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Museu do romance da eterna, de Macedonio Fernández

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Por Nestor García Canclini Capa da 1ª edição de  Museu do romance da eterna  (Centro Editora de América Latina, 1967) O espaço de Macedonio Fernández foi criado por expansão. Nada demonstra melhor isso que este romance publicado vários anos depois da sua morte, organizado definitivamente por seu filho, Adolfo de Obieta, mas que já no seu rascunho dedicava a primeira metade das páginas aos prólogos: cinquenta e seis tentativas de diferir o início da obra. Neles se narram as dúvidas, as hesitações, as desculpas do autor; elabora-se uma teoria estética; elegem-se as personagens que serão incluídas e se descreve a “personagem que não figura, cuja existência no romance a torna fantástica em relação ao próprio romance”; discute-se com Juan Pasamontes, que “queria ser empregado, não personagem do romance: o deixava nervoso que estivessam lendo-o; também com Nicolasa, a “personagem cozinheira”, que ao renunciar a obra a converte num “romance de jejuadores”, ameaça a sobrevivência do...

Saltburn, de Emerald Fennell

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Por Pedro Fernandes   A presença de Emerald Fennell no rol da fama como diretora de cinema aparece com Promising Young Woman , filme que ela escreveu, produziu, dirigiu e fez com que se tornasse a primeira mulher britânica indicada ao Oscar de Melhor Diretor. O feito não é apenas inédito ou grandioso. Ele é produto de uma obra que a altura fomentou expectativas muito positivas em relação aos próximos trabalhos de Fennell e eis que, dois anos adiante, somos apresentados a Saltburn , um filme que repete o interesse da crítica e das premiações especializadas com a atenção fora da curva do público. É possível que essa nova obra cumpra um passo a mais na carreira recente da diretora. O filme é bem executado, se organiza utilizando as estratégias que deram reconhecimento a outras produções reconhecidas ao longo da história do cinema e dos clichês que atendem bem ao gosto popular.   O reuso das narrativas de vida universitária e de romance gay são bons exemplos. Embora o filme não se...

Boletim Letras 360º #568

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LANÇAMENTOS Sergio Chejfec. Foto: Francesc Fernandez Dois novos livros do escritor argentino Sergio Chejfec ganham tradução e edição brasileiras . 1. Últimas notícias da escrita , pela Arte & Letra.   “Este livro pode ser lido como a história de um caderninho”. É através da figura do pequeno caderno de notas de capa verde que Sergio Chejfec inicia a viagem ensaística e narrativa aqui impressa. Um pequeno caderno de notas, esquecido numa vitrine pouco glamurosa, desenrola o fio narrativo que mescla as experiências contemplativas e modalidades conceituais, especialmente sobre as diferentes abordagens da escrita. Acima de tudo, Chejfec explana sua crença na escrita, prático e profundo, nos fazendo enxergar muito além de (e a) cada linha. Produzido no Laboratório Gráfico Arte & Letra, com impressão em risografia e encadernação manual, o livro tem tradução de Giovani T. Kurz.  Você pode comprar o livro aqui .   2. Meus dois mundos , pela Balaio Editorial.   Uma ca...

Oração para desaparecer, de Socorro Acioli

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Por Pedro Fernandes Socorro Acioli. Foto: Igor de Melo   Socorro Acioli regressa aos temas do misticismo popular e da obsessão amorosa aparecidos em A cabeça do santo . Se neste romance o ponto de interesse recai sobre o primeiro, em Oração para desaparecer é o segundo que constitui matéria dominante da narrativa. O entendimento da obsessão é aqui restaurado pelo polo positivo, ou seja, não recai sobre o outro lado que divisa com este sentimento em linha tênue e isso torna, muitas vezes, o andamento das circunstâncias neste romance um tanto cansativo, colocando em risco a própria forma do romanesco, esta que, diferente da novela, deve se ocupar dos seus interesses pela pluridimensionalidade. Ainda bem que o fundo do romance não é apenas o do imbróglio amoroso. É outra a sua melhor qualidade.   O material para a ficção é trazido da história e das fabulações populares que se instalam dentro e fora do acontecimento histórico: o soterramento da Igreja de Nossa Senhora da Concei...

Seis poemas de Adam Zagajewski

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Por Pedro Belo Clara Adam Zagajewski. Foto:  Tomasz Wiech   NÃO DEIXES QUE O LÚCIDO MOMENTO SE DISSOLVA   Não deixes que o lúcido momento se dissolva Que o radiante pensamento perdure na quietude embora a página esteja quase cheia e a chama trémula Não atingimos ainda o nível de nós próprios O conhecimento cresce lentamente como um dente do siso A estatura de um homem tem ainda uma incisura lá no alto numa porta branca De longe chega a voz alegre de um trompete e uma canção enrolada como um gato O que passa não cai no vazio Um fogueiro alimenta com carvão o fogo Não deixes que o lúcido momento se dissolva numa substância dura e seca Tens a obrigação de gravar a verdade       NA BELEZA CRIADA PELOS OUTROS   Só na beleza criada pelos outros existe consolação, na música e nos poemas dos outros Só os outros nos podem salvar, mesmo que a solidão tenha o sabor do ópio. Não são o inferno, os outros, se os espreitarmos de manhã, quando têm a testa limpa, lavad...

Boletim Letras 360º #567

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DO EDITOR   Olá, leitores! Nesta edição do Boletim Letras 360º com o pé ainda em 2023, mas o olho em 2024, venho registrar em nome dos que fazem este projeto os votos de um excelente novo ano, com plenas realizações, boas descobertas e aprendizagens com as novas leituras. Reitero ainda os agradecimentos pela companhia durante este ano, pelas ajudas com este projeto e aproveito para renovar o desejo de continuar de mãos dadas com todos para os desafios vindouros. Graciliano Ramos. Rio de Janeiro, 1952.   OS LIVROS POR VIR   1. Graciliano Ramos em domínio público .   No início da semana postamos aqui a chegada das primeiras edições de títulos da obra de Graciliano Ramos fora da casa editorial que publica sua obra desde 1975: Vidas secas e Angústia saem em janeiro pela Via Leitura. No meio da tarde do mesmo dia, a coluna Babel do jornal Estadão publicou uma matéria com entrevista ao neto de Graciliano, o também escritor Ricardo Ramos Filho. O texto apresenta que, p...