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Cortázar em seu labirinto

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Por Gustavo Arango Julio Cortázar em Manágua. Foto: Susan Meiselas   Julio Cortázar era um leitor entusiasta: sublinhava, comentava, desenhava, guardava objetos e mensagens entre as páginas de seus livros. Sua biblioteca é o retrato minucioso de seu caminho intelectual, de suas admirações e reprovações; também de seus receios mais íntimos, do mórbido e do trivial. Na primavera de 1993, Aurora Bernárdez, sua primeira companheira e herdeira literária, colocou a biblioteca pessoal do escritor aos cuidados da Fundação Juan March, em Madri. Desde então está ali à disposição de estudiosos e do público em geral interessado na sua obra. No início era difícil conhecer a magnitude do tesouro. Em 2006, quando visitei pela primeira vez a biblioteca, a busca era como um jogo de adivinhações. Então, como agora, não havia acesso às estantes e os funcionários entregavam, por vez, um máximo de três livros. Era possível passar horas folheando, entregando e recebendo tomos nos quais ...

O Novo Jornalismo: uma corrente literária da prática jornalística

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Por Vinicius Colares As constantes revoluções dos anos 1960 agitaram o globo culturalmente, socialmente e politicamente. Atingiram, inevitavelmente, a prática jornalística. Não faltaram, nesse período, pautas marcantes para quem usava a notícia como matéria-prima: as ascensões e quedas de John F. Kennedy e Martin Luther King; o início da Guerra do Vietnã; e os primeiros passos de Neil Armstrong na lua. O mundo girava, os fatos aconteciam. A forma como eram narrados os acontecimentos, porém, não passava perto da profundidade que lhe era merecida. Era assim que pensava Tom Wolfe, um dos precursores do Novo Jornalismo. Pensando em um período de estrondosa agitação social, geralmente ligamos ao new journalism (nomenclatura norte-americana original) o termo movimento. Chamamos sempre de “o movimento Novo Jornalismo”. Marcelo Bulhões, em seu Jornalismo e literatura em convergência  (2007), porém, não confia essa terminação para marcá-lo. –  O New Journalis...

Boletim Letras 360º #186

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Uma antologia com contos inéditos de F. Scott Fitzgerald será publicada em 2017 nos Estados Unidos. Mais informações ao longo deste Boletim.  Eis a nossa já tradicional postagem de sábado com as notícias que circularam durante a semana em nossa página do Facebook. O Letras está prestes a atravessar sua primeira dezena de anos online; este boletim, portanto, em relação ao tempo de existência é muitíssimo recente. Mas é já uma referência e tanto para nós que fazemos o blog e para os leitores mais presentes. Segunda-feira, 05/09 >>> Portugal: Morreu Maria Isabel Barreno Pesquisadora e escritora — e juntamente com Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta uma das mulheres envolvidas no caso conhecido por “Caso das Três Marias” em 1972; quando estas publicaram a obra Novas cartas portuguesas , o livro foi proibido pela Ditadura e elas acusadas por um livro pornográfico e atentatório da moral pública e dos bons costumes. Nos dois anos de embate com a just...

Romantismo e adultério em O primo Basílio

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Por Rafael Kafka Luísa – a personagem central de O primo Basílio , grande romance realista português – é um ser que tenta transformar a realidade vivida por ela naquilo que lê nos livros cheios de peripécias românticas os quais chegam as suas mãos. Esse é o principal motivo a justificar o amor pelo primo que ressurge em sua vida depois de tantos anos do rompimento do relacionamento havido entre eles, o qual chegou ao fim por conta da viagem do jovem Basílio para o Brasil. A arte na vida de Luísa serve como complemento de uma realidade repleta de convenções e a partida do marido para uma viagem a negócios – Jorge, o marido, é engenheiro de minas – é o convite perfeito à aventura a coincidir com o retorno do ex-amante e primo. Em partes avançadas da história, quando se embrenha em amores com Basílio, serão constantes as referências aos livros lidos e ao clima de romantismo que neles impera. Luísa é a personificação do ideal romântico burguês, sendo a antítese do ser conven...

Descobri que estava morto, de João Paulo Cuenca

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Por Pedro Fernandes Este livro de João Paulo Cuenca aparece como uma peça rara na extensa produção literária na última década no Brasil porque reintegra a nossa tradição com uma das vertentes da literatura latino-americana melhor desenvolvida – a do realismo mágico. Claro que não inaugura esse diálogo porque esse é já uma parte de nossa tradição representada por obras de extrema valia como as de um José J. Veiga ou um José Cândido de Carvalho, para citar dos exemplos. Mas sua retomada, ainda que não em sua inteireza, porque o tom aqui prevalece na atmosfera que envolve o relato, é, reiteramos, uma acertada decisão para um escritor cuja obra encontra-se ainda na jovem fase de busca pelo acerto estilístico. Talvez seja preferível enxergar nessas raízes não propriamente um realismo do tipo mas uma forma do que honestamente chamaríamos por realismo insólito, aquele cuja narrativa é decorrente de uma situação embora quase trivial  coloca os envolvidos nela, de um instante pa...

Julieta, de Pedro Almodóvar

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Em Julieta , ultra-sedutor opus 20 do diverso cineasta Pedro Almodóvar (depois de seus muito questionáveis filmes A pele que habito e Abraços partidos ), com roteiro seu baseado em três contos do livro Fugitiva (“Daqui a pouco”, Silêncio” e “Ocasião”) da hipersensível Prêmio Nobel canadense Alice Munro, a bela filóloga a ponto de uma viagem romântica a Portugal Julieta Arcos encontra por acaso numa rua madrilenha com Bea, a ex-melhor amiga de sua filha desaparecida Antía que lhe dá notícias de está muito bem radicada na Suíça.  Visceralmente, algo solta-se no interior da tranquila senhora que rompe com o garboso noivo argentino Lorenzo, amor que havia herdado da escultora e outrora rival Ava, muda-se para sua antiga morada e começa a escrever uma carta-desabafo-catarse, impossível de enviar por desconhecer a direção do destinatário, a sua filha, para resolver seus antigos mistérios dolorosos e assumir-se ela própria como um deles.  É quando reaparece em bela j...