Boletim Letras 360º #643

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Jean Genet. Foto: Roger Parry


 
LANÇAMENTOS
 
A nova tradução da obra de estreia do escritor francês, precursor da agora designada literatura queer e da autoficção.

Escrito numa das muitas passagens do autor pelas prisões francesas e publicado pela primeira vez em 1943, Nossa Senhora das Flores nasceu das memórias pessoais e obsessões íntimas de Jean Genet. Fruto de uma necessidade incontrolável de evasão e subversão eróticas, a narrativa de Divina adquire, na prosa inigualável de Genet, uma força visionária tão potente que leva os personagens a ultrapassarem os limites da trama e visitarem, como aparições angelicais cheias de malícia, o narrador encarcerado, confundindo aquilo que é real e o que não é. Desconcertante e escandaloso desde o título — que parece aludir a um santuário, mas é o apelido de um rematado cafajeste loiro de olhos azuis —, Nossa Senhora das Flores não se contenta em reproduzir um mundo: tem a ambição de criá-lo. O narrador alterna elementos autobiográficos com impulsos líricos, reflexões sobre a vocação artística com explosões avassaladores de vitalidade erótica — além de momentos exemplares em que se revela o absurdo da existência. Tudo isso torna o romance de Genet um livro cada vez mais contemporâneo, dialogando com a produção de autores de hoje como Édouard Louis, Paul B. Preciado e Annie Ernaux. Tradução de Julio Castañon Guimarães; publicado pela editora Todavia. Você pode comprar o livro aqui.
 
Contos e novelas de um dos mais penetrantes ficcionistas da literatura universal ganham nova tradução brasileira direta do russo.
 
Vida emocional, sociedade e família são radiografados com intensidade, ironia e profundidade. Poucos ficcionistas mergulharam de forma tão profunda no âmago da experiência humana como o russo Anton Tchékhov. Os mujiques: penúltimos contos abrange uma produção frenética aparecida entre 1895 e 1897 ― menos de uma década antes da morte do autor em decorrência da tuberculose, em 1904. Esta edição, com tradução de Rubens Figueiredo, apresenta seus penúltimos contos e novelas, vindo a oferecer (assim como o volume Últimos contos, publicado anteriormente também pela Todavia) um vasto panorama da fase final ― e fecunda ― de Tchékhov. Você pode comprar o livro aqui.
 
Uma seleta de crônicas de um dos principais autores brasileiros do século XX.
 
Extraídas dos livros Cisne de feltro, Alhos & bugalhos, Artigo indefinido e O gol é necessário, as crônicas reunidas nesta edição mesclam ensaio pessoal, memórias da infância em Minas, relatos sobre o cotidiano no Rio de Janeiro e reflexões sobre a vida e o ofício da escrita. Ao lado de nomes como Rubem Braga, Fernando Sabino, Sérgio Porto, Otto Lara Resende, Carlos Drummond de Andrade e Clarice Lispector, Paulo Mendes Campos revolucionou a literatura brasileira com sua prosa contaminada por poesia e foi uma das vozes responsáveis por fundar a era de ouro da crônica. Para o jornalista Flávio Pinheiro, que assina a seleção e a introdução deste volume, “Paulo Mendes Campos foi personagem de si mesmo, mas sempre se entregou à linguagem e às palavras, suas ferramentas para desvendar o mundo.” Minhas janelas sai pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
 
Nova edição e tradução assinala o centenário de publicação de um dos livros centrais na obra romanesca de Virginia Woolf.
 
Em maio de 1925, Virginia Woolf publicava uma de suas obras mais célebres: Mrs. Dalloway. O romance acompanha Clarissa Dalloway, eternamente lembrada por leitoras e leitores como aquela que compraria suas próprias flores e anfitriã de uma grande festa. Embora Woolf costumasse se desapegar rapidamente de seus textos após finalizá-los, Mrs. Dalloway permaneceu em sua mente por mais tempo do que o habitual. Não por acaso, durante o processo de criação do romance, ela escreveu outros sete contos que se desdobram a partir da atmosfera da festa de Clarissa. Esse gesto revela uma espécie de fascínio — talvez uma obsessão — pela “teatralidade da festa”, como aponta Ana Carolina Mesquita, tradutora da Coleção Virginia Woolf, na apresentação de “Mrs. Dalloway em Bond Street”, um dos textos que retomam a essência do romance. Com diversos temas e questões pertinentes ao momento de pós-guerra em que a escritora se inseria, a obra se tornou uma grande referência para aqueles que são apaixonados pela literatura woolfiana. É por isso que a Nós publica essa nova tradução: Virginia Woolf nos lembra de olhar para borboletas, ainda que aviões de guerra sobrevoem nossas casas. Não como um escapismo, nem para ignorar ameaças bastante concretas. Mas porque a vida não é nem só aviões, nem só borboletas: a vida é intercessão incessante, um movimento contínuo que segue resistindo e cedendo, contra todas as nossas previsões. Você pode comprar o livro aqui.
 
A chegada de Abdourahman A. Waberi aos leitores brasileiros.
 
Publicado originalmente em francês em 1994, O país sem sombra, de Abdourahman A. Waberi, reúne dezessete contos que exploram a história e a vida no Djibuti, pequeno país localizado no Chifre da África, tanto no período pré-colonial e colonial francês quanto no pós-independência. Com ironia e humor, os contos retratam os mais diversos personagens — de loucos e poetas a colonos franceses e refugiados — e abordam temas como identidade nacional, luta pela sobrevivência e a relação entre história, cultura e política, evocando a tradição literária local e compondo uma imagem complexa e multifacetada do Djibuti. Publicação da editora Tabla; tradução de Fátima Murad. Você pode comprar o livro aqui.
 
Um livro sobre origem, território e pertencimento narrado com delicadeza brutal.

“A umidade entra pelos meus pulmões, afunda meu tórax como se uma aranha tecesse seu lar no meu peito. Sou sua okupação, estou tomada.” Após testemunhar o centro da cidade Capital ser engolido pela especulação imobiliária, Mari se muda com Pascale para Chilco, uma ilha mapuche com pouco mais de mil habitantes. A relação do casal, atravessada por percepções sobre ancestralidade, ganha novos contornos com o deslocamento e traz à superfície os efeitos devastadores do colonialismo na memória, na linguagem e nos afetos. Como uma espécie de dossiê — que reúne de dados históricos da ilha à “genealogia manca” de Mari —, Chilco dá forma ao despertar político da personagem em uma história profundamente latino-americana. Publicação da DBA. Tradução de Elisa Menezes. Você pode comprar o livro aqui.
 
Os limites de um casamento administrado pelo imperativo do mando machista ou uma descoberta de si.
 
Patrícia, a irmã aventureira que vai morar na Europa decidida a desbravar o mundo, um dia volta para casa, no México, transformada em Aisha, uma mulher casada, convertida ao islamismo, temente ao marido rígido e disposta a apagar completamente o seu passado. Este é o ponto de partida deste livro de Aisha, que é também o livro de Patrícia, ou ainda o livro de Sylvia ― que, dedicada a entender a mudança da irmã, acaba mergulhada em si mesma. Uma investigação profundamente pessoal sobre a ausência, a transformação da memória e a perplexidade diante de lacunas que parecem incompletáveis. Com tradução de Julia Dantas, O livro de Aisha sai pela editora Dublinense. Você pode comprar o livro aqui.
 
Lina Meruane regressa à infância.
 
Sinais de nós, de Lina Meruane, reúne as memórias da infância de uma menina que estuda em um colégio de classe alta na capital do Chile. Esse é o ponto a partir do qual, anos mais tarde, a narradora elabora e enfrenta seu passado, vinculado ao golpe militar de Augusto Pinochet, junto ao medo e o silêncio fantasmagóricos que persistem no presente. O título sugere os sinais que as meninas não foram capazes de perceber: a ausência de colegas que deixavam de ir às aulas, o desaparecimento de pais ou a presença de agentes da Central Nacional de Informaciones na escola fazendo a segurança do neto de Pinochet. Mas também alude à maneira como o medo e o silêncio se implantaram inconscientemente na identidade coletiva, dando origem a sequelas que perdurarão para sempre. “O não saber nada, o não querer saber, cobria o país como um escudo e como o privilégio de ter sabido, mas preferido não saber.” Publicação da Relicário Edições; tradução de Elisa Menezes. Você pode comprar o livro aqui.
 
REEDIÇÕES
 
Nova edição do picaresco O falso mentiroso, de Silviano Santiago.
 
Samuel é rápido no gatilho, obsessivo e demoníaco. Na casa dos sessenta anos, é artista plástico e mora no Rio de Janeiro com a esposa surda-muda, Esmeralda, com quem tem dois filhos. O romance, somos informados, narra a história da vida intrincada desse homem. Mas será que a vida que nos é narrada pertence realmente a ele? Certos “fatos” das memórias de Samuel nos incentivam a identificar o narrador com o autor, Silviano Santiago. Ele nos intriga. Para piorar as coisas, o personagem se declara mentiroso: se a afirmação for verdadeira, então ele está mentindo, e o que ele declara é falso; se, no entanto, a afirmação for falsa, ele não é um mentiroso e, sim, um “falso mentiroso”. Mente ao dizer que mente, embora de vez em quando diga a verdade... Em que Samuel — ou esse Silviano inspirado nos heterônimos de Fernando Pessoa — quer que acreditemos? O falso mentiroso é um livro picaresco e divertido que brinca com a própria identidade da obra autobiográfica, ampliando com engenhosidade as controvérsias críticas relativas à divisão entre fato e ficção, e às ideias de subjetividade, autoria e representação. No percurso de sua autoanálise, o narrador astucioso de Silviano nos oferece uma versão sardônica do drama edipiano: sua ascendência incerta é o ponto de partida para a proliferação transbordante de vários eus (i)legítimos, cada um com seus próprios amores, verdades e ficções. Esse ser compósito é inevitavelmente oprimido por múltiplos pais, que de tal maneira pesam sobre ele, que acaba precisando ir ao médico para fazer tração. A narrativa de Samuel reflete sobre uma vida profissional forjada no questionamento de genealogias constrangedoras e na prática afirmativa da adoção — simulada — das muitas histórias contraditórias, peculiaridades e paixões que compõem e rasgam a chamada “identidade”. A voz narrativa fala com autoridade da filosofia da cópia e da apropriação, e da arte de ser similar e do que paira num entre-lugar. Poderia haver melhor coroação de uma carreira profissional do que a maravilhosa ironia de uma narrativa profundamente preocupada com a impossibilidade da autonomia artística e com as relações biológicas e reprodutivas? E que, ao mesmo tempo, se apresenta como uma surpreendente e singular celebração da camisa de vênus? Você pode comprar o livro aqui.
 
RAPIDINHAS

De-estar, entrestrelas. É o título do novo livro do poeta paraense Age de Carvalho. A publicação é pelo selo editorial Cobalto.

Cristhiano Aguiar pela crítica. Os textos escritos ao longo de uma década para jornais e publicações acadêmicas foram reunidos em Tanto oceano, tanta solidão, editado pela Aboio.

DICAS DE LEITURA
 
1. Nossa vingança é o amor: antologia poética (1971-2024), de Cristina Peri Rossi (Trad. Ayelén Medail e Cide Piquet, Editora 34, 400p.) É a primeira coleção com uma boa amostra de uma das principais vertentes da obra da escritora reconhecida com o Prêmio Cervantes em 2021 e um dos nomes principais da literatura de língua espanhola no século XX. Você pode comprar o livro aqui
 
2. A morte de Ahasverus, de Pär Lagerkvist (Trad. Felipe Sabino de Araújo Neto, Editora Sator, 84p.) Uma novela com cores de parábola. O judeu errante reaviva o caminho dos amantes Tobias e Diana abrindo novas direções acerca do destino como a força indelével da nossa errância terrena. Você pode comprar o livro aqui
 
3. Todos os cachorros são azuis, de Rodrigo de Souza Leão (Demônio Negro, 140p.) Um espião de si mesmo acredita nos registros que levantados/ inventados e os transforma em narrativas. Das alucinações às intervenções de um mundo incapaz de encontrar o convívio com aqueles que a possuem. Você pode comprar o livro aqui
 
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS

O Instituto Moreira Salles (IMS), detentor do espólio de Dalton Trevisan, preparou um curta dirigido por Matheus Balbino para marcar o centenário do escritor. Narrado pela agente literária e amiga Fabiana Faversani, o filme percorre materiais do arquivo de Trevisan, doados para o IMS em 2024. Disponível aqui.

Na juventude, Dalton Trevisan também se experimentou no ofício da poesia. Escreveu vários poemas que foram publicados em jornais e revistas de dentro e fora da sua cidade natal, Curitiba. Nesta publicação do blog da revista 7faces saída depois da morte do escritor em dezembro de 2024, você pode ler quatro dos poemas do Vampiro.
 
BAÚ DE LETRAS
 
Das efemérides. Celebramos neste 14 de junho o centenário de Dalton Trevisan; o escritor curitibano aparece algumas vezes no arquivo do Letras. Dentre as publicações recordamos este breve perfil e a resenha de Marcelo Jungle dedicada a um dos últimos trabalhos realizados pelo Vampiro de Curitiba, a antologia com seus contos mais queridos.
 
DUAS PALAVRINHAS
 
Muitas vezes, esse conhecimento sobre a vida particular do autor relega a própria obra a um segundo plano. Eu não sou assunto, o autor nunca é assunto. Notícia é a sua própria obra. Ela pode ser discutida, interpretada, contestada.
 
— Dalton Trevisan, entrevista para o Estadão.

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