50 anos depois: Camus pode ter sido assassinado

No ano em que se fecha cinquenta anos da morte do escritor francês 
Albert Camus, especulações sobre o que teria desencadeado sua morte são reacendidas. O escritor que morreu em 1960, anos 
depois de receber o prêmio Nobel de Literatura, poderá ter sido 
assassinado pela KGB por criticar a União Soviética.
A teoria foi levantada pelo Corriere della Sera, que
 defende que por detrás do acidente que vitimou o escritor francês 
poderão ter estado espiões soviéticos. E a especulação não vem de mãos vazias. O jornal italiano toma por base comentários de Giovanni Catelli, acadêmico e poeta italiano, que chamou a atenção para o fato de estar 
ausente da tradução italiana do diário do celebrado poeta e tradutor 
checo Jan Zábrana, publicado com o título Celý Zivot, uma passagem 
específica.
No parágrafo em falta escreveu Zábrana: "Ouvi uma 
coisa muito estranha da boca de um homem que sabia muitas coisas e tinha
 fontes muito bem informadas. De acordo com ele, o acidente que custou a
 vida a Albert Camus, em 1960, foi planejado por espiões soviéticos. Eles
 danificaram um dos pneus do carro usando uma sofisticada ferramenta que
 o cortou ou furou quando atingiu velocidade". Continua. "A ordem foi dada 
pessoalmente por [Dmitri Trofimovic] Shepilov [o ministro dos Negócios 
Estrangeiros soviético] em reação ao artigo publicado na [revista 
francesa] Franc-Tireur, em março de 1957, no qual Camus atacava 
[Shepilov], nomeando-o explicitamente nos eventos na Hungria". 
No 
artigo em questão, Camus condenou aquilo a que chamou os "Massacres Shepilov", 
referindo-se à decisão de Moscou de enviar tropas para esmagar a 
revolta húngara de 1956. Um ano depois, Camus enfureceu ainda mais
 as autoridades soviéticas, quando apoiou publicamente o escritor russo 
Boris Pasternak, seu par agraciado com o Nobel e autor do romance Doutor Jivago, uma obra proibida por Stálin.
O Corriere della 
Sera conclui que houve razões suficientes para "Moscou ordenar o 
assassinato de Camus, no habitual estilo profissional dos seus agentes do
 KGB", o que, a comprovar-se, reabrirá feridas entre os milhões de 
admiradores da obra de Camus.
No funeral do autor de O estrangeiro, no cemitério de 
Lourmarin, perto de Vaucluse, na Côte d'Azur, um dos homens que carregou
 o caixão foi um conhecido anarquista e a equipe de futebol local também
 marcou presença, demonstrando tanto o seu estatuto de homem do povo, 
como de intelectual.
No ano passado, o presidente francês, 
Nicolas Sarkozy, tentou, sem êxito, que os restos mortais do escritor 
fossem trasladados para o Panteão, reservado para as grandes figuras da 
história da França.
No bolso de Camus foi encontrado um bilhete de
 regresso da sua terra, na Provence, a Paris. O escritor de 46 anos pretendia voltar de ônibus à capital depois do Natal, com a mulher, 
Francine, e os gêmeos Catherine e Jean, seus filhos. Em vez disso, o
 seu editor e amigo Michel Gallimard ofereceu-lhe carona. Camus 
teve morte instantânea quando o potente automóvel de Gallimard, um Facel
 Vega, saiu da pista numa estrada em que havia bastante gelo e bateu numa árvore. 
Gallimard morreu uns dias depois.
Além do bilhete de ônibus, a 
polícia encontrou no que restou do automóvel 144 páginas manuscritas de 
um volume intitulado O Primeiro Homem, um romance inacabado baseado na
 infância de Camus na Argélia e que ele previra que seria a sua melhor 
obra.
* Texto com notas e informações do diário português Jornal de Notícias publicadas no último dia 7 de agosto.
 
 
 
 
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