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Breve história de um fantasma

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Por Gustavo Arango O amor nos tempos do cólera é o romance de Gabriel García Márquez que melhor reflete sua relação com Cartagena das Índias: como na história de Florentino e Fermina, o amor do escritor pela cidade abarcou quase toda sua vida; teve lugar em cenários de lendas; seu início foi promissor, mas houve desencontros; a entrega dos amantes tardou mais de meio século; e, igual Florentino, García Márquez “se propôs ganhar fama e fortuna para merecê-la”. O idílio começou em abril de 1948. Gabito, como então era chamado, tinha vinte e um anos e acabava de fugir do Bogotazo – uma série de protestos e desordens que surgiram após o assassinato do líder liberal e candidato a presidente Jorge Eliécer Gaitán em 9 de abril de 1948 no centro de Bogotá, durante o governo do Presidente Mariano Ospina Pérez. Chegava a Cartagena para fazer seus estudos de Direito e o impacto foi imediato: “A cidade era tão charmosa que parecia de mentira”. Os fantasmas deambulavam pelas ruas. M...

Boletim Letras 360º #170

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Boris Schnaiederman. Muito da literatura russa traduzida no Brasil devemos a este nome; o escritor e tradutor morreu esta semana. Deixou-nos um legado sem preço para cultura literária. Aqui estamos com mais uma edição do Boletim Letras 360º – a compilação de todos os sábados das notícias que circularam durante a semana em nossa página no Facebook. Agora, já somos 29 mil amigos! Só temos a agradecer muitíssimo a todos que chegam até o nosso cantinho.  Segunda-feira, 16/05 >>> Brasil: Romance premiado do Prêmio Nobel de Literatura Sinclair Lewis ganha tradução  Doutor Arrowsmith  é publicado pela Editora Amarilys. De 1925, a obra recebeu o prêmio Pulitzer no ano seguinte, que o escritor recusou por não concordar com suas regras e por achar que prêmios criam pessoas que buscam reconhecimento fácil, foi adaptada para o cinema em 1931 e concorreu em quatro categorias do Oscar. O romance conta a história de Martin Arrowsmith ante os diferentes cami...

Narcos, Cidade de Deus e o fracasso da guerra às drogas

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Por Rafael Kafka Narcos e Cidade de Deus são as leituras que faço no presente momento, uma no campo audiovisual e outra no campo literário (ainda não vi o famoso filme do cinema nacional) e representam bem o meu gosto por uma estética mais existencial e social que no presente momento de minha vida se mostra mais exacerbada, mesmo há anos já sendo uma considerável influência ideológica em meu ser. Muito influenciado por Antonio Candido, cada vez mais me convenço de o texto literário ser algo infestado pelas questões sociais que são vistas como relevantes pelo escritor. Sinto-me à vontade para ampliar tal noção para o texto audiovisual, em especial séries e filmes. Ainda assim, devo reconhecer que as séries em geral são fechadas em um dado nicho social de forma mais compacta que as obras literárias, que em seu desenrolar o escritor deixam transpassar, de maneira tangencial, muitos aspectos de vivências socialmente construídas. Nas séries, o social sempre me parece diluído...

Pedro Páramo, de Juan Rulfo

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Por Sérgio Pitol  O romance Pedro Páramo , do jovem autor Juan Rulfo, em dez anos depois de sua aparição já é considerado uma obra clássica da narrativa contemporânea mexicana e desfruta de um renome que ultrapassa amplamente as fronteiras dos territórios de língua espanhola na América. Hoje, apaziguados os ecos das polêmicas que suscitou quando da sua publicação, este romance é considerado um marco na criação literária no México, que finaliza o período da literatura dedicada à problemática do indianismo e inaugura uma nova época.  O mundo que nos apresenta Juan Rulfo, cuja peculiaridade se deve ao modo como o próprio autor o molda, é  o mundo de um ser quase desconhecido que vive à margem da civilização, excluído da sociedade moderna; um homem que vemos diariamente, mas dele apenas sabemos o que nos dizem os tratados sociológicos; um homem cujos costumes e vida são investigados e descritos pelos antropólogos: o índio mexicano.  Na literatura, este...

Rainer Maria Rilke: conter suavemente a morte

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Da correspondência entre o adolescente Franz Xaver Kappus e Rainer Maria Rilke ficaram as cartas-respostas do segundo, chamadas Cartas a um jovem poeta que ganharam reedição pela Biblioteca Azul / Globo Livros. Sem ver as missivas originais pode-se especular sobre a letra delicada e estilizada desenhada pela mão do poeta, tão ocupada em estratagemas de cortesia e formalidades. Basicamente, entre 1903 e 1908, o tcheco escreve ao “jovem poeta”, da Suécia, de Roma, de Paris ou Pisa. Reúne nesta série de cartas as temáticas de seu gosto, rilkianas, da solidão como “apoio”, como “casa”, da vida e da morte, como correntes inextrincáveis de mistério e do transe poético. Rilke aconselha a seu admirador sobre a busca primitiva, podemos assim dizer, o estilo próprio, a voz emancipada de influências. Um despertar de seu mundo interior e da relação de sensibilidade com o mundo, condições esperadas do poeta. “Para essas duas tarefas [amor e morte], que carregamos e transmit...

Os ídolos de Thomas Mann

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O Prêmio Nobel de Literatura alemão não deixou passar em branco a resposta para uma pergunta que deve rondar a cabeça de todo curioso por saber de um grande quais são os seus mais admirados. Claro, não nos deixou uma resposta pronta, que talvez grande parte deles não a tenha, mas, do que muito escreveu, sobretudo de ensaios sobre música, teatro e literatura, de prólogos, conferências, sabe-se as faixas de uma radiografia com os ídolos do autor de A montanha mágica . Neles, Mann aproxima-se de figuras como Wagner, Goethe, Tolstói, Zola, Tchekhov e de obras como Dom Quixote , de Miguel de Cervantes. Um excelente prosador, nenhum pouco pretensioso, que escolhe a anedota para chegar ao público. “Se me perguntarem que paixão, que relação emocional com as manifestações do mundo, da arte e da vida, considero a mais bela, mais alegre, proveitosa, imprescindível, responderia sem hesitar: é a admiração” – afirmava Thomas Mann. O grande escritor sustentou que dela é a fonte do amor, a ra...