11 Livros que são quase pornografia

Ilustração: T. Hanuka


O sexo sempre esteve presente na literatura, embora nem sempre de maneira explícita. Há escritores que mergulharam em sua própria sexualidade como se a arte pudesse ser campo para um exercício psicanalítico e findaram por revelar a partir dessa intimidade o lado mais escuro sobre. Esta lista apresenta um conjunto de livros nos quais os escritores se desnudam, livros que dispensam o pudor para narrar cenas de elevado tom.

Christine Angot, até o presente uma romancista francesa quase desconhecida no Brasil embora tenha sido autora de um livro chamado Pourquoi le Brésil?, tem sido lida como uma das principais figuras que se filiam à tradição da qual faz parte nomes como o de Anaïs Nin. Em 1999, ela publica L’Inceste, a obra pela qual sempre tem sido lembrada, por se tratar de uma narrativa que recupera a relação incestuosa entre um pai e uma filha. Les Petits, outra obra sua, já inicia com uma felação sob o chuveiro que termina numa penetração anal antes do leitor chegar à página quarenta. Por esses exemplos e pela relação que estabelece com Nin, a crítica tem sempre visto o trabalho literário da escritora como um exercício autoficcional. Ela, entretanto, se distancia da simplificação. Sobre o L’Inceste, por exemplo, descreve como uma metaficção sobre a proibição fundamental do incesto pela sociedade, o que leva a compreender sua literatura como um ato performativo.

Anaïs Nin deu conta da perturbadora história que viveu com seu pai nos diários; narra situações por longas páginas e não poupa nos detalhes sobre os encontros. Depois da escrita dessas histórias, um trabalho quase de purgação psíquica, ela não viu pudor em escrever outras narrativas, por encomenda de um excêntrico milionário, nas quais vomitava páginas de alta voltagem sexual e que mais tarde foram recolhidas e organizadas em Delta de Vênus.

A literatura mais comercial também tem seus registros. Sempre afeita a histórias com reviravoltas e tons de torpor e calor sexual, envolvendo paixões impossíveis e a realização de fantasias das mais escusas, as obras nesse universo estão quase sempre entre o romântico e muitas noites de amor. Talvez o fenômeno mais significativo nesse universo tenha sido a trilogia de E. L. James que descobriu, para muitos, práticas sexuais como o bondagem, dominação, sadismo e masoquismo. Fora do romance, o leitor não deixará de encontrar não apenas o significado de cada um desses exercícios eróticos, como listinhas de como fazê-los e até a revelação de que o calendário hospeda uma data internacional para celebração do BDSM, o 24 de julho. Apresentado como novidade a partir de E. L. James (mas claro, porque grande parte dos leitores é sempre pouco aventureira no universo do literário), muito antes já o Marquês de Sade havia se atrevido a ultrapassar todas as linhas da moralidade sexual em obras como A filosofia na alcova.

Há clássicos, como o de Sade que não podem faltar numa lista como esta. É o caso de O amante, de Marguerite Duras. Ou de Partículas elementares, de Michel Houellebecq. São romances transgressores, de alto erotismo. Enfim, na sequência os títulos. Não custa fazer o alerta de sempre nas listas apresentadas neste blog: a ordem não implica na qualidade da obra; não é uma lista que esgota interesses porque, óbvio, toda lista nunca conseguirá reunir a totalidade do universo que apresenta; e, os resumos oferecidos das obras são recolhidos daquilo que as editoras divulgam para nós.

- A filosofia na alcova, de Marquês de Sade.
Publicada clandestinamente em 1795 como “obra póstuma do autor de Justine” em dois volumes ilustrados, constitui no mais expressivo dos escritos de Sade. É uma antologia da libertinagem. Em forma de diálogos trata da educação sexual de uma jovem, apresentando, além do erotismo, posições ideológicas que discutem os ideais republicanos e as submissões de uma maneira despudorada. Situado num quarto, onde a jovem Eugénie aprende toda sorte de prazeres a partir das lições do experiente Dolmancé e da senhora Saint-Ange.  Do mesmo autor, ainda é possível citar, no mesmo âmbito de interesses, Justine ou os tormentos da virtude, Os infortúnios da virtude ou o famoso Os 120 dias de Sodoma.

- O amante, de Marguerite Duras.
Este é considerado o livro mais autobiográfico da escritora; escrito em 1984, chegou a receber o Prêmio Goncourt, o mais importante da literatura francesa. O romance narra um episódio da adolescência de Duras: sua iniciação sexual, aos quinze anos e meio, com um chinês rico de Saigon. Se as personagens e fatos são verídicos, a escrita os transfigura e transcende; não sabemos em que medida a história é verdadeira. Os encontros amorosos são, ao mesmo tempo, intensamente prazerosos e infinitamente tristes; a vida da família contrapõe amor e ódio, miséria material e riqueza afetiva. A presença da mãe, sua desgraça financeira e moral, do irmão mais velho, drogado, cruel e venal, e do irmão mais novo, frágil e oprimido, constituem uma existência predominantemente triste, e por vezes trágica, de onde Duras extrai um esplendor artístico. Em 1991, Jean-Jacques Annaud adaptou O amante para o cinema.

- O caderno rosa de Lori Lamby, de Hilda Hilst. 
Este livro, em grande parte escrito na forma de diário, apresenta uma menina de oito anos que vende seu corpo incentivada por seus pais proxenetas. A obra é, sim, obscena e põe em cheque a moralidade dos leitores, pois é quase impossível realizar uma leitura frígida dos relatos de Lori Lamby. Mas, apesar do impacto inicial causado pelo tema da pedofilia, o livro vai muito além. A própria literatura é alvo de obscenidades – gêneros intercalados, cartas, relatos, citações pervertidas de grandes autores como D. H. Lawrence, Henry Miller ou Georges Bataille e um Caderno negro dentro do Caderno rosa de Lori. Aquilo que, a princípio, aparece no texto como possíveis e singelos erros de escrita de uma criança recém-alfabetizada aponta para um estudo lexicológico, para uma etimologia das sensações fazendo soluçar a gramática. Para os que gostariam de ler mais sobre a obra pornográfica de Hilda Hilst, em 2014, publicou-se Pornô chic, uma edição ilustrada com textos de apoio de autores como Humberto Werneck, Alcir Pécora, João Adolfo Hansen, Jorge Coli, Eliane Robert de Moraes e entrevista a Caio Fernando Abreu, que reúne além de O caderno rosa, Contos de escárnio e Cartas de um sedutor.  livro ainda guarda um segredo sobre o verdadeiro narrador da história.

- A casa dos budas ditosos, de João Ubaldo Ribeiro.
Este livro faz parte de um desafio editorial que convidou vários escritores para escrever acerca dos pecados capitais. O resultado foi uma coleção intitulada Plenos Pecados que envolveu nomes como Luis Fernando Verissimo, José Roberto Torero, Zuenir Ventura, entre outros. Coube a João Ubaldo Ribeiro escrever sobre a luxúria. O escritor baiano, então, imaginou uma narrativa contada por CLB, uma mulher de 68 anos, nascida na Bahia e residente no Rio de Janeiro que jamais se furtou a viver – e com todo o prazer e sem respingos de culpa narra suas infinitas experiências e sobre as também infinitas possibilidades do sexo.

- Delta de Vênus, de Anaïs Nin. 
Prostitutas que satisfazem os mais estranhos desejos de seus clientes. Mulheres que se aventuram com desconhecidos para descobrir sua própria sexualidade. Triângulos amorosos e orgias. Modelos e artistas que se envolvem num misto de culto ao sexo e à beleza. Aristocratas excêntricos e homens que enlouquecem as mulheres. Estas são algumas dos personagens que habitam os contos eróticos deste livro de Anaïs Nin. Escritas no início da década de 40 sob a encomenda de um cliente misterioso, estas histórias se passam num mundo europeu-aristocrático decadente, no qual as crenças de alguns personagens são corrompidas por novas experiências sexuais e emocionais. Discípula das descobertas freudianas, Anaïs Nin aplicou nestes textos a delicadeza de estilo que lhe era característica e a pungência sexual que experimentou na sua própria vida.

- Partículas elementares, de Michel Houellebecq.
O romance apresenta como personagem principal Michel, um pesquisador em biologia, rigorosamente determinista, incapaz de amar, que administra o declínio da sua sexualidade, dedicando-se ao trabalho, às compras no supermercado do bairro e aos tranquilizantes. Um ano sabático dá às suas pesquisas um rumo que sacudirá a face da terra. Bruno, o irmão, por seu lado, obstina-se na busca desesperada do prazer sexual. Em duas obsessões completamente opostas, o que une os dois é o fato de terem sido abandonas pela mãe quando criança, o que manifesta neles uma carência jamais superada.

- O primeiro homem mau, de Miranda July.
Cheryl é uma mulher reclusa e vulnerável. Ela é obcecada por Phillip, um sujeito galanteador e membro do conselho da empresa em que trabalha – uma organização que treina mulheres para autodefesa. Cheryl acredita que eles já fizeram amor em vidas passadas, mas ainda precisam consumar o ato nesta encarnação. Quando seus chefes pedem a ela que hospede brevemente Clee, a filha do casal, uma garota egoísta e cruel de 21 anos, seu mundo vira de cabeça para baixo. Mas é ela que traz Cheryl para a realidade e se torna o amor de sua vida. Descrito como um romance lírico e engraçado. Mas, recheado de obsessões sexuais.

- A história de O, de Pauline Réage.
O é uma mulher livre e independente, que é levada por seu amante René a um castelo situado em Roissy, perto de Paris, onde ela se torna escrava de René e outros homens. Pela qualidade literária e pela considerável coragem com que trata o tema da submissão sexual feminina em um estilo cru e direto, o romance se tornou um dos ícones da literatura erótica do século XX e livro provocou fortes reações do público e da crítica. Em 1955, recebeu o prêmio de literatura erótica Les Deux-Magots. Pauline Réage é o pseudônimo de Anne Desclos. ivro  em 1955. amor maternal, este romance confirma Miranda July como uma voz espetacularmente original da cultura contemporânea. “Um retrato imensamente terno sobre a maternidade e o que significa cuidar de uma criança. July escreve sobre a descoberta do amor maternal com emoção genuína e poderosa.” - Michiko Kakutani, The New York Times

- História do olho, de Georges Bataille.
Este é o livro de estreia do escritor, mas logo se tornou sua obra mais célebre e um dos clássicos da literatura erótica do século XX. Chocante e sacrílega, esta novela é a expressão máxima da obsessão do autor pela proximidade entre sexo, violência e morte, e sua dimensão filosófica se depreende do exercício ilimitado que Bataille faz de tal relação. Publicado em 1928 sob o pseudônimo de Lord Auch, o livro acompanha as peripécias sexuais do jovem narrador e de sua amiga Simone. Embebido da atmosfera do surrealismo francês, do qual o próprio Bataille chegou a fazer parte, o relato suspende do horizonte das personagens o interdito do universo adulto e propicia aos jovens uma jornada de extravagâncias que envolvem sadismo, orgias, tortura e loucura, culminando em um ato de transgressão.

- A vênus das peles, de Leopold Von Sacher-Masoch.
Publicado originalmente em 1870, este livro narra pela primeira vez, com detalhe e clareza, a submissão sexual e existencial, ao mesmo tempo dolorosa e prazerosa, servil e libertária – pois se trata de servidão voluntária –, de um homem a uma mulher. O livro não é apenas a obra fundamental do masoquismo. Ele é também uma das obras fundamentais da cultura contemporânea, em que a liberdade e a realização individuais se alimentam reciprocamente. O masoquismo (termo depois consagrado por Freud), o sadismo e inúmeras outras práticas hoje conhecidas, reconhecidas e nomeadas, como o fetichismo e o travestismo. Centrado Em Severin, um jovem nobre, e Wand, uma jovem viúva, o romance apresenta a partir de uma discussão sobre a felicidade nas relações amorosas, os não-limites do desejo e do corpo.

- Trópico de câncer, de Henry Miller.
Toda obra do escritor estadunidense é uma celebração às liberdades do corpo e uma provocação aos limites do moralismo tacanho do seu país natal. Este é o seu primeiro livro que, tão logo publicado, em 1934, foi elogiado pela crítica e censurado em vários países de língua inglesa. Em Inglaterra e nos Estados Unidos, por exemplo, a obra só foi permitida a partir dos anos 1960. Narrado em primeira pessoa, o Trópico câncer tem sido lido como produto da vida do próprio escritor de quando viveu em Paris. Sem obedecer a uma linearidade, a trama acompanha pelos lugares mais ordinários da capital francesa, a vida insólita e as aventuras sexuais das figuras que por aí transitam.

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