Três maneiras de ler o Quixote
Por Daniel Gascón Dom Quixote visita uma gráfica em Barcelona. Desenho de Luis Paret y Alcázar. É possível que uma das condenações dos clássicos seja que nunca os deixamos descansar, até porque também não nos deixam descansar: um clássico é, como dizia Italo Calvino, um livro que nunca se termina de ler, e um livro que sempre nos diz coisas sobre o presente. A segunda parte de Dom Quixote , a que faz da obra o primeiro e inesgotável romance moderno, cumpre essa condição mais claramente do que outros livros. A lista poderia ser muito mais extensa; mencionarei apenas três exemplos. No capítulo LIII, após sua experiência como governador da Ilha Barataria, Sancho Pança conhece Ricote, um mouro natural de sua aldeia. Um édito de setembro de 1609 havia decretado a expulsão dos mouros, completando a sinistra tarefa que os Reis Católicos haviam iniciado ao expulsar os judeus em 1492. Ricote, disfarçado, vai com alguns peregrinos alemães e quer recuperar o dinheiro que...