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Por que o pensamento político de Simone de Beauvoir é importante hoje

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Por Skye C. Cleary Simone de Beauvoir em seu apartamento em Paris, 1985. Foto: Gérard Gastaud Simone de Beauvoir é conhecida pela frase “não se nasce mulher, torna-se mulher”. Uma face de seu pensamento menos conhecida, e particularmente relevante hoje, é seu ativismo político, um ponto de vista que nasce diretamente de sua atitude metafísica sobre o eu, segundo a qual não temos essência fixa. A máxima existencialista de que a “existência precede a essência” é sustentada pela filosofia de Beauvoir. Para ela, como para Jean-Paul Sartre, primeiro nos lançam ao mundo e então criamos nosso ser agindo. Embora existam acontecimentos de nossa existência que não podemos escolher, como nascer, quem são nossos pais, ou nossa herança genética, não deveríamos usar a biologia ou a história como desculpas para o comodismo. O objetivo existencial é ser agente, tomar controle sobre nossa vida, transcender ativamente os acontecimentos de nossa existência perseguindo ob...

Letras andróginas

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Por Silvia Alexandrowitch A poesia de Lord Byron e Arthur Rimbaud não coincide em nada, mas a vida e as características dos dois todavia permanecem como modelo estético de artistas do tipo boêmios e malditos. O primeiro foi um poeta romântico, o segundo, um simbolista. O primeiro morreu em 1824 e o segundo nasceu em 1854. Por nenhum deles passou pela cabeça criar um pseudônimo para se proteger numa sociedade embora disposta a aplaudir suas obras, moralmente rígida, e logo condenatória de suas vidas extravagantes. O dandismo, a androginia e a ambiguidade sexual foram motivos para escárnio, mas, no fim de tudo, eram homens com todos seus atributos. Isto somado ao imenso talento permitiram-lhes escrever intensa e prolificamente e viajar por países exóticos. Eram homens, tinham seus direitos. Byron acumulou dívidas e escândalos, excessos de todo tipo: amantes, amores homossexuais, filhos abandonados, travestismos. Buscou o autoexílio para se livrar da censura britânica q...

Boletim Letras 360º #265

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No domingo, 11, noticiamos em nossa página no Facebook algumas novidades por vir aos que acompanham o Letras. Uma delas já está em andamento neste momento: as inscrições para o sorteio de um exemplar de Uma forma de saudade , livro que reúne textos autobiográficos, alguns inéditos, do poeta Carlos Drummond de Andrade. Tudo acontece no nosso Instagram @Letrasinverso. A outra novidade é a chegada do terceiro novo colunista, para breve. A seguir as notícias da semana. Segunda-feira, 12/03 >>> Brasil: Novos autores portugueses do lado de cá A coleção Trás-os-mares, publicada pela editora Circuito com o apoio do Direção-Geral dos Livros, dos Arquivos e das Bibliotecas Públicas de Portugal (DGLAB) e com a coordenação editorial de Maria João Cantinho e Renato Rezende, apresenta ao público brasileiro prosadores portugueses contemporâneos da mais alta qualidade literária. A primeira leva, publicada em abril de 2018, compreende Até para o ano em Jerus...

Kárita e Kundera

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Por Rafael Kafka Quando conheci Kárita, lembrei-me da primeira experiência tida por mim ao ler A insustentável leveza do ser . Eu ainda era o Rafael que lia os livros pensando encontrar uma resposta concreta para os dilemas que se me apareciam na vida e levaria ainda anos para entender que muitas vezes a simples reflexão e exercício de crítica são as respostas melhores por indicarem mudança de olhar e direcionamento para além do óbvio. A primeira cena narrada deste romance é a de quando o autor supostamente encontra Thomas pela primeira vez. Ele então introduz um elemento muito comum em sua obra: uma reflexão a qual para leitores como o meu eu de 17 anos pode soar um andar em torno de nada para chegar a lugar algum. Curioso que reli o livro um ano depois da primeira vez na qual o lera e passaria dez anos mais ou menos sem ler nada de Kundera, até me deparar com o excelente A imortalidade . As reflexões existenciais de Kundera passaram a me encantar ainda mais, pois nã...

Uma forma de saudade, de Carlos Drummond de Andrade

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Por Pedro Fernandes Carlos Drummond de Andrade não alimentou o espírito narcisista – tentador e quase sempre o ar que sopra favorável à fogueira das vaidades de todo criador. O neto Pedro Augusto abre as notas reunidas em Uma forma de saudade com esta constatação ao recordar a opinião do avô acerca do trabalho do escritor em manter e tornar público seu dia-a-dia. Na opinião dele, a obra é suficiente para dizer sobre o autor e um diário, por exemplo, resultaria em objeto redundante, ou, ainda pior, puro exercício de exibição. Embora esta opinião do poeta de “No meio do caminho” tenha seu fundamento, ela é factível a diversos desenvolvimentos. Nela parece residir uma ideia segundo a qual os teóricos da literatura começaram por pensar a partir de uma negativa; na obra, haveria todas as marcas possíveis, ou quase isso, representativas de quem a escreveu, sendo impossível negar totalmente a presença do escritor na sua criação. Se, por vezes, Pedro encontra na obra do av...

Dunkirk, de Christopher Nolan

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Por Pedro Fernandes Foi comum ouvir, quando da apresentação de Dunkirk , que este filme era mais um sobre guerra. Mas não é. Não necessariamente nessa ordem. Toda a narrativa toma como pano de fundo o cenário de começo da Segunda Guerra Mundial – há mesmo cenas de combate aéreo e de ataques, mas os interesses estão em sublinhar desde aspectos individuais a coletivos que respondem por temas como superação, sobrevivência, convivência, empatia, força comunitária, conflitos de culturas etc. A história retomada é a da evacuação de Dunquerque; enquanto as forças de Adolf Hitler avançavam a largos passos sobre meia Europa, os britânicos necessitavam evacuar, numa mudança repentina de estratégia de ataque, 120 mil homens em cinco dias. A operação militar tinha o propósito inicial de levar 45 mil homens em dois dias; e, no fim, quase quatrocentos mil soldados conseguiram escapar entre 26 de maio e 4 de junho de 1940. Dos dez dias dessa operação, Nolan se concentra nos ú...