Jorge Fernandes, o poeta de vários atos
Por Pedro Fernandes
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Jorge Fernandes. Foto: Arquivo do jornal Tribuna do norte. |
Cento e vinte um anos nos separam
do nascimento de Jorge Fernandes de Oliveira ou simplesmente, como ficou
conhecido, Jorge Fernandes. O poeta nasceu em Natal no dia 22 de agosto de
1887. De uma família de outros poetas, destacando-se Sebastião Fernandes, Jorge
não se apresenta na cena literária potiguar já com seu Livro de Poemas, o
que mais na frente lhe dará o respaldo merecido, mas com um outro pequeno livro
em parceria com Ivo Filho, chamado Contos & Troças – Loucuras.
Trata-se dum livro composto de contos humorísticos e de poesias, sendo que a
prosa coube a Jorge e a poesia a Ivo. Além deste, publicou o autor pequenas
peças de teatro. Todas, ao dizer do crítico Tarcísio Gurgel, sem maior
importância.
A sua família nunca fora de muita
monta no Estado. Seus pais Manoel Fernandes de Oliveira e Francisca Fagundes
Fernandes tiveram ainda, além Jorge e Sebastião mais oito filhos. Era o pai
apenas professor público, desenhista, dominava o latim e a mãe, dona-de-casa
que, conforme Veríssimo de Melo, gostava de ler e possuía em casa as obras
completas de Gonçalves Dias, Manuel de Macedo e José de Alencar. Ao poeta, o
primeiro seria de bastante serventia mais tarde, quando parafrasearia num de
seus poemas os saudosos versos de “Canção do Exílio” – “Mas a grande vida
brasileira esbarra a inspiração/ Do pobre poeta que na sua terra tem
palmeira/Onde nunca cantou sabiá... (Ele só canta no mufumbo e nas
caatingas...)”.
Seria também esta D. Francisca sua
mãe das letras. Era natural por essa época que os filhos, por passarem mais
tempo com a mãe, que esta lhe fosse não apenas uma progenitora, mas também uma
educadora. E Jorge aprende a carta de ABC com a mãe. Carta de ABC que ele,
segundo conta Veríssimo de Melo, logo largou para ler os livros de Macedo e de
Alencar. Estudaria dois anos no Colégio Atheneu Norte-Rio-Grandense, mas não
seria aluno exemplar. Como resultado do abandono dos estudos seu pai
arranjou-lhe um emprego no comércio e trabalhou para a Fábrica Vigilante em
torno de vinte e cinco anos, saindo de lá, em 1930, para negociar com cafés e
bares da Rua Ulisses Caldas, tornando-se sócio de Firmo Guerra no famoso Café
Magestic.
Foi casado por duas vezes: em
1910, Maria Fagundes; em 1916, Alice Fernandes. É por esse intervalo de tempo,
mais precisamente 1914, que o poeta começou a escrever para jornais. Ao lado de
Ferreira Itajubá, Gotardo Neto, entre outros, aparece Jorge, pela primeira vez,
na revista da Oficina Literária Norte-Rio-Grandense, O Potiguar. Depois
chega a colaborar com vários jornais e revistas da época – O Tempo, A
Rua, Pax e o jornal humorístico Arurau.
Isso tudo resultaria no já falado
livro com Ivo Filho, Contos & Troças – Loucuras, publicado em 1909.
Cinco anos mais tarde, aparece o poeta como teatrólogo. Escreve e encena Anti-Cristo,
em colaboração com Virgílio Trindade; Céu Aberto, também com Virgílio e
Ezequiel Wanderley; Já Teve; O Brabo; e, Ave Maria. Assim como
seria com a poesia, também estas peças de Jorge eram dotadas dum caráter
inovador para época. Se o tempo que se aviltava no horizonte da sociedade era o
do minuto sonoro, da pressa, do arranque, conforme Câmara Cascudo, Jorge
introduzia essa condensação do tempo nas suas peças. Tinham elas o caráter de
“sketches”, como Ave Maria encenada em apenas um curto ato.
Desse corpo de peças e ainda O
Aniversário, Jorge escreveria Pelas Grades, peça de maior sucesso,
extraída de um dos seus contos. Pelas Grades chegou a ser encenada no
palco natalense por várias vezes, chegando a turnear por outras cidades e ser
adaptada para o rádio. Além destas, outras duas no mesmo estilo dos “sketches”,
também fizeram sucesso de crítica e público, que foram as tragicomédias de um
ato De Joelhos e Desesperada.
Todos estes atos, apesar do
sucesso, não deram o respaldo merecido a Jorge. Teria ele de esperar o ato do
lançamento de seu Livro de Poemas, em 1927. Com a poesia adere ao
Movimento Modernista de 22, juntamente com Câmara Cascudo, que foi,
indubitavelmente, quem alavancou seu nome, colocando-o em correspondência com o
poeta Mário de Andrade. Será por essa época que chega a ser incluído em antologias
modernistas do sul. Foi a partir desse ano que Jorge passa a escrever
periodicamente para o jornal A República, um dos mais importantes do
Estado, o que não lhe rende tanta coisa, dado o fato de que a receptividade à
sua poesia não ter sido feita com bom grado pela maioria do público, ainda que
a crítica da época se resumisse a Câmara Cascudo e estava Jorge avalizado por
ele.
Morava à Rua Vigário Bartolomeu,
que segundo os registros históricos, chamava-se Rua da Palha, numa casa de
porta e janela – semelhante a da foto da capa da quinta edição de seu livro
lançada esse ano pela Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Gostava dum bate-papo, de perguntar sobre as novidades. Atesta-nos os registros
como um poeta de temperamento irrequieto. Passou os últimos anos de sua vida
doente, vindo falecer no dia 17 de julho de 1953, em Natal. O reconhecimento
como divisor do ato no adro da poesia do Estado o poeta só teria bem mais
tarde.
Nota:
Este texto é fruto das
discussões desenvolvidas durante o Ciclo de Palestras Escritores e Escrituras Potiguares
realizado no estande do Jornal De Fato por ocasião da IV Feira do Livro
de Mossoró. É o primeiro de um conjunto de três e será publicado
sempre no caderno Domingo do referido jornal. “Jorge Fernandes, o poeta de vários atos” saiu no dia 17 de agosto de 2008.
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