vencedores já foram contatados pelo e-mail cadastrado na promoção e começarão, à medida que nos responder esse contato, a receber seus brindes.  Outra novidade acompanhada ao visu clean é que todas as publicações de catálogos editados pelo blog estão agora num só lugar. Vale conferir o novo menu que colocamos por acima: Biblioteca. E, claro, aproveite! Sem mais delongas, vamos ao que foi notícia esta semana em nossa página no Face...

Em Dias Chuvosos: um parágrafo

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Por Cesar Kiraly § - Lágrimas? - Espasmos secos. § em dias assim. chuvosos assim. sem nada de especial. recolhia cada um dos antigos recortes. poemas queridos. lidos. lindos. que haviam servido de porto ou de preciosidade. em dias assim. ele amassava um por um. sob certeza franzida. até o desaparecimento. nem mesmo a esperança do perecimento em flor. nem mesmo essa era mantida em seu lugar amarelado. nem mesmo a fria ironia diante dos velhos presos ao viver. nem mesmo essa deixava de ser simetricamente rasgada. Lawrence e suas roupas brancas. sua barba. nem mesmo este confuso nome. nem mesmo as consoantes. § viajante carioca melancólica de segunda viagem. de tendências nosográficas e antropológicas e alegóricas. escrevedora constante de cadernos feitos mesmo para as notas. notara ser a Europa como a zona sul. ornada com elementos de cidade. se calhar com mais sangue perdido. mas sem mosquitos. § não saberia bem como nos contar, porque nunca fomos bem um ponto, ...