Boletim Letras 360º #464

 
 
DO EDITOR
 
1. Caro leitor, as publicações diárias nesta página retornaram e com o início do nosso 15.º ano regressam também as edições completas deste Boletim.
 
2. Aproveito para recordar sobre o nosso próximo sorteio entre os apoiadores do Letras. Até o final do dia deste 29 de janeiro de 2022 é possível realizar sua inscrição. Saiba tudo sobre como participar por aqui.
 
3.Vamos que vamos! Obrigado pela companhia e pelo apoio ao trabalho do Letras!

Flannery O’Connor. Foto: Joe McTyre. Stuart A Rose Library, Emory University


 
LANÇAMENTOS
 
Saudado pela crítica como um romance revelador de uma ficcionista com todos os atributos para tornar-se tão forte quanto outros escritores do sul dos Estados Unidos, a exemplo de William Faulkner e Carson McCullres, o primeiro romance de Flannery O’Connor ganha nova tradução.
 
Primeiro romance da autora, Sangue sábio narra a história de Hazel Motes, um jovem de 22 anos que, após a guerra, volta para casa no profundo e religioso Sul dos Estados Unidos, onde trava uma desesperada batalha espiritual contra o fanatismo religioso da comunidade local e em particular contra o pregador cego Asa Hawkes. Convencido de seu ateísmo, funda a própria religião — a Igreja sem Cristo Crucificado “em que os cegos não veem e os aleijados não andam e o que está morto continua morto” — e se lança por uma ladeira tragicômica, entre oportunistas e falsos pregadores, para mostrar a própria integridade na busca do absoluto. Pelas estradas e pensões, pelos bares e trens de Sangue sábio, o leitor será guiado por um dos maiores nomes da literatura norte-americana do século XX, capaz de representar como poucos os erros e a imprevisibilidades da alma humana, os nossos instintos desajeitados — o nosso “sangue sábio”, que busca a salvação. A tradução de Juliana Amato é publicada pela editora Sétimo Selo.

Livro que continua o périplo autoficcional de Annie Ernaux ganha tradução no Brasil.
 
Em 1963, Annie Ernaux, então uma estudante de 23 anos, engravida do namorado que acabara de conhecer. Sem poder contar com o apoio dele ou da própria família numa época em que o aborto era ilegal na França, ela vive praticamente sozinha o acontecimento que tenta destrinchar neste livro quarenta anos depois, quando já é uma das principais escritoras de seu país. Com a ajuda de entradas de seu diário e de memórias há muito guardadas, Ernaux reconstrói seu périplo solitário para realizar um aborto clandestino. Ao refletir sobre a onipresença da lei e seu imperativo sobre o corpo feminino, Ernaux nos apresenta mais uma face da mescla indissociável do íntimo e do coletivo tão característica de todo o seu percurso literário. Quando por fim encontra uma “fazedora de anjos” disposta a realizar o serviço, a jovem acaba na ala de emergência de um hospital. Anos se passam sem que ela tenha coragem de revisitar o episódio. Em sua relação radical com a escrita, porém, Ernaux encontra o caminho para falar publicamente de seu aborto e fazer da literatura uma profissão de fé, que comove pela honestidade cortante: “o verdadeiro objetivo da minha vida talvez seja apenas este: que meu corpo, minhas sensações e meus pensamentos se tornem escrita, isto é, algo inteligível e geral, minha existência completamente dissolvida na cabeça e na vida dos outros”. O acontecimento é a sequência de Os anos e O lugar; o livro é publicado pela editora Fósforo com tradução de Isadora de Araújo Pontes.
 
Publicado postumamente em 1986, O jardim do Éden, do Nobel de Literatura Ernest Hemingway, traça a vida de um jovem escritor americano e sua glamorosa esposa que se apaixonam pela mesma mulher.
 
A concepção de O jardim do Éden começou em 1946, contemporaneamente a outros romances lançados em vida por Hemingway, como O velho e o mar e Paris é uma festa. Mas só chegou às livrarias 25 anos após sua morte. Considerado um divisor de águas na percepção de leitores e estudiosos do autor estadunidense, o romance é único entre as obras de Hemingway. Sua exploração de papéis e identidades de gênero, de práticas sexuais e sua expressão artística desafiaram as noções tradicionais que os leitores tinham de Hemingway. Apesar de não ser um romance autobiográfico, muitas semelhanças envolvem o autor e seu protagonista. David Bourne é um jovem escritor norte-americano em ascensão, ávido por escrever a próxima história. Recém-casado com a glamorosa Catherine, viajam em lua de mel para a Côte d'Azur na década de 1920. Até que um dia conhecem Marita e, a partir desse encontro, a vida dos três ganha um novo rumo. David e Catherine se sentem atraídos por Marita, e o perigoso jogo erótico do qual participam quando se apaixonam pela mesma mulher enfraquece aos poucos seu relacionamento. Em meio a esse triângulo amoroso, Hemingway nos dá excelentes pistas do que é ser escritor por meio das lutas intelectuais de David — quando tenta descrever em pequenas histórias sua viagem pela África com o pai, na infância, caçando elefantes, pondo em espera a narrativa principal que trata das suas viagens com Catherine. Ele também revela sua vulnerabilidade, escondida atrás de sua imagem pública, do alto preço que os artistas precisam pagar para seguir sua vocação. Escrito no período pós-guerra e ambientado entre drinques e tardes ao sol, trabalho literário e diversão, O jardim do Éden consiste em um notável exercício de liberação e contém a personagem feminina mais impressionante do autor. Esta edição conta com prefácio de Charles Scribner Jr., descrevendo como foi o processo de edição do manuscrito — em função da clareza e consistência de uma obra inacabada – e posfácio de Roberto Muggiati, autor da tradução, apresentando as familiaridades entre Hemingway e sua obra. O livro é publicado pela Bertrand Brasil.
 
Nova edição do primeiro texto de dramaturgia de Antonio Callado.
 
A cidade assassinada, primeiro texto de dramaturgia de Antonio Callado, nasceu como homenagem aos 400 anos de cidade de São Paulo e hoje é um clássico da literatura brasileira. Escrita e encenada na década de 1950, a peça transporta o público para o Brasil de 1500 em três atos, junto de personagens históricos e lendários, como João Ramalho e padre José de Anchieta. Com um texto riquíssimo, recheado de camadas históricas e de intertextualidades, Callado apresenta em A cidade assassinada, suas preocupações políticas — que aparecerão em obras posteriores, como no seu romance Quarup —, como a condição indígena, a colonização religiosa, a formação do povo brasileiro e a imposição de uma lógica de progresso, que vinha a todo vapor no Brasil de Juscelino Kubitschek. Na peça, a cidade de Santo André da Borda do Campo está ameaçada pelos desejos do governo-geral em transferir o pelourinho (símbolo da presença civilizatória) para a vila de São Paulo. Junto a isso, um conflito de interesses relação ao trato dos indígenas da região se desenha entre a violência física dos primeiros bandeirantes e a violência simbólica dos jesuítas. A guerra entre os homens se aproxima, mas não sem antes considerar a ação decisiva de Rosa Bernarda, mulher e mameluca — personagem feminina forte, como é marca no teatro de Callado. Ao mesclar memória histórica e ficção, textos clássicos como Auto de Anchieta, Iracema e Cantares de Salomão, o autor, imortal da Academia Brasileira de Letras, é capaz de fazer emergir a própria identidade brasileira. Na peça são apresentados conflitos políticos, que mesmo representados nos interesses entre colônia e metrópole são até hoje perceptíveis, e conflitos amorosos, incluindo a batalha ética entre amor e dever. São discutidas também a própria condição e missão da arte e a busca pela liberdade ― temas particulares e gerais, que são capazes de transpor A cidade assassinada para o rol das grandes obras de alcance universal. O livro é publicado pela José Olympio com prefácio de João Cezar de Castro Rocha e posfácio de Zé Celso Martinez Corrêa.
 
O segundo volume dos diários de Virginia Woolf.
 
No segundo volume de seus diários completos, que cobre o período de 1919 a 1924, Virginia Woolf e Leonard Woolf se consolidam como editores. Os dois passam a publicar consistentemente traduções do russo, como Tolstói. Virginia começa a aprender russo. Ela escreve e publica O quarto de Jacob e começa a se tornar conhecida em certos círculos como uma das maiores promessas literárias de seu tempo. A amizade de Virginia Woolf e Katherine Mansfield começa a sofrer um forte desgaste, Virginia não consegue disfarçar sua ambivalência entre o carinho e o despeito que sente pela amiga — afinal, Mansfield era incensada na imprensa. Virginia começa a escrever O leitor comum e Mrs. Dalloway. Finalmente, em suas palavras, encontra sua voz literária e o caminho a seguir em sua literatura. Lê Joyce e Proust. Tudo isso certamente a influenciará. Estreita os laços com T. S. Eliot, de quem publica pela Hogarth Press Terra desolada. O processo de impressão desse longo poema que foi um divisor de águas na poesia modernista influencia enormemente a escrita de Mrs. Dalloway. Do ponto de vista formal, o diário começa a se mostrar cada vez mais como um terreno de experimentações. Há mais diálogos transcritos, mais retratos feitos propositadamente das pessoas, mais experimentos com sinais gráficos nas narrativas que ela faz dos seus dias ou de seus pensamentos. E Virginia Woolf conhece e começa a se relacionar com aquela que seria um de seus grandes amores, a poeta e romancista Vita Sackville-West. A tradução de Ana Carolina Mesquita é publicada pela Editora Nós.

O título de março do clube Círculo de Poemas. 

Depois de Coração de boi (7letras, 2016), Ana Estaregui apresenta agora Dança para cavalos, seu terceiro livro de poemas. Dando continuidade à investigação e fusão com o mundo já presentes em seu trabalho anterior, a poeta intensifica aqui o gesto de flagrar os movimentos e a metamorfose das formas: o corpo, a casa, a gestação, os bichos, as plantas, as atividades domésticas. E convida leitora e leitor a observar as passagens e transformações de tudo o que está ao redor. Com uma linguagem simples e objetiva, os poemas de Dança para cavalos fazem com que a vida surja como se nomeada pela primeira vez. Seus versos abarcam desde os movimentos mínimos, como o tropismo das plantas, aos movimentos amplos, como a manada de bisões se deslocando. Nas palavras da poeta Alice Sant’Anna na orelha do livro: “Fruto de uma observação radical e de uma imaginação assombrosa, o livro estabelece aproximações insuspeitas entre a vida doméstica e a vida selvagem. Nesses poemas, a poeta se questiona sobre o que quer dizer ser, aparentar ser e aprender a ser: não há animal que finja ser o que não é.” Em 2018, Ana Estaregui recebeu, com o original do livro Dança para cavalos, o Prêmio Governo de Minas de Gerais de Literatura na categoria poesia.

Neste livro, Hermann Hesse apresenta sua concepção de religião em uma série de ensaios, poemas e cartas.
 
Através do cristianismo, do hinduísmo e do zen, Hermann Hesse, vencedor do Prêmio Nobel de Literatura, apresenta em A unidade por trás das contradições sua concepção de religião em uma série de ensaios, poemas e cartas. A austeridade da família de pastores protestantes levou Hermann Hesse a questionar, desde cedo, a religião. Dividido entre a expressão artística, a espiritualidade e a experiência burguesa, foi fortemente influenciado, ainda, pela psicanálise. A diversidade de ideias e conceitos o levou a uma viagem de autodescoberta através da literatura, que pode ser vista em livros como Sidarta e O lobo da estepe, mas que encontra sua maior expressão na seleção de textos de A unidade por trás das contradições: religiões e mitos. Nesse livro, Hesse reúne as observações sobre as formas humanas de devoção. Ele disseca o que há de comum em todas as crenças, aquilo que se encontra acima das diferenças nacionais ou culturais e que pode fazer parte da fé de qualquer indivíduo e de qualquer raça. São impressões e imagens das mais remotas religiões e mitos da humanidade, dos antigos egípcios, de chineses, de budistas, de cristãos, de muçulmanos ou das modernas formas de ideologias religiosas. O conceito de graça está fortemente presente. A partir da ideia do mundo como um todo, uma unidade divina à qual devemos estar conectados para alcançar a felicidade, nos deparamos com a possibilidade de, por trás de todo erro, apesar de toda falha, nos desconectarmos do ego. A vida só adquire significado quando se abandona uma busca ingênua pelo prazer egoístico e se atribui a ela uma servidão ― a uma religião, a uma filosofia ―, pois, como afirma Hermann Hesse, é nesta servidão que brota seu sentido. Ao encontrar esse sentido, encontra-se a unidade por trás de tudo que existe. Afinal, “a humanidade, embora ainda dividida em raças e culturas estranhas e hostis entre si, é uma só e possui possibilidades, ideais e objetivos comuns”. A tradução de Roberto Rodrigues é publicada pela editora Record.
 
A estreia de Mateus Baldi na literatura.
 
Formigas no paraíso apresenta contos fortes e provocativos que perscrutam a alma do cidadão contemporâneo dos grandes centros urbanos, mesmo tendo como cenário o desmistificado Rio de Janeiro. Como diz Noemi Jaffe na orelha do livro: “Pode-se ter a impressão de que eles, no conjunto, constituem uma galeria de tipos cariocas, marcados pela realidade urbana difícil e pela dinâmica absurda da economia e da sociedade brasileira, mas é mais do que isso. Cada um deles tem uma tal singularidade e profundidade em sua aparição, que, mais do que galeria, estamos diante de pessoas que, eventualmente, poderiam até se conhecer e se entender…” Além da temática e da abordagem o estilo cortante de Baldi salta aos olhos e nos arrebate em seu ritmo, velocidade narrativa, diálogos precisos e domínio da técnica da escrita. O livro é publicado pela editora Faria e Silva.
 
Revisitar o modernismo brasileiro pelo ponto de vista da ação e do pensamento de Mário de Andrade.
 
Pensamentear foi como Mário de Andrade descreveu a junção entre seu pensamento e ação de escritor que, lutando pela democratização da cultura, buscava reinventar o Brasil. André Botelho e Maurício Hoelz reveem esta práxis a partir do campo musical, o mais heurístico na trajetória desse homem de múltiplos talentos. Um entre lugar de fala-escuta — política de reconhecimento que liga o lugar de fala ao de escuta do outro — em que se forja uma ética dialógica e democrática do aberto e do inacabado. Sociologicamente reposicionado, o Modernismo passa a ser visto como movimento cultural: uma ação coletiva que disputa o controle cultural pela mudança da sociedade. Mário de Andrade, nosso contemporâneo. O modernismo como movimento cultural. Mário de Andrade, um aprendizado é publicado pela editora Vozes.
 
A estreia da escritora mexicana Socorro Venegas no Brasil.
 
O título deste livro está associado ao terceiro conto que o compõe. Nele, uma narradora-protagonista evoca o passado ao se deparar com um jovem engolidor de fogo. Em termos literários, é uma experiência deslumbrante observar a ressonância da chama manipulada pelo artista em vários episódios vividos pela personagem. Além desta, Socorro Venegas nos apresenta outras personagens, predominantemente mulheres, quase todas jovens, que repentinamente são confrontadas com o peso abrasador das recordações. Acompanhar os seus dramas implica em revisitar nossas próprias fragilidades, muitas das quais tentamos com esforço esquecer. É por isso que a leitura destes contos nos convida a experimentar a memória justamente onde ela nos arde. Com tradução de Nylcéa Pedra, A memória onde ardia é publicado pela editora Arte & Letra.
 
Um híbrido da crítica à tradução de um poema de José Cadalso y Vásquez de Andrade.
 
Modos de leitura trata-se de uma coletânea que acolhe textos do autor: ensaios, resenhas, entrevistas, posts e a tradução de uma obra literária espanhola do século XVIII: o poema dramático em prosa “Noches Lúgubres”, do escritor espanhol José Cadalso y Vásquez de Andrade (1741-1782), primeiramente publicado entre dezembro de 1789 e janeiro de 1790 no periódico Correo de Madrid, e que contou 49 edições até o fim do século XIX, mas que caiu numa relativa obscuridade no século XX, apesar de sua importância. O livro de Marcos Higa é publicado pela Ateliê Editorial.
 
REEDIÇÕES
 
Viagem reafirma o compromisso de Graciliano com a justiça social sem negociar sua liberdade literária. Um relato imprescindível de uma época de fortes paixões políticas e ideológicas.
 
A primeira metade do século XX ardeu e fomentou ideais e revoluções. Ao fim da Segunda Guerra, o mundo estava dividido sob a égide do capitalismo ou do socialismo e muito se falou acerca do papel social da arte e de seu compromisso com causas populares. Em 1945, Graciliano Ramos, já considerado um grande escritor, filiou-se ao Partido Comunista do Brasil, a convite de Luís Carlos Prestes, e viu-se diante do dilema da conciliação entre sua posição política e sua produção literária. Apesar de integrar o “Partidão”, Graciliano Ramos resistiu a pôr sua obra à disposição dos dirigismos em voga. Passou a sofrer ataques dos militantes mais aguerridos, que viam em sua integridade intelectual uma resistência isentiva. Em meio a desgastes em sua relação com o partido, os dirigentes convidaram-no para uma viagem para a Checoslováquia e a União Soviética, em 1952. Desejoso de conhecer o país que liderava um movimento global revolucionário, e de desvencilhar o próprio julgamento da condenação distorcida articulada pela imprensa ocidental, o escritor embarcou na viagem que inspirou este livro. O talento narrativo de Graciliano Ramos e sua recusa a transformar a literatura em veículo de propaganda fazem de Viagem um relato autêntico e prazeroso da experiência em terras soviéticas nos primeiros anos de Guerra Fria. Ao fim desta edição, encontram-se as anotações que deram origem ao livro ― o último escrito por Ramos e publicado somente um ano depois de sua morte, ocorrida em 1953. Nesta edição são apresentadas aos leitores e leitoras fotografias raras do velho Graça entre seus companheiros, registradas em terras soviéticas. Tanto as imagens quanto a capa, com ilustração assinada por Cândido Portinari, reproduzem elementos da primeira edição do livro. imprescindível a todas as pessoas que, diante de um mundo polarizado, enxergam a importância de ver por entre os vícios midiáticos e românticos em torno do comunismo.
 
Com o mesmo projeto revival adotado em Viagem, de Graciliano Ramos, a José Olympio, marca seu aniversário de 90 anos com a reedição da prestigiada Coleção Rubáiyát, que reúne alguns dos mais importantes poemas da história. Os três primeiros são as traduções realizadas por Lúcio Cardoso, autor do indispensável Crônica da casa assassinada.
 
1. O vento da noite, de Emily Brontë (1818-1848), reúne uma seleção, feita pelo tradutor e escritor Lúcio Cardoso, de 33 poemas da escritora e poeta inglesa, alguns deles publicados sob o pseudônimo Ellis Bell. A coletânea apresenta o lado mais romântico e sombrio da poética brontiana. A edição traz o projeto gráfico da primeira, incluindo as ilustrações.
 
2. O segundo título editado no mesmo formato é A ronda das estações. Escrito no século V, neste livro Kâlidâsa aproxima natureza e prazeres sensuais, revelando como o amor apaixonado se reacende e se transforma com a chegada de cada nova estação. O lirismo e a paixão perpassam todo o texto. O poema erótico provavelmente foi escrito na juventude do autor, que é conhecido como um dos maiores escritores sânscritos de todos os tempos.
 
3. E O livro de Job. Este é considerado por muitos teólogos o primeiro escrito bíblico. O poema narra o episódio em que Jeová, após ser desafiado por Satã sobre a fidelidade de seu maior devoto, permite que o anjo maldito fustigue Job. Mesmo experimentando os piores e mais intensos sofrimentos, Job persevera e é incapaz de maldizer Deus, sendo recompensado por isso. A tradução de Lúcio Cardoso recupera o projeto gráfico original de 1943 que trazia as ilustrações concebidas por Alix de Fautereaux.
 
Livro com contos de Thomas Wolfe ganha reedição.
 
Wolfe é um autor invulgar, sob muitos aspectos. Escreveu toda sua obra em doze anos, como prevendo a morte prematura aos 38, e não produziu pouco. Editou dois romances, um livro de contos, outro de ensaio, deixando, no entanto, vários inéditos que vieram à luz postumamente: mais dois romances, nova coletânea de histórias curtas. Professor, boêmio, viajante voltado para a Europa (bolsista da Guggenheim), pôde no entanto frenético trabalhar. A obra que nos legou também reflete as condições em que foi realizada. A par das suas grandes linhas, as ilusões da infância e juventude perdidas no mundo adulto e adverso, o instintivo exuberante em contraste com a repressão puritana, o jogo de luz e sombra, um pessoal, outro exterior, temos a denunciar-se fora destas largas dimensões um artesão meio tosco, sujeito a quedas bruscas, desordenadas em rompantes de lirismo, exaltação e retórica. Apesar do que, assim complexo ou contraditório, se alçou ao plano mais elevado de sua época. Talvez pelo sentido épico, na sua indisfarçável redução. Tão idealista ou sensorial quanto elementar e violenta. Com tradução e posfácio de Marilene Felinto, o volume de contos O trem e a cidade volta aos leitores pela editora Iluminuras.
 
DICAS DE LEITURA
 
Regressamos para compor o 15.º ano do blog Letras in.verso e re.verso e com isso o restante das seções deste Boletim, como dissemos. Aqui recomendamos leituras que passaram pelo nosso gosto, outras que têm chamado nossa atenção e de outros leitores e servem para que você possa encontrar suas próprias listas e interesses. As recomendações desta vez retomam o dia 27 de janeiro, quando o mundo recorda a memória das vítimas do holocausto. A biblioteca em torno do tema é incontornável. Os três títulos aqui indicados é, assim, uma só pequena amostra. Na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a manter o Letras.
 
1. É isto um homem?, de Primo Levi. Prisioneiro de Auschwitz-Birkenau, o químico italiano escreveu vasta obra que testemunha os horrores do campo de concentração, sendo essa uma das principais. O livro conta desde sua prisão, incluindo todos os horrores de desfazimento da sua identidade e, mesmo atravessando a morte, a dor, a fome, a sede, a rotina terrível de trabalho forçado e interminável, suas estratégias pela criatividade, astúcia e pela organização, de se manter vivo. É um livro comovente; um registro dos mais pungentes sobre a força humana e sua capacidade de resistência mesmo quando tudo é posto em prova.
 
2.  Kadish por uma criança não nascida, de Imre Kertész. Neste livro do autor húngaro, o primeiro do seu país a receber o prêmio Nobel de Literatura, também ele um sobrevivente do holocausto depois de passar pelos campos de Auschwitz e Buchenwald, o que lemos é sobre a vida do sobrevivente, como se diz, a dificuldade de sobreviver o sobrevivente. Articulado como um longo monólogo, o escritor B. explica sua negação em reproduzir a vida pós-holocausto.
 
3. Maus, de Art Spiegelman. A HQ censurada na rede escolar do sul dos Estados Unidos é um relato comovente sobre Auschwitz e ao mesmo tempo um acerto de contas do artista com pai. A primeira e até agora única obra no gênero a receber o Prêmio Pulitzer, a HQ conta a história de Vladek Spiegelman, um judeu polonês que sobreviveu ao campo de concentração. Narrada pelo ponto de vista do próprio filho, Art reduz o mundo terrível do nazismo a um universo animalesco; seu relato é cru, perturbador e dispensa sentimentalismos.
 
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
 
1. No final do dia 28 de janeiro, lembrávamos em nosso Twitter sobre o aniversário de Vergílio Ferreira. Autor de obras indispensáveis para a literatura de língua portuguesa do século XX, como Aparição, voltamos a recomendar este documentário dirigido por Diana Andringa e Miguel Soares, que traça um perfil biográfico sobre Vergílio e foi exibido na televisão portuguesa RTP poucos dias antes da morte do escritor, em 1996.
 
BAÚ DE LETRAS
 
1. “Jazíamos num mundo de mortos e de larvas. O último rastro de civismo tinha desaparecido ao redor de nós e dentro de nós. É homem quem mata, é homem quem comete ou sofre injustiças; não é homem quem, perdido todo recato, divide cama com um cadáver; quem esperou que seu vizinho terminasse de morrer para lhe tirar um quarto de pão está, embora sem culpa, mais longe do homem pensante que o sádico mais atroz”. Este excerto pertence a É isto um homem?, de Primo Levi. E por citar o escritor na seção Dicas de Leitura a ele voltamos para recomendar duas posts de nosso arquivo: esta que revisita um pouco a biografia de Levi pós-Auschwitz; e esta lista com seis livros para quem quer ler mais que o texto aqui recomendado.
 
2. No mesmo dia do aniversário de Vergílio Ferreira, passou-se os cinquenta anos sobre a morte de Dino Buzzati, nome significativo da literatura italiana e autor de livros como O deserto dos tártaros e O amor. Em 2008, traduzimos este breve texto sobre sua obra.
 
3. Virginia Woolf nasceu no dia 25 de janeiro de 1882. E no 140.º aniversário da escritora, preparamos este fio com algumas das principais entradas no blog sobre sua vida e obra; e esta entrada no Instagram sublinhando outra efeméride importante para o ano que agora começamos: o centenário da primeira edição de O quarto de Jacob, romance que foi o primeiro título da editora que Virginia montou com o marido, a Hogarth Press. Vale apena passar e deixar seu comentário e sua partilha.

DUAS PALAVRINHAS
 
Não se pode querer que Deus resolva os problemas do homem, porque, se o fizesse, retiraria do homem a responsabilidade e, por consequência, o livre-arbítrio.

— De Viva o povo brasileiro, João Ubaldo Ribeiro.  

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Comentários

Uma sugestão para os editores da página: que tal colocar link não só em livros selecionados, mas em TODOS os livros citados nos boletins e artigos? Sugeriria até mesmo colocar link nos boletins/artigos anteriores, em especial os mais acessados. Isto, além de não descaracterizar a proposta e a identidade culturais deste ótimo Blog, ajudaria na manutenção do Letras Inverso/Reverso. Vida longa a este espaço!
Pedro Fernandes disse…
Caro Pablo, obrigado pela mensagem com a sugestão! É algo que pensamos há algum tempo e que agora começamos a colocar em prática, aos poucos.

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