Postagens

James Baldwin: indispensável

Imagem
Por Sofía Viramontes James Baldwin soube que ia ser escritor quando seu pai morreu. Antes disso pensou que talvez podia se dedicar a outra coisa: “queria ser músico, pensei em ser pintor, pensei em ser ator”, disse em 1984 numa entrevista a Paris Review . Seu pai, David Baldwin, foi pregador. James, o mais velho de nove filhos, também chegou a ser da mesma profissão durante três anos. Dedicou-se a isso entre os catorze e os dezessete anos e assegura que foi nesse tempo que, ainda sem saber, se tornou escritor. Quando seu pai adotivo (nunca conheceu o biológico) morreu, o quase-escritor tinha dezenove anos. Segundo Baldwin, ser pregador e escritor requer personalidades contrárias. “Ambos trabalhos são completamente distintos. Quando você está no púlpito deve soar como quem sabe o que diz. Quando está escrevendo, está tentando averiguar algo que não sabe. A linguagem da literatura para mim é descobrir o que não sabe, o que não quer descobrir”. James Bald...

História de uma gaivota e do gato que a ensinou a voar, de Luís Sepúlveda

Imagem
Por Pedro Belo Clara Evocamos hoje, se tal exercício sequer comportar qualquer utilidade prática, um dos maiores e mais bem sucedidos escritores sul-americanos da actualidade. A comprová-lo estarão os inúmeros prémios que ao longo dos anos lhe têm adornado o currículo, dos quais o Prémio Eduardo Lourenço, em 2016, é somente o exemplo mais recente; além, e é aqui que o foco maioritário deverá incidir, de uma considerável difusão da sua obra a nível mundial, com especial destaque para os países latinos europeus, onde Sepúlveda desfruta por norma de um enorme carinho. A obra que trazemos hoje à lembrança, ainda que para alguns leitores possa ser uma completa novidade, foi editada em 1996 e, desde então, tem gozado de um estatuto idêntico ao de O Velho que Lia Romances de Amor , de 1989, por muitos ainda hoje considerado um dos melhores livros deste autor nascido no Chile, no ano de 1949. Na verdade, nos primeiros anos do século XXI, em Portugal, esta adorável história de...

Boletim Letras 360º #304

Imagem
Em breve abrimos em nossa página no Facebook uma enquete sobre qual foi a sua melhor leitura do ano. Nos últimos três anos fizemos essa consulta que resulta numa lista dos melhores livros do ano construída apenas pelos que acompanham o blog. E este ano, novas surpresas. Aguarde. Enquanto isso, vamos às notícias apresentadas nesta semana por lá.  Outra vez Mário de Sá-Carneiro. Editora brasileira começa a reeditar obra do escritor português. Segunda-feira, 10/12 >>> Brasil: Outra oportunidade de visitar a obra de Mário de Sá-Carneiro O poeta e ficcionista foi, ao lado de Fernando Pessoa e Almada Negreiros, um dos principais representantes do Modernismo português. Sua figura é de suma importância para a compreensão do modo como o Modernismo português se formou. No Brasil, sua obra ainda é pouco conhecida, apesar de já temos entre nós algumas publicações de seus poemas. A Editora Moinhos lança-se a mais uma empreitada excelent...

Literatura muito além da literatura

Imagem
Por Javier Cercas Um dos melhores textos literários que li na minha vida não é um texto literário. Nem sequer foi pensado para ser publicado. Foi escrito pelo escritor israelita David Grossman e lido no funeral de seu filho Uri, morto em 21 de agosto de 2006, quando o tanque onde estava avançava pelo sul do Líbano e foi alcançado por um míssil do Hezbollah; os jornalistas presentes nas exéquias reproduziram com mais ou menos fidelidade passagens do discurso fúnebre e no fim, para evitar confusões, Grossman o corrigiu e entregou aos jornais e vários o reproduziram. Embora dias antes da morte de seu filho Grossman tenha assinado com outros escritores um pedido ao Governo israelita para que desse por terminadas suas operações militares no Líbano, ao longo do texto apenas se diz uma única palavra sobre o conflito, exceto o título: “Nossa família perdeu a guerra”. Grossman fala das coisas que nunca voltará a fazer com seu filho, como ver Os Simpson , e das coisas q...

O imoralista, de André Gide

Imagem
Por Pedro Fernandes “Das mil formas de vida, cada um de nós só pode conhecer uma. Desejar a felicidade dos outros é loucura; não saberíamos que fazer dela. A felicidade não se compra feita, quer-se sob medida”. Estas sentenças são de Ménalque, uma figura que frequentaria o mesmo clube de Lord Henry Wotton, amigo de Michel, a personagem principal do romance de André Gide que também faria par na mesma estante de O retrato de Dorian Gray , de Oscar Wilde. O que Ménalque oferece é mais do que assanhar os desejos intocados, guardados nos lugares mais adormecidos da consciência do amigo, quem a esta altura, depois de atravessar uma complexa enfermidade, vive imerso na vontade de negar totalmente o modo de vida que até então lhe determinara e abrir-se a outras expressões de viver, como se infectado repentinamente por uma doença do Carpe Diem ; as sentenças de Ménalque funcionam como chaves de acesso aos sentidos principais desse romance de André Gide. Ou, de maneira ainda mais e...

Gulosa por livros

Imagem
Por Victoria Livingstone Harriet de Onís e Guimarães Rosa, 1966. Foto: Alfred A. Knopf  Em dezembro de 1948, o  New York Times  publicou um artigo sobre a tradutora Harriet de Onís intitulado “Sra. De Onís põe o saber latino-americano em livro, mas o sabor latino invade sua cozinha” [“Mrs. De Onís puts Latins’ Lore in Book, but Their Cuisine Goes Into Her Kitchen”]. O artigo começa por uma breve menção a  The Golden Land: An Anthology of Latin American Folklore in Literature , editado por de Onís e publicado pela Alfred A. Knopf apenas dois meses antes, mas, em seguida, reduz suas conquistas tradutórias a trabalho doméstico. O jornalista descreve o que a tradutora cozinhava para seu marido Federico de Onís, renomado estudioso de literatura hispânica, e cita Carl Ackerman, então decano da faculdade de jornalismo da Universidade Columbia, que disse que uma “aula de torta de maçã” ministrada por Onís na Venezuela “faria mais para consolidar as relaçõe...