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Boletim Letras 360º #445

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    DO EDITOR   1. Caro leitor, numa das postagens desta semana no Twitter foi levantada a hipótese de encerrar as atividades deste Boletim a partir de 2022. Isso ainda não é coisa certa, mas passa pelo horizonte dos interesses. E o motivo mais simples é: esta é a publicação mais trabalhosa e a que rende menos retornos (quando era para ser o contrário). Basta dizer que, das editoras, por exemplo, salvas raríssimas exceções, o blog não recebe absolutamente nada — se não importunação porque divulgou-se isso e não aquilo, silêncio e porta na cara quando batemos em procura de ajuda, como fizemos ao longo dos últimos meses com nossa campanha de levantar fundos para cobrir despesas com o domínio e hospedagem do blog na web . Ou seja, querem vender e só vender. É triste, mas algumas verdades precisam ganhar forma; esse mundinho glorioso que quem está do outro da tela acredita, é puro engodo. A mentalidade do mercado editorial brasileiro é necrosada. Mais interessante que investi...

O segredo da perdurabilidade: a obra de Sara Gallardo

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Por Ana Llurba Sara Gallardo. Foto: Paula Pico Estrada.   Na última década, a obra ficcional e jornalística de Sara Gallardo (Argentina, 1931-1988) tem sido reeditada por editoras latino-americanas independentes. Mas, qual é o segredo de sua perdurabilidade, além de três décadas de sua morte e quatro de sua última obra publicada? Tentamos responder revisitando sua obra, consultando seus editores, assim como escritores contemporâneos que admiram seu trabalho.   Desde seu primeiro romance, Janeiro (1958), Gallardo explorou o desconcerto das classes sociais ricas, as pequenas hipocrisias, a perda da inocência, bem como uma reconfiguração da forma como o campo era abordado como um espaço literário, tocando temas polêmicos de sua época. Como, por exemplo, o estupro e as tentativas subsequentes do aborto de Nefer, a protagonista neste romance. Lida modestamente com “uma história de amor contrariado”; em Janeiro , a filha de um feirante de uma fazenda é vítima de abuso sexual por pa...

No meu tempo

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Por Lourenço Duarte © Sabine Pigalle. É do poeta Horácio a frase laudatio temporis acti , ou em português o “louvor do tempo antigo”. Este verso da Ars Poetica alude exatamente a isso: o passado é superior ao presente. E de quem pretendia Horácio troçar? Ora, dos velhos que também nós conhecemos. Dos senhores de bengala nos bancos de jardim a mastigar alguma coisa (uma dentadura desobediente, por exemplo), que murmuram de quando a quando “no meu tempo é que era bom!”; das velhinhas à janela, atentas como falcões à menor das imoralidades (um jovem de cabelo pintado, duas raparigas que se beijam) para de seguida rosnar “antigamente...”.   Mas a crítica de Horácio estende-se a todos nós. O passado é o sítio mais seguro para se viver. É, por excelência, o token da infalibilidade. E isto porque ele já aconteceu. Por já ter acontecido, mitificamo-lo. Erguemos muralhas de afeto em torno de certas memórias, e nomeamo-las assim guardiãs da nossa felicidade. “Ah, como era bom voltar a ser ...

Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida

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Por Pedro Fernandes   O único romance de Manuel Antônio de Almeida foi publicado originalmente, como grande parte dos títulos de seu tempo, em folhetins. Os folhetos saíram entre 1852 e 1853 na seção dominical “A Pacotilha” do jornal Correio Mercantil . O material revisado por Machado de Assis serviu para dar forma aos dois tomos da primeira edição em livro assinada por Um Brasileiro . No ensaio que abre a reunião de textos dispersos do escritor, Bernardo de Mendonça comenta que se não restaram informações sobre a recepção do público para as produções seriadas, sabe-se que o livro ficou encalhado e o fracasso de vendas deve ter levado desânimo ao autor para novas aventuras pela ficção. O mesmo jornal que publicou Memórias de um sargento de milícias chegou a anunciar um segundo romance de Almeida em 4 de julho de 1852; mas, Mistérios do Rio nunca veio à luz, tampouco restou qualquer outra informação além dessa a respeito.   A existência das Memórias é, assim, um tanto tortu...

A invenção de Drácula

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Por José de la Colina Cena de Drácula , filme de Tod Browning (1931). O vampiro humano sempre ressuscitado, o dândi noturno chupa-sangue, o príncipe universal da Transilvânia, o temível e agradável personagem que seria multiplicado por Hollywood e outras cinematografias, ou seja, o Conde Drácula, apareceu pela primeira vez no final do século XIX com o romance de um escritor nada ou quase nada conhecido: Bram Stoker. Mas, se sabe que, durante séculos e com ou sem nomes diferentes, o sinistro anti-herói vinha sendo auto-engendrado através das superstições arcaicas, dos folclores orais antigos e das literaturas populares e outras mais destacadas, como por exemplo: no  Satiricon , de Petrônio; n’ As mil e uma noites  (de Sherezade?); no  Dicionário Filosófico , de Voltaire; em  Smarra , de Nodier; em  A noiva de Corinto , de Goethe; no  Manuscrito encontrado em Zaragoza , de Potocki;  Vampirismus , de E. T. A. Hoffmann;  O vampiro , atribuíd...

Efêmeras notas para a efeméride de Fagundes Varela

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Por Fábio Roberto Ferreira Barreto Fagundes Varela. Arquivo: Biblioteca Nacional / Reprodução.                 Dissensos entre especialistas   Em edição especial do “Suplemento Literário” da Folha da Manhã , por ocasião das comemorações do centenário de nascimento de Fagundes Varela, Mucio Leão acertadamente escreveu sobre o poeta: “Ele é adorado por alguns; é negado e detestado por outros” ( Folha da Manhã , 24.08.1941, p. 25).   O literato Murilo Mendes — naquela mesma publicação — é elogioso: “Considero Fagundes Varela um dos maiores do Brasil, dos mais autênticos” ( Folha da Manhã , 24.08.1941, p. 32). Reconhecido especialista em literatura, o professor Antonio Carlos Secchin — no início do Século XXI —, prefaciando antologia que ele mesmo organizou, se junta ao coro: “Não haveria exagero em perceber na sua poesia a mais complexa construção literária de nosso Romantismo” (SECCHIN, 2005, p. 7).   José Veríssimo, por sua v...