O poeta que há em Ariano Suassuna

Ariano Suassuna. Foto de Assis Hoffmann

Para muitos, isso deve ser uma novidade. Conhecido mais pelo seu trabalho como dramaturgo pelo já consagrado sucesso O auto da compadecida e por sua produção romanesca com títulos como A pedra do reino, é necessário dizer que Ariano Suassuna é também poeta. Ainda anônimo, como reconhece o escritor num texto de 2000 para o jornal Folha de São Paulo; ao comentar acerca do diálogo entre ele e uma leitora, em que ela se apresenta como poeta anônima, Ariano desabafa: “Sou relativamente conhecido como romancista e mais como dramaturgo; como poeta sou ‘anônimo, casual, trágico, inconsequente’ e também ‘fruto e produto do casamento entre a urbanidade e a melancolia de pastos antigos’; pastos esses que, no meu caso, eram povoados de belas cabras agrestes, esquivas, quase selvagens e que pareciam pequenos antílopes, extraviados das savanas da África, das serras do Líbano ou das mesetas da Península Ibérica nos tabuleiros e carrascais dos sertão nordestino.”

Observações que a elas voltaremos mais adiante, é preciso que se reafirme: Ariano é poeta e não apenas com meia dúzia de poemas escritos como trabalho de experimentação estética, coisa comum a muitos romancistas, por exemplo. Não. Ariano tem pelo menos cinco livros do gênero: O pasto incendiado, reunindo sua produção poética entre 1945 e 1970, livro que até onde pesquisamos está inédito; Ode, editado numa curta tiragem em 1955 pelo Gráfico Amador; Sonetos com mote alheio, numa edição manuscrita e iluminogravada pelo autor em 1980; Sonetos de Albano Cervonegro, edição no mesmo formato da anterior, de 1985 e Poemas, uma antologia com uma seleção feita por Carlos Newton Júnior, com notas e os mais significativos poemas sua produção, editada em 1999.

Uma visão dessa bibliografia leva em consideração que também a poesia cumpre o papel de consumação da arquitetura de sua obra e como terá acentuado parte da crítica, nela convergem os principais elementos temáticos e simbólicos que dão forma ao conjunto da obra. Basta que se diga sobre a forte penetração textual que tem o gênero em trabalhos para o teatro e para o romance. Em A pedra do reino, por exemplo, a prosa é integralmente alinhavada com os versos do cordel que se constitui simultaneamente chave e enigma para o desenvolvimento de determinadas ações na trama.

Pensar na poesia de Ariano Suassuna, sobretudo tendo em vista a importância da mesma na consumação arquitetônica de toda a sua obra, é imaginá-la como ponto fulcral e convergente no qual os símbolos arquetípicos do autor espraiam-se encetando as linhas mestras de todo seu projeto estético, seja no teatro, seja no romance.

Agora, a fim de concluir essas observações que chamam atenção para esta face menos conhecida da obra do escritor brasileiro, é necessário lembrar sobre a própria essência da poesia. É características da matéria poética o fechamento em si – as pequenas aberturas que dela se visualiza são breves, embora devam se presenciá-las sempre, afinal, qualquer texto é uma totalidade da qual não se exclui a matéria que lhe circunda; o anonimato. A poesia distancia de qualquer nível de popularidade; a casualidade também é um bom termômetro a se medir a boa poesia. É comum entre os grandes poetas uma única obra pela qual são lembrados. Isso, só reforça que, embora seja possível que Ariano Suassuna não seja reconhecido de imediato como poeta, suas incursões por esse universo somente reforçam que talvez antes do dramaturgo e do romancista seja a poesia o que manifeste com grande autenticidade e resida nele, portanto, em definitivo o espírito do poeta. 

A seguir preparamos um catálogo com 16 poemas de Ariano Suassuna.



* Atualizado em 17 de junho de 2013.

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