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Mostrando postagens de outubro, 2025

Boletim Letras 360º #660

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DO EDITOR Saibam que na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você pode obter um bom desconto e ainda ajuda a manter o  Letras .  A sua ajuda é essencial para que este projeto permaneça online . László Krasznahorkai. Foto: Colin McPherson LANÇAMENTOS Chega aos leitores brasileiros Os itálicos são meus (1966), um dos principais registros da primeira onda da emigração russa, ocorrida logo após a Revolução de 1917 até meados dos anos 1920, e escrito por uma de suas representantes mais notáveis, a escritora e poetisa Nina Berbérova (1901–1993) . Berbérova nasceu em São Petersburgo e, realocando-se por diversas cidades, permaneceu na Rússia até 1922, quando deixou seu país de origem e migrou para a Europa ao lado de seu primeiro marido, o poeta Vladisláv Khodassiévitch (1886–1939), com quem passou temporadas na Alemanha, Tchecoslováquia e Itália. A partir de 1925, fixou residência em Paris, onde viveu por mais de duas décadas, até se mudar definit...

Debaixo de uma amendoim-acácia

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Por Tiago D. Oliveira Raoul Dufy, O baile popular (detalhe)  E há que se viver, mesmo sem conserto,  porque a vida é sempre tentativa.     — Carlos Drummond de Andrade Já é manhã de segunda-feira. Os carros seguem em direção à escola e eu sigo em outra. Entro na Filemon Andrade, sob os galhos de uma amendoim-acácia que se estica para tocar em minhas mãos. É uma manhã de primavera e me ponho a lembrar da madrugada anterior.  Está cada vez mais difícil aceitar um convite para sair à noite. Se for no meio da semana, chega a parecer quase uma ofensa, uma provocação. Mas nem sempre foi assim. Houve um tempo que contar os dias para que chegasse logo a sexta-feira era o que hoje podemos chamar de “dar um scroll ”. Toda vez que preciso muito sair, ceder às convenções de uma vida minimamente social, coloco-me a pensar nos moradores de Tristão da Cunha, um pedacinho de terra no sul do oceano atlântico, onde moram pouco mais de 200 pessoas. Um dos lugares mais remotos...

Violette Leduc: Minha mãe nunca me estendeu a mão

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Por Karen Villeda  Violette Leduc. Foto: René Saint-Paul A convidada , de Simone de Beauvoir, um romance que descreve o caso amoroso da filósofa com uma de suas alunas, foi o livro que levou Violette Leduc a se aproximar da autora. Era 1945 e Paris acabara de ser libertada e ela, que conhecera a filósofa por meio de amigos em comum, logo enviou-lhe um manuscrito: era L’Asphyxie (A asfixia), seu primeiro romance publicado no ano seguinte. Na altura Simone de Beauvoir concordou em ler o material e ficou cativada desde o início. A primeira linha era extremamente poderosa: “Minha mãe nunca me estendeu a mão”. A autora de O segundo sexo decidiu compartilhar essa história de uma infância reprimida com Albert Camus. Os escritos de Leduc também conquistaram o gosto do escritor, sendo dele a iniciativa de publicá-lo na coleção Espoir, que então coordenava para a editora Gallimard. L’Asphyxie , no entanto, passou despercebido, apesar dos elogios que recebeu de figuras como Jean Cocteau e J...

O trágico e o belo em O homem elefante

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Por Juliano Pedro Siqueira “Os olhos não veriam o sol se não fossem parecidos com o sol e a alma não verá a beleza se ela não for bela.” — Plotino (205-270 d.C) A justa genialidade atribuída a David Lynch geralmente se associa as suas grandes produções da maturidade, como o seriado surrealista Twin Peaks na década de 1990 e filmes como A cidade dos sonhos  nos anos 2000. Mas sua profícua imaginação já dava sinais de grandeza dez anos antes, quando dirigiu o extraordinário O homem elefante ; talvez seu trabalho menos conhecido.   O filme retrata a trágica e bela história de Joseph Carey Merrick (1862-1890), um inglês da Inglaterra Vitoriana que em decorrência da sua deformação congênita era explorado em apresentações circenses como o “espetáculo da aberração”. Merrick desenvolveu uma anomalia física aos três anos de idade, provavelmente o que a ciência moderna classificou de Síndrome de Proteus — crescimento excessivo e desproporcional de tecidos e músculos —, caracterizada por...

As últimas palavras de Nikolai Gógol

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Por Rebeca García Nieto  Retrato de Gógol (gravura, 1902) Mikhail Rundaltsov A morte de alguns escritores é muitas vezes mais romanesca do que seus próprios romances. Robert Walser passou as duas últimas décadas de sua vida em um sanatório, onde não escreveu uma palavra — afinal, como disse a Carl Seelig, estava lá para enlouquecer, não para escrever. Antes disso, sua escrita havia reduzido até praticamente desaparecer. Nikolai Gógol não demorou tanto para extinguir sua escrita. Na noite de 24 de fevereiro de 1852, atirou o que viria a ser a segunda parte de Almas mortas ao fogo. Com esse gesto, renegava sua obra literária... Ou talvez tenha sido simplesmente um acidente. Segundo o biógrafo Vasili Vasilievich Gippius, o escritor pode ter queimado por engano o manuscrito pelo qual queria ser lembrado. Ao perceber isso, tentou contornar o mal, mas só conseguiu salvar uma pequena parte, presumivelmente os capítulos que chegaram até nós. Seja como for, ele se trancou em seu quarto, de...

Ivan Klíma, resistir contra os totalitarismos com uma dose de esperança

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Ivan Klíma. Foto: David Konečný Ivan Klíma, nascido em Praga em 1931, descobriu que seus pais eram judeus depois da ocupação da Tchecoslováquia pelas tropas de Hitler. “Meus pais precisaram rejeitavar não apenas a religião, mas também sua identidade judaica. E já até o início da guerra, eu sequer tinha ouvido a palavra judeu, nem mesmo como um insulto.” Com a eclosão da guerra, ele foi forçado a usar a Estrela de Davi no peito com a palavra judeu escrita. O pequeno Ivan se trancou em casa e começou a ler sem parar.  Enquanto isso, uma proibição após a outra surgia. Primeiro, não era permitido sair da cidade, depois não era mais permitido ir ao teatro, ao cinema, à escola, ao parque... nem mesmo andar no primeiro vagão do trem.   E veio o campo de concentração. Ao ingressar em Terezín — a 80km de Praga —, ele se tornou um verdadeiro prisioneiro. Perdeu seu nome e passou a ser identificado com o código L54. Seu interesse pela literatura se solidificou ali. “A primeira coisa que ...

Boletim Letras 360º #659

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DO EDITOR Saibam que na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você pode obter um bom desconto e ainda ajuda a manter o Letras . A sua ajuda é essencial para que este projeto permaneça online . Javier Cercas. Foto: Pere Francesch LANÇAMENTOS Dois livros do escritor catalão Javier Cercas de distintas feições ganham edição quase simultânea no Brasil neste segundo semestre de 2025 .  1. O louco de Deus no fim do mundo é uma obra única em que Javier Cercas recebe do Vaticano o convite inédito para estar perto de seus membros e do próprio papa. Motivado por um questionamento ― se a mãe, católica fervorosa, reencontrará o pai na vida eterna ―, o autor transforma uma premissa incomum em uma narrativa magistral e íntima, entrelaçando suas obsessões pessoais com algumas das questões mais inquietantes da humanidade, como o papel da espiritualidade e da religião e a busca pela imortalidade. A narrativa é dividida em três momentos: antes do voo, quando Cercas ...

Best-sellers de outros tempos: Pavel Melnikov nos bosques

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Por Javier Pérez  Pavel Melnikov , Ivan Kramskoi. Pavel Ivanovich Melnikov — porque seu patronímico é necessário aqui para evitar confusão com o engenheiro e militar Pavel Petrovich Melnikov — é um daqueles autores que poderíamos dizer que escreveu em um lugar remoto sobre coisas remotas. Tanto que, apesar de seu enorme sucesso local, sua obra só começa a ser traduzida e publicada por algum editor excêntrico no início da década de 1960. E, no nosso tempo, no caso em que tenha sido traduzido, é preciso mergulhar no fundo dos sebos para encontrar seu livro mais conhecido: Nos bosques .¹ Nascido em 1818 em Nijni Novgorod em uma família nobre, mas de forma alguma rica, até mesmo a data exata de seu nascimento permanece controversa devido às muitas mudanças e adversidades vividas por seu pai, um militar de baixa patente. Recebeu sua educação inicial de sua mãe, que herdou uma importante coleção literária de autores clássicos, russos e franceses, o que lhe incutiu o interesse pelas ...