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A importância de se chamar Elena Ferrante

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Por Jenn Díaz O desafio para quem escreve é preencher a distância entre o que você vive e o que conta, sentir fisicamente o impacto da narração... Frequentemente, começamos a escrever muito rápido e as páginas ainda estão frias. Só quando a história gruda em nós como uma luva, é chegado o momento de contá-la. (Elena Ferrante) Uma obra literária nem sempre se sustém por uma obra literária mas por um autor. Elena Ferrante nos obriga a aprender a ler corretamente: valorizar o que se tem entre mãos, que é um livro, e retirar daí toda a informação necessária. Ana María Matute disse que se alguém queria encontrá-la estava em seus livros. O que da Matute necessitamos saber e ter em conta é sua literatura e isso é o que Elena Ferrante nos oferece com seu anonimato – um livro puro. Não ser ninguém é um exercício a que o escritor não está, em sua grande maioria, disposto a fazer. Ser escritor, não é que tenha demasiadas vantagens sociais nem, certamente, econômicas, mas o artista no...

Boletim Letras 360º #218

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As notícias que circularam durante a semana em nossa página do Facebook. E ainda estão abertas as inscrições para participar da promoção que sorteia um exemplar do livro Da poesia , Hilda Hilst, edição que reúne toda a obra poética da escritora e inéditos.  Lygia Fagundes Telles e Jorge Amado. Um novo documentário sobre a escritora nos seus 94 anos. Segunda-feira, 17/04 >>> Brasil: Desconhecida no Brasil, não mais Scholastique Mukasonga é uma escritora tutsi de Ruanda nascida em 1956 e residente na Normandia, França. Foi sobrevivente dos massacres no Ruanda ocorridos na década de 1990. Autora de uma obra que inclui romances, poesias e contos, seu nome foi anunciado como participante na Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP). Até então desconhecida no Brasil, a obra de Scholastique ganha tradução de dois títulos, a sair pela Editora Nós: os romances Nossa Senhora do Nilo , que surpreendeu ao vencer o prestigiado Prêmio Renaudot, em 2012, e A mu...

O marechal de costas, de José Luiz Passos

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Por Pedro Fernandes “A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”. A frase de Karl Marx, assim deslocada da obra em que foi gestada nunca serviu tão bem ao momento pelo qual passamos – dentro e fora do Brasil. Algumas forças que, displicentemente, pensávamos sepultadas nos anais da história, voltam à ribalta e ameaçam cada vez mais assustadoramente voltar aos tempos de razão cega e sectarista responsável pelos momentos mais dolorosos de nossa curta estadia no mundo como civilização. E essa é a frase que bem poderíamos apresentar como explicação metodológica sobre a criação de O marechal de costas , de José Luiz Passos. Agora, antes de justificar a razão, é preciso fazer duas perguntas: uma é, qual o limite da realidade histórica metida num romance e, outra, desmembrada da primeira, é, até que ponto o romancista pode controlar as forças de seu tempo na influência de uma composição romanesca. Provavelmente, a resposta que obtivermos das duas q...

O filho de Saul, de László Nemes

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Por Pedro Fernandes Não foi em vão que O filho de Saul ganhou o Grande Prêmio do Festival de Cannes e o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Não é o caso de retomada de alguns temas recorrentes à cinematografia sobre o nazismo alemão e o massacre a milhões de pessoas em nome de uma ideia perversa ou ainda o tema sobre a errância do povo judeu – dois epicentros da narrativa de Nemes vinda a lume no ano em que se passaram 70 anos do fechamento de Auschwitz pelos soviéticos. Nem foi esse dado histórico o que terá comovido o júri para a atribuição dos galardões. É a maneira muito autêntica encontrada pelo diretor húngaro para retomar esses dois temas. A narrativa de O filho de Saul se passa num dia da vida de um membro do chamado Sonderkommando, um grupo de trabalhadores formado por recrutas escolhidos tão logo chegavam ao campo de concentração e cuidava do serviço burocrático de detenção, execução, queima, manutenção e ordenação dos crematórios. Não sabe-se qual campo onde...

Uma farmácia literária que pode curar quase tudo

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A literatura como remédio, como uma cura aos males da vida. Os livros como cura para as feridas e as bibliotecas pessoais como tratamento sem efeitos colaterais. Isso se não perguntam ao fidalgo criado por Miguel de Cervantes que talvez, em seu são juízo, dissesse o contrário. Os livros como remédio para tudo. Ou para quase tudo. De flatulência à desilusão amorosa. Contra o medo da morte, Gabriel García Márquez e Cem anos de solidão . Contra o medo às situações difíceis, perigosas, Harper Lee e sua personagem Atticus Finch, de O sol é para todos . Contra o medo do compromisso, o Prêmio Nobel de Literatura português José Saramago e seu Ensaio sobre a cegueira . E por aí vai, uma recomendação após outra com os motivos e os conselhos a modo de instruções de uso. Instruções que, aliás, são muito simples: sente e leia. Embora neste prospecto de quase quatrocentas páginas não advirtam os efeitos colaterais nem se faz necessário consultar um especialista. Apresentado pela ...

Sobre o “boom latino-americano” e outros demônios

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Por Christopher Domínguez Michael Ao comemorar o meio século da aparição de Cem anos de solidão , Troca de pele e Três tristes tigres , obras de Gabriel García Márquez (1927-2014), Carlos Fuentes (1928-2012) e Guillermo Cabrera Infante (1929-2005), festejamos (ou ponderamos, se possível) os anos que nos separam do esplendor do boom latino-americano que mudou o destino da língua espanhola como só havia acontecido antes durante o Século de Ouro, durante a aparição de Rubén Darío culminando a penúltima década do século XIX e com os poetas peninsulares da geração de 1927. Três momentos suficientes para garantir o que, de maneira incrível e antes daquele 1967, se colocava em dúvida: o lugar capital da língua espanhola, nos princípios da modernidade (Shakespeare, segundo Roger Chartier, lendo Cervantes) e durante seus longos e nebulosos anos finais com um Borges como um dos escritores mais influentes do planeta. Quem lamentou nossa ruína, sempre rápidos, foram os professores a...