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Mostrando postagens de junho, 2022

No mar, de Toine Heijmans

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Por Pedro Fernandes Toine Heijmans. Foto: Merlijn Doomernik   Uma vez no mar, o tempo se divide em duas diferentes esperas cujas margens sempre se encontram no final: o de quem está a bordo e o de quem fica em terra firme. Apesar de dedicar quase toda extensão da narrativa ao último curso da viagem de Donald, os dias que se passam entre Thyborøn e Harlingen, o pequeno romance de Toine Heijmans se estabelece como margem, porto de passagem entre esses dois tempos: no desfecho do relato, convivemos com os instantes dos que aguardam os que estiveram em navegação.   Em terra firme, a espera pode sempre ser preenchida ou atalhada por nossos interesses, encurtada pela pressa, o mar, por sua vez, cobra do navegante o criterioso zelo com todos os limites do tempo da espera e quaisquer alternativas fora de suas leis podem se tornar na garantia que faltava para a morte. A companheira de Donald não deposita a confiança que ele imagina possuir com um meio informe e traiçoeiro, sobretudo com alguém

Saúde tem cura, de Silvio Tendler

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Por Solange Peirão     Os primeiros sintomas   Os processos históricos de desenvolvimento, sejam pessoais ou institucionais, são interessantes. Para o bem ou para o mal. Em relação ao Sistema Único de Saúde (SUS), para o bem. E lava a alma dos brasileiros que têm, é inegável, tantos motivos para se entristecerem, especialmente nos dias que correm.   O documentário Saúde tem cura , do cineasta Silvio Tendler, disponibilizado via YouTube , nos mostra os caminhos que o atendimento público à saúde percorreu, do século XIX aos dias atuais. E nesse contexto, se coloca a implantação do SUS, um projeto memorável que tanto nos envaidece.   E como a perspectiva é de resgate histórico, o documentário, já de início, registra a precariedade das condições sanitárias no Brasil do século XIX. Homens livres pobres e escravos, sem atendimento, são os que mais sofrem; estão à mercê das grandes epidemias que ocorrerão até as primeiras décadas do século XX. Interessante ressaltar o papel das Santas Casas d

“O mágico”, de Colm Tóibín recaptura intimamente um gigante literário

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Por Dwight Garner Thomas Mann. Foto: George Platt.   Thomas Mann começou seu longo e definitivo exílio da Alemanha em 1933, depois que Hitler chegou ao poder. Em seguida, o autor de A morte em Veneza e A montanha mágica fugiu para a Suíça com sua companheira, Katia, que era judia. Quando a Segunda Guerra Mundial estourou seis anos depois, os Mann fugiram para os Estados Unidos, primeiro para Princeton e depois para Los Angeles.   A família Mann — o casal tinha seis filhos — conseguiu resgatar alguns de seus pertences (móveis, pinturas, livros) da casa que haviam abandonado em Munique. Entre os itens deixados em sua fuga estavam os diários do escritor, guardados em um cofre em seu escritório. O ganhador do Nobel estava apavorado que os nazistas os encontrassem.   Goebbels não os encontrou. Mas há uma anedota curiosa sobre os escritos: quando finalmente foram publicados nas décadas de 1970 e 1980, mais de vinte anos após a morte de seu autor, fizeram sua vida e obra serem reavaliadas.

Pearl S. Buck

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    Pearl S. Buck (1882-1973) se tornou a quarta mulher a receber o Prêmio Nobel de Literatura, em 1938; três anos antes foi galardoada com o Pulitzer com o romance A boa terra e isso veio quase junto com a adaptação da obra para cinema. Três acontecimentos que a converteram numa das romancistas mais lidas no mundo num curto espaço de tempo. A rápida subida, entretanto, não a manteve no patamar alcançado; nos dias que correm está entre as famosas escritoras que praticamente caíram no esquecimento ou esperam outra vez sua retirada do limbo.   O romance que deu projeção a Pearl S. Buck é um retrato épico sobre a vida rural na China, sendo este uma das primeiras incursões da literatura ocidental a olhar e narrar Oriente sem todo seu exotismo que até então era dominante, isto é, falamos sobre uma ficção que deixa transparecer muito claramente o ponto de vista exterior, o de uma mulher que praticamente assume certa postura dos mais avançados modelos antropológicos, a de integrada pela vivê

Seis poemas de Konstantinos Kaváfis

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Por Pedro Belo Clara     Konstantinos Kaváfis. Foto: Cavafy Archive Onassis Foundation       A CIDADE (1910)¹   Disseste: “Vou pra outra terra, vou pra outro mar. Haverá por aí melhor cidade certamente. Será malogro, está escrito, tudo o que aqui tente e o meu coração — como morto — enterrado aqui jaz. Por quanto tempo há-de ficar minh’alma em podre paz? Pra todo o lado olhei, em todo o lado vi ruínas negras dessa vida que vivi, que tanto tempo aqui desperdicei a dissipar.”   Novo lugar não vais achar, nem achar novos mares. A cidade vai-te seguir. Ruas vais percorrer, serão as mesmas, e nos mesmos bairros hás-de viver, nas mesmas casas ficará de neve o teu cabelo. Hás-de ir ter sempre ao mesmo sítio, sem qualquer apelo. Para outro lugar não há navio ou caminho e estragares a vida tu neste caminho é pois igual a nesse largo mundo a dissipares.     ÍTACA (1911)   Quando abalares, de ida para Ítaca, Faz votos por que seja longa a viagem, Cheia de aventuras, cheia de experiências. E

Boletim Letras 360º #485

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DO EDITOR   1. Leitores e apoiadores do Letras, já sabem que disponibilizamos um exemplar da edição especial do Ensaio sobre a cegueira , de José Saramago (Companhia das Letras, 2022) para sorteio entre vocês?   2. Então. É possível ajudar ao Letras com valores a partir de R$10 através do PIX blogletras@yahoo.com.br . Mas essa é apenas uma das formas. Você pode saber mais sobre por aqui . 3. Cabe não esquecer que na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você ganha desconto e ajuda ao Letras sem pagar nada mais por isso .   4. Fiquem bem. E tenham um fim de semana de descanso. Lídia Jorge, Dulce Maria Cardoso e Matilde Campilho. Três gerações de escritoras portuguesas chegam em simultâneo aos leitores brasileiros.   LANÇAMENTOS O retorno de Lídia Jorge ao Brasil?   Um memorável é alguém que merece ser lembrado, ou guardado na memória, pelo que fez. Não é necessariamente um herói, já que a vida e os seres humanos são bem mais complexos do que podemo