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O deslocamento como linguagem e caminho

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Por Tiago D. Oliveira Viajar é pela viagem em si. É para ter o caminho debaixo dos pés. Adriana Lisboa, Rakushisha Pensar a representação de um objeto literário é o primeiro passo depois da leitura de sua apresentação, o que se desenha com maiores detalhes quando as páginas do livro chegam ao fim. Stuart Hall afirma que representação significa utilizar a linguagem para inteligivelmente, expressar algo sobre o mundo ou representá-lo a outras pessoas, o que aponta em O papel da representação . Em Sábado , livro publicado pela Editora ParaLeLo13S em 2018, a editora, poeta e tradutora, Sarah Rebecca Kersley, utiliza a escrita como registro de sua condição de deslocamento e aos poucos tece uma busca que faz do caminho a linguagem para uma mensagem pulsante e contínua sobre questões de identidade, cultura, língua, tradução, literatura e vida. O livro começa quando Sarah realiza em 2017 uma viagem para visitar a família depois de descobrir um problema de saúde de seu pa...

Sobre celulares, ratos e homens

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Por Gabriel Stroka Ceballos Esses dias terminei de ler Ratos e homens . O clássico de Steinbeck fala sobre a amizade de dois tipos muito diferentes entre si: Lennie, um grandalhão bruto e ingênuo como uma criança e George, um homem pequeno, inquieto e sagaz. Mas, como todo clássico, o livro também fala (ou ao menos abre margem) para muito mais. Um destes pontos é a solidão quase onipresente entre os demais personagens. Publicado em 1937, à época da Grande Depressão, Steinbeck conta sobre a busca destes dois parceiros por trabalho nas fazendas da Califórnia. A diferença entre eles e os demais personagens é que aqueles têm um vínculo profundo, enquanto todos os outros são como ilhas.  Inicialmente, essa repetida independência de relações poderia ser explicada pela situação social e histórica das figuras retratadas. São trabalhadores pobres tentando sobreviver na longa ressaca de uma crise econômica. A justificativa então seria que eles não se envolviam entre si...

Galáxia Juan José Saer

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Por Edgardo Dobry O sutil e preciso prólogo escrito por Ricardo Piglia para edição conjunta [publicada em língua espanhola em 2012] de Responso , La vuelta completa e Cicatrices se intitula “El lugar de Saer” [O lugar de Saer]; esse mesmo título havia sido usado por Piglia para uma conferência apresentada em 2006 na Universidade Pompeu Fabra, de Barcelona; mas, na verdade, “O lugar de Saer” foi, muito antes, um breve – e essencial – ensaio de María Teresa Gramuglio que apareceu como prólogo de Juan José Saer por Juan José Saer (Buenos Aires, 1986). A repetição não é gratuita: uma das operações obrigatórias da crítica frente a Saer (nascido em Serodino, Argentina, 1937 – morto em Paris, 2005) é, precisamente a determinação de seu lugar: descentrado como escritor argentino, porque sua narrativa não tem quase nunca como cenário Buenos Aires, e porque viveu os últimos trinta e cinco anos de sua vida em Paris.  Mas, embora sua obra incorpore abertamente a influência...

Breve (e solto) devaneio sobre "Outono azul a sul", de Calí Boreaz

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Por Pedro Belo Clara Prepare-se o leitor para escutar, na desfolha de cada poema, o ritmado pulsar dum coração de dupla raiz. Será, como a autora afirma, prova do seu firmado atlanticismo, que quando posto em conversa se assume numa atlanticofonia redonda, assim inteira e sem asperezas. Nesse eco quase em surdina reverberando pelos versos que se vão sucedendo, oferecem-se as linhas daqueles vastos horizontes onde um olhar de poeta de bom grado morre num sorriso de flores. (E também o dum bom leitor, acrescente-se.) Dir-se-á que em contemplações se plantou este livro de clandestinidades, de exílios e de amor ausente – ambos perfumados pela mais inebriante maresia, dando ênfase ora à vida que esbraceja ora à melancolia que lentamente se insinua. Mas o poema entre dá aos mais incautos um justo aviso: entre observar o mundo e viver no mundo há um frágil quase etéreo espaço De nada serve a testemunha passiva. Como conhecer o sabor vivo da amora sem ferir a mã...

Boletim Letras 360º #320

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Entrou abril e com este mês iniciamos a apresentação dos novos colunistas do blog. Estão acomodados para novas viagens, Rafa Ireno e Joaquim Serra. Aproveitamos para reiterar as boas-vindas e avisar aos nossos leitores que durante as próximas semanas, calmamente, chegarão os nomes restantes. Para não perder nenhuma informação é simples: fica atento ao Letras — temos postagens diárias e às nossas redes sociais (os links estão disponíveis no final deste boletim). Também queremos lembrá-lo sobre a nova promoção que realizamos em parceria com Global Editora; no dia 13 de abril, em nossa página no Facebook, sortearemos um exemplar da novíssima edição de Sagarana , de Guimarães Rosa. Avisos dados, vamos às notícias divulgadas esta semana em nossa página no Facebook, às dicas de leitura e outros ricos detalhes encontrados apenas aqui, no Boletim Letras 360º. Maria Teresa Horta. Foto: Luís Barra. A obra da poeta portuguesa começa a circular em edição brasileira. Mais det...

O blues inútil para Kublai Kan e útil para o mercador de fato preto

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Por Wagner Silva Gomes Na obra de Sérgio Blank, poeta que publicou os seus seis livros em 2011 compilados n' Os dias ímpares , é visível o estilo pop condicionado a "um freezer no lado esquerdo do peito" - para citar um verso do poema de  A tabela periódica  (1988 -1993) -, condicionado a "Luz para o olhar", a "Os olhos do espelho", de seu dia útil e "estilo de ser assim, tampouco" (1980-1984).  Seu lugar de poeta é um hiato, uma "chama rival na mesma VÍRGULA um toco" de onde diz do "Azul o vermelho o amarelo": "posso pontilhar todo um prisma / eu e meus olhos e meus pleonasmos". É o pop de "o sucesso no isqueiro / gang de fumaça azul e cinza". Se os dias que passam no prisma dos olhos são aparentemente mesmices, Sérgio nos mostra que o que sai da fumaça azul e cinza e ele pode revelar é algo digno do mercador e explorador veneziano Marcopolo, que convocado por Kubai Klan, imperador mong...