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A Embaixada

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Por Juan Quintero Herrera Ilustração: Richard Lindner (detalhe)   Ela continuou acreditando em Paco, apesar das tatuagens, dos comprimidos e da rotina das noites sem dormir. Naquela época ele nem imaginava que um dia viria a mudar. Apenas gozava os anos de juventude seguindo o lema de um escritor que proclamava que depois dos vinte e cinco anos não fazia mais sentido viver. E assim, existindo no limite, atingiu essa idade. Foi então que o amor causou a transformação. Por isso, naquela tarde, depois de já ter enfrentado duas entrevistas, penetrou orgulhoso naquela sala, cabelo crespo arrepiado, barba curta e desordenada, jeans, suéter branco e pasta embaixo do braço. Sentia-se completo. Independentemente do que viesse a acontecer, já era um vencedor. O agente indicou-lhe o assento, o único livre no pequeno ambiente. Dali pôde observar os outros, cada um à sua maneira enfeitado para a ocasião. Primeiro viu o velho em seu traje de domingo, reservado para os ca...

Boletim Letras 360º #268

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Estas são as notícias filtradas pelos interesses editoriais deste blog durante a semana em nossa página no Facebook. Boas leituras! A obra de Julio Cortázar passará a ser publicada pela Companhia das Letras. Segunda-feira, 02/04 >>> Brasil: Por aqui, a obra de Julio Cortázar está de casa nova  A Companhia das Letras anunciou que em 2019 passa a publicar a obra do autor argentino por aqui. A coleção começará com a publicação, inédita no Brasil, de uma reunião de todos os contos do escritor argentino, numa caixa, em dois volumes. Depois, serão lançadas novas edições para O jogo da amarelinha , Bestiário , Final do jogo , As armas secretas , Todos os fogos o fogo , Octaedro , Queremos tanto a Glenda , História de cronópios e de famas , Um tal Lucas , Os autonautas da cosmopista , Os prêmios , 62 modelo para armar , Divertimento , O exame , A volta ao dia em oitenta mundos , Último round , O discurso do urso  e a versão ilustrada por...

Escrever romances

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Por James Salter Os romances são mais longos que os contos e, em virtude dessa extensão, ou digamos amplitude, têm a oportunidade – e obrigado, mesmo – de ser mais complexos e possivelmente envolver mais personagens, chamá-las personas. A maioria dos romances são narrativas, ou seja, linhas em forma e fiéis à cronologia, movem-se para frente ou flutuam entre idas e vindas no tempo. A narrativa conta uma história e as histórias são a essência das coisas, o elemento fundamental. E. M. Forster, em Aspectos do romance , um ensaio inglês ligeiramente ultrapassado, fala da importância da contar uma história e as habilidades de uma de seus mais brilhantes artífices, a perspicaz filha do vizir, Sherazade. E embora fosse uma grande novelista, requintada em suas descrições, prudente em seus julgamentos, engenhosa para narrar incidentes, avançada em sua moral, eloquente na caracterização das personagens e grande conhecedora de três capitais do Oriente, não recorreu a nenhum destes do...

Aquela água toda, de João Anzanello Carrascoza

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Por Pedro Fernandes   O corriqueiro também está repleto de significâncias. Esta parece ser a constatação que serve ao escritor contemporâneo. Claro, não é esta uma afirmativa que precise servir de verdade inconteste a toda a literatura atual, mas ao menos se verifica com certa precisão nesta antologia de contos de João Anzanello Carrascoza. Aquela água toda , que serve de título para a obra, pode ser por esta razão, a história principal das onze narrações que, salvaguardando pequenas exceções, parecem recontar situações com as mesmas personagens: dois irmãos, o pai e a mãe. Claro, em torno delas circulam outras que dividem a cena narrativa das histórias contadas. Isso significa dizer que, além do mesmo interesse que as une, há certo traço de continuidade narrativa marcada pela recorrência de papéis, além, do mesmo tom de voz objetivo e soturno com as histórias são narradas. A conclusão acima apresentada é evidentemente produto de uma suposição i...

O destino de uma nação, de Joe Wright

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Por Pedro Fernandes Vez ou outra o Oscar de Melhor Ator é atribuído ao que melhor se espera para a categoria – por exemplo, em 2016 a Leonardo DiCaprio pela atuação em O regresso . Mas, em boa parte o destaque da atividade do profissional confunde-se com categorias como o prêmio para Maquiagem e Penteados. Foi o caso de Gary Oldman o ganhador de 2018. Embora outras premiações provem o contrário – o reconhecimento por sua atuação foi quase unânime: Globo de Ouro, Sindicato dos Atores, Bafta, Critics Choice Award; e, claro, sua atuação não seja nenhum pouco medíocre, não é possível se negar que esta é mais que ajudada pela quantidade de apetrechos externos que buscam uma fidelidade à figura representada. Obviamente que o ator aqui interpreta uma personagem histórica e isso é ainda outro bom motivo suficiente para esquecer os tais elementos visuais. Entretanto, eles são o que findam por chamar maior atenção que sua atividade de ator. Isto é, ao invés de uma atuação, findamos...

Os pesadelos de Ambrose Bierce

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Por Alberto Manguel Ambrose Bierce não amava a humanidade.  "Animal perdido no êxtase da contemplação daquilo que pensa ser, a ponto de negligenciar aquilo que sem dúvida devia ser", reza a definição de "homem" em seu notório Dicionário do Diabo . E continua: "Sua principal ocupação é o extermínio de outros animais e de sua própria espécie, a qual, entretanto, multiplica-se com rapidez tão insistente que infesta todas as áreas do planeta e Canadá". A biografia de Bierce confirma estes prejuízos. Embora não conheçamos nem o lugar nem a data de sua morte, sabemos que Ambrose Bierce nasceu numa cabana no interior do Estado de Ohio no dia 24 de junho de 1842. Seu pai, Marco Aurelio Bierce era um fazendeiro pobre, mas dono de uma excelente biblioteca, um louco que acreditava ter sido o secretário pessoal de um presidente estadunidense cujas indiscrições contava nas histórias familiares. Teve dez filhos (três dos quais morreram pouco depo...