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Promessa ao amanhecer, de Eric Barbier

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Por Pedro Fernandes Até este ano, o nome de Romain Gary deve fazer sentido para uma pequena e muito seleta parcela de leitores brasileiros; pode-se dizer sobre escritor francês que este integra a lista formada por nomes inquestionáveis da literatura amplamente lidos durante certo tempo e depois lançados a uma espécie de limbo onde repousam à espera de possível resgate. Essas afirmações encontram justificativas em vários dados: na ausência total da presença de Gary nas livrarias e na quantidade ampla de títulos traduzidos por aqui, dos quais é possível citar, Lady L. , As pipas , Nas sombras do Vaticano , O rouxinol sempre retorna , O último suspiro e Luz-mulher . No Brasil, parece que, qualquer autor que tenha mais de três títulos traduzidos em pouco espaço de tempo – e estes estão entre os anos 1960 (data da publicação do primeiro título listado) e 1987 (quando da publicação do último título) – estão / estiveram no auge. Bom, mas há uma pequena exceção capaz d...

Seis lições de Doris Lessing

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Por Daniel Gascón “Manter uma opinião dissidente, sendo parte de um grupo, é a coisa mais difícil do mundo”: este poderia ser o tema principal de Prisões que escolhemos para viver , de Doris Lessing. O volume recolhe cinco conferências que autora ministrou para a Canadian Broadcasting Corporation em 1985 e uma sexta, ministrada sete anos depois na Universidade de Rutgers. Em certa medida é um livro sobre a independência do pensamento e suas complicações. A autora, galardoada com o Prêmio Nobel de Literatura em 2007, utiliza suas próprias experiências, tanto as vividas em Rodésia (atualmente Zimbábue) como as de sua vida de militante comunista e pós-militância. Mas não recai, nessa dissidência, nem em sua biografia, o que é muito bom, e o que não quer dizer que ela tenha sido imune a esse impulso gregário. (Certamente, se existissem tantos dissidentes no momento da verdade como existem retrospectivamente, não existiria gregarismo). O livro, humilde e às v...

Naipaul, o primeiro escritor

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Por Carlos Manuel Álvarez Rodríguez O olhar constrito e áspero de V. S. Naipaul em qualquer de suas fotografias da maturidade é o olhar do velho insuportável a alguém que vem-lhe roubar maçãs ou morangos do seu quintal enquanto prefere que apodreçam a dá-los. Sua misantropia e crueldade proverbiais pareciam fascinar, talvez assustar, não tanto já pela misantropia e crueldade propriamente ditas, mas por seu reconhecimento pleno de ambas. Naipaul não ocultava seu sadismo, o reivindicava e permitia logo sua aparição em biografias autorizadas. No ensaio As trevas de Conrad [tradução livre], publicado originalmente em The New York Review of Books no outono de 1974, Naipaul disse que o interesse pela obra de um autor leva indefectivelmente ao interesse por sua vida. Não é verdade. Mas, tudo isso se torna a mesma coisa – a vida, a obra, o escritor cindido entre sua matéria e o que escritor é – em O enigma da chegada , um romance que não é de ninguém, escrito “com a sen...

Boletim Letras 360º #287

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Estamos  colocando o ponto final em mais uma semana e sempre (como é de costume) pensando nas matérias que irão compor este blog nos dias seguintes. Por enquanto, a comum reunião das notícias que foram publicadas em nossa página no Facebook. Boas leituras! Roberto Bolaño. Finalmente, teremos em português a poesia do escritor chileno. Mais detalhes ao longo deste Boletim. Domingo, 12/08 >>> Inglaterra: Morreu o escritor britânico V.S. Naipaul, premiado com o Nobel de Literatura em 2001 Nascido em Trinidad e Tobago, estudou Literatura inglesa na Universidade de Oxford, antes de se estabelecer na Inglaterra. Passou muito tempo viajando e se tornou um símbolo do desenraizamento moderno. Naipaul mudou-se em 1950 para a Inglaterra, onde trabalhou como jornalista para a rede de TV britânica BBC. Doutor Honoris C ausa pelas universidades de Cambridge, Londres, Oxford e Columbia, ele foi ainda sagrado cavaleiro britânico pela rainha Elizabeth ...

Historicidade como signo de autonomia e liberdade

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Por Rafael Kafka El Disco Negro , Carlos Mérida “Somente quando a ontologia do marxismo for capaz de praticar coerentemente a historicidade como fundamento de qualquer conhecimento do ser no sentido do profético programa de Marx, só quando, reconhecendo determinados princípios últimos com prováveis e unitários de todo ser, passam a ser compreendias corretamente as diferenças entre as esferas ontológicas particulares e a 'dialética da natureza' já não mais se apresenta como uma equalização uniformizante de natureza e sociedade, que muitas vezes deforma o ser de ambas de várias maneiras, mas como pré-história em termos categorias do ser social”.  Lukács,   Prolegômenos para uma ontologia do ser social , p. 189 Há uma preocupação constante de Lukács em seus Prolegômenos para uma ontologia do ser social  em definir os rumos de uma ontologia da condição humana que foque nos elementos sociais e de singularidade presentes nela, algo muito deturpad...

Na pureza do sacrilégio, de Carlos Cardoso

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Por Pedro Fernandes E como falar de outra forma? de cortar e reformatar o futuro, e assim querer e ser sem par. A pergunta lançada pelo primeiro poema de Na pureza do sacrilégio é capciosa: abre-se em direção a pelo menos outras duas interrogações. A primeira delas é produto da angústia de todo poeta. Num tempo quando perdemos as contas de vozes tão singulares e válidas por gerações e temporalidades, o que ainda resta dizer em forma de poema? A outra, derivada desta, como ser outra vez voz entre vozes depois de algumas largadas? Não pense o leitor que as respostas venham logo em seguida. Nem no livro; tampouco aqui. Ao contrário, o poema abre-se em outras indagações e finda por se constituir um canto angustiado de alguém que parece sentir-se a esmo à procura de uma resposta, mesmo sabedor de que esta não vem ou não existe (em matéria de poesia) de forma simples e objetiva. O mesmo vale para estas notas. O bom poeta é cônscio de que a única respo...