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Sobre Joseph Roth: um kaddish para Áustria

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Por W. G. Sebald E o conde perguntou ao judeu: “Salomão, que pensas do mundo?” “Senhor conde”, disse Piniowsky, “já não penso nada de nada”. Joseph Roth, O busto do imperador Em maio de 1913, o jovem Joseph Moses Roth colocou um limpo ponto final no instituto alemão de Brody à sua infância e juventude nada livres de cuidados, ao terminar com a qualificação “sub auspiciis imperatoris”, a entrada de sua promoção, os exames para o bacharelado. Estava a ponto de cair no mundo, passando por Lemberg e Viena, e me parece que naquele momento virou as costas com pesar para sua pátria, embora aquilo a que renunciou, ao fazê-lo, se converteu logo para ele em símbolo de todos os irreparáveis negócios desastrosos que compõem a existência. Só em retrospectiva descobriu a Galícia; colocou no lugar de uma pátria destruída pela guerra, que com a dissolução do Império havia desaparecido definitivamente dos mapas, um vasto país nostálgico da Coroa. Roth, que quanto mais o temp...

Boletim Letras 360º #246

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No início da semana, dois espaços virtuais do Letras premiou leitores: na nossa página no Facebook sorteamos Zero K , o novo romance do escritor estadunidense Don DeLillo, e A família Manzoni , da escritora italiana Natalia Ginzburg; no Twitter @Letrasinverso sorteamos a caixa Lewis Carroll da Editora 34, que reúne os livros As aventuras de Alice no País das Maravilhas  e Através do espelho e o que Alice encontrou lá . Alcançamos assim a marca de 181 livros distribuídos em cinco anos. Contas prestadas, vamos   às notícias que copiamos durante a semana em nossa página no Facebook. O romance inédito de Ariano Suassuna chega às livrarias brasileiras. Segunda-feira, 30/10 >>> Brasil: A Editora Carambaia publicará um dos romances da lista de inéditos por aqui e que celebra 100 anos da primeira edição agora em 2017 Falamos sobre Húmus , de Raul Brandão. A obra considerada uma das mais inovadoras de literatura portuguesa do sécul...

A pedagogia em tempos de ódio

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Por Rafael Kafka Soube que o Movimento Escola sem Partido ganhou na justiça o direito de anular o critério do ENEM na correção das redações do certame o qual zera todas as composições que firam os Direitos Humanos. Com o choque, vi-me novamente com meus 17 anos tentando a prova pela primeira vez e lendo os critérios da redação, que naquele ano tinha o tema do poder transformador da leitura. Quando olhei a parte que falava da redação não poder ferir os Direitos Humanos, tive uma reação de repulsa, nada comparada a nenhuma das reações que hoje pululam nas redes sociais, mas ainda assim muito curiosa para o meu eu de hoje. Fui criado com muita influência dos programas sensacionalistas, principalmente depois que a faixa de desenhos do SBT, no começo da tarde, passou a ser trocada por novelas mexicanas das mais insuportáveis, as quais levaram minha família a cultivarem programas com jornalistas sem formação intelectual alguma pregando a limpeza da população pobre sob a forma ...

O túmulo de Oscar Wilde

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Por Márcio de Lima Dantas Estudo de Epstein para o túmulo de Oscar Wilde, 1909 O escritor irlandês Oscar Wilde (1854-1900) está sepultado no cemitério de Père Lachaise, a maior necrópole de Paris. Seu túmulo é um dos mais visitados: sempre se encontram pessoas prestando homenagens ao poeta que morreu exilado na cidade. Seu monumento funerário foi realizado pelo escultor Jacob Epstein. O túmulo é composto por três grandes blocos maciços de granito justapostos e paralelos, formando um paralelepípedo retângulo, os quais, por sua vez, repousam sobre uma grande base da mesma pedra. No bloco da frente, encontra-se esculpido um personagem representando uma esfinge alada, de forma que esta, concebida com o predomínio de linhas curvas, acomoda-se nos limites do grande paralelepípedo. Junto com os outros dois, conformam um só bloco maciço. Essa figura encontra-se de perfil para quem se encontra na frente. E parece dormir profundamente. Quando a encaramos de frente, constatamos...

Angela Carter, a primazia de subverter

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O grande trabalho de Angela Carter é o de dinamitar os arquétipos tradicionais da literatura universal; dos contos orais coletados pelos irmãos Grimm até mesmo personagens e situações da obra de William Shakespeare, todos passam por uma prosa ousada, eivada de um imaginário gótico no qual se misturam fadas, vampiros, lobos e chapeuzinhos vermelhos, passam à rede de significações que envolvem o feminismo, o tabu, o simbolismo e a cultura pop.  Angela Carter é, portanto, uma escritora cuja obra estar além de qualquer classificação generalista. Nasceu no condado de Sussex mas muito pequena fugiu com avó por causa dos bombardeios alemães na Segunda Guerra Mundial. O périplo levou a família se instalar em Londres, onde seu pai passou a trabalhar como jornalista. Ela seguiu seus passos e desde os 19 anos esteve metida entre tintas e papéis. Depois se casou e estudou literatura inglesa na Universidade de Bristol e chegou a trabalhar em cursos de escrita criativa frequenta...

Uma pedra no caminho para a modernidade: o projeto drummondiano de humanizar o Brasil

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Por Thomas Sträter Os poemas do início da formação artística de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), os dos anos vinte e trinta, ainda refletem a difícil busca da estética do jovem poeta, suas incertezas e angústias, seu entusiasmo e suas idiossincrasias. Embora estes textos tenham permanecido até hoje como os mais conhecidos do poeta mineiro, carecem do amadurecimento característico de sua fase posterior. Sem dúvida neles estão definidos mais nitidamente os problemas estético-sociais de um poeta latino-americano à procura do seu lugar dentro de sua cultura específica. Em 1924, um grupo de artistas brasileiros, chefiados pelo assim chamado papa do modernismo, Mário de Andrade, viajou em busca das raízes do Brasil para o estado de Minas Gerais, famoso por sua arquitetura barroco-colonial. Na capital, Belo Horizonte, a caravana era esperada ansiosamente pelos jovens poetas mineiros; entre os quais se encontrava o jovem poeta de vinte e um anos, Carlos Drummond de Andrad...