Boletim Letras 360º #414

 
 
DO EDITOR
 
1. Saudações, leitor! Eis uma nova edição do Boletim Letras 360º caprichada. Obrigado pela atenção e pela companhia aqui e nas redes do Letras. Boas leituras!

Simone de Beauvoir. Foto: Micheline Pelletier. Romance póstumo da escritora ganha edição no Brasil.


 
LANÇAMENTOS
 
Romance, livro de contos, de ensaios, crítica literária, peça de humor: publicado originalmente no ano 2000, o premiado Bartleby e companhia marcou época ao colocar o fazer literário no espelho e mesclar diversos gêneros de maneira radical.
 
Neste livro premiado e inclassificável, o catalão Enrique Vila-Matas recupera a figura de Bartleby (personagem criado por Herman Melville), um jovem escrivão que se esquiva de obrigações e misteriosamente vai se ausentando de toda e qualquer atividade graças a uma resposta enigmática que dá a todos que pedem para que realize algo: “eu preferia não o fazer”. A frase deixa seus interlocutores perplexos, e pouco a pouco Bartleby se isola até quase sumir. Vila-Matas faz com que essa “pulsão negativa” escape do conto de Melville e, como um vírus, atinja diversos escritores por toda parte. O protagonista de Bartleby e companhia, então, se dedica a rastrear e catalogar autores, fictícios e reais, que escolheram o silêncio, como o americano J. D. Salinger, que, após se tornar uma celebridade com O apanhador no campo de centeio, afastou-se da sociedade e deixou de publicar, ou o suíço Robert Walser, cujo maior sonho era ser esquecido. Ao escrever sobre o ato de não escrever, Vila-Matas captou com perspicácia a crise do pós-modernismo, em que se supõe que todas as ideias já foram inventadas e não resta mais originalidade, para construir, a partir de detritos e restos, uma obra cômica e explosivamente criativa que se tornou objeto de culto ao redor do mundo. A tradução é de Josely Vianna Baptista e Maria Carolina Araújo. O livro é publicado em março pela Companhia das Letras.
 
Novo romance de Kazuo Ishiguro.
 
Klara, um Amigo Artificial com habilidades de observação impressionantes, estuda com cuidado o comportamento de todos que passam pela vitrine. Do lugar onde foi designada a ficar na loja, ela espera que uma dessas pessoas entre e a escolha como companheira. Contudo, quando surge a possibilidade de sua vida mudar para sempre, Klara é aconselhada a não apostar suas fichas na bondade humana. Neste novo livro, Kazuo Ishiguro examina o mundo moderno pelos olhos de uma narradora inesquecível. Com uma linguagem única e precisa, ele constrói um romance arrebatador sobre o significado do amor e do cuidado. Klara e o sol é publicado em março pela Companhia das Letras. A tradução é de Ana Guadalupe.
 
Neste romance embebido de lirismo, Micheliny Verunschk joga luz sobre a história de duas crianças indígenas raptadas no Brasil do século XIX.
 
Em 1817, Spix e Martius desembarcaram no Brasil com a missão de registrar suas impressões sobre o país. Três anos e 10 mil quilômetros depois, os exploradores voltaram a Munique trazendo consigo não apenas um extenso relato da viagem, mas também um menino e uma menina indígenas, que morreriam pouco tempo depois de chegar em solo europeu. Em seu quinto romance, Micheliny Verunschk constrói uma poderosa narrativa que deixa de lado a historiografia hegemônica para dar protagonismo às crianças — batizadas aqui de Iñe-e e Juri — arrancadas de sua terra natal. Entrelaçando a trama do século XIX ao Brasil contemporâneo, somos apresentados também a Josefa, jovem que reconhece as lacunas de seu passado ao ver a imagem de Iñe-e em uma exposição. Com uma prosa embebida de lirismo, este é um livro sem paralelos na literatura brasileira ao tratar de temas como memória, colonialismo e pertencimento. O som do rugido da onça chega às livrarias em março pela Companhia das Letras.
 
Do premiado autor Ross King, um incrível retrato do lendário artista Claude Monet e a história por trás de seu projeto mais memorável: as Ninfeias.
 
No começo de 1914, jornais franceses divulgavam que Claude Monet, um dos pintores mais ricos e celebrados do mundo, aos 73 anos, havia se aposentado. Sua amada esposa, Alice, e seu filho mais velho, Jean, haviam morrido. Sua visão apurada, que Cézanne chamou de “o olho mais prodigioso da história da pintura”, estava ameaçada pela catarata. E, no entanto, apesar da saúde frágil, Monet voltou a pintar, em proporções mais ambiciosas do que nunca. Monet é talvez o artista mais reconhecido mundialmente. Entre suas criações mais célebres, estão as Ninfeias de seu jardim em Giverny. Ao vê-las em museus de vários países, fãs são movidos pelo poder dos pincéis de Monet para um mundo de natureza harmônica; o próprio Monet pretendia que as ninfeias proporcionassem um “refúgio de meditação pacífica”. No entanto, como revela Ross King nesse magistral relato sobre o artista e a obra, esses belos quadros guardam a intensa frustração vivida por Monet com as dificuldades de capturar os efeitos da luz, da água e da cor. Também refletem os terríveis sofrimentos pessoais pelos quais o artista passou nos últimos anos de vida. Monet e a pintura das Ninfeias conta a história por trás da criação dessas obras memoráveis, enquanto os horrores da Primeira Guerra Mundial se aproximavam cada vez mais rápido de Paris e Giverny, e uma nova geração de artistas, liderada por Henri Matisse e Pablo Picasso, questionava as conquistas do Impressionismo. A tradução de Cristina Cavalcanti é publicada pela Editora Record.
 
De volta ao conto dezessete anos depois de sua elogiada estreia no gênero, Paulo Henriques Britto nos conduz por um universo povoado por personagens que se veem diante de escolhas decisivas sobre a própria identidade.
 
Um engenheiro se envolve com um grupo de teatro experimental. Um guerrilheiro fugindo do Exército vira uma espécie de santo numa cidadezinha cheia de fiéis. Um burocrata tem um estranho flashback ao entrar no prédio onde deveria apenas retirar um documento. Como narrativas de formação sui generis, passadas no mundo adulto e vividas por indivíduos aparentemente comuns, as nove histórias de O castiçal florentino têm por subtexto um grande “e se?”. O inconformismo com o que é previsível se espalha inclusive pela linguagem: com uma liberdade equivalente ao grande domínio técnico que tem do ofício, Paulo Henriques Britto experimenta diferentes estilos e tipos de registro — do ensaio ao discurso de agradecimento, do texto introspectivo em primeira pessoa à metaficção em terceira — sem perder de vista o calor humano daquilo que descreve. Um conjunto extraordinário de histórias em que, à força de devaneio, a ficção se apresenta como elemento-chave e plano de fuga da ordem cotidiana. O livro é publicado em março pela Companhia das Letras.
 
A obra máxima de Lévi-Strauss, um marco na abordagem do pensamento indígena.

Publicado originalmente em 1964, “O cru e o cozido” é o primeiro volume da extraordinária série Mitológicas, de Claude Lévi-Strauss. Partindo do mito de referência do “desaninhador de pássaros”, colhido entre os Bororo do Brasil Central, o autor vai aos poucos mobilizando centenas de narrativas de todo o continente americano. São mitos que falam da passagem da natureza à cultura, do contínuo ao descontínuo, e revelam uma lógica nada arbitrária de ver e pensar o mundo, que se expressa não por categorias abstratas — como os conceitos utilizados pela ciência —, mas por categorias empíricas como cru, cozido, podre, queimado, silêncio, barulho. Ao desvelar a singularidade e a riqueza de um pensamento extremamente sofisticado e original, a obra de Lévi-Strauss lança luz sobre a inestimável contribuição da mitologia ameríndia para o conhecimento. O cru e o cozido inaugura a edição dos quatro volumes das Mitológicas na Zahar.
 
Neste primoroso romance de estreia, acompanhamos a trajetória de Raimundo, homem analfabeto que na juventude teve seu amor secreto brutalmente interrompido e que por cinquenta anos guardou consigo uma carta que nunca pôde ler.
 
Aos 71 anos, Raimundo decide aprender a ler e a escrever. Nascido e criado na roça, não foi à escola, pois cedo precisou ajudar o pai na lida diária. Mas há muito deixou a família e a vida no sertão para trás. Desse tempo, Raimundo guarda apenas a carta que recebeu de Cícero, há mais de cinquenta anos, quando o amor escondido entre os dois foi descoberto. Cícero partiu sem deixar pistas, a não ser aquela carta que Raimundo não sabe ler — ao menos até agora. Com uma narrativa sensível e magnética, o escritor cearense Stênio Gardel nos leva pelo passado de Raimundo, permeado de conflitos familiares e da dor do ocultamento de sua sexualidade, mas também das novas relações que estabeleceu depois de fugir de casa e cair na estrada, ressignificando seu destino mais de uma vez. A palavra que resta, de Stênio Gardel é publicado em março pela Companhia das Letras.
 
Terceiro livro de poemas de uma das vozes mais afiadas, lúcidas e mordazes do nosso tempo.
 
Neste livro de poemas, que é também um livro de memórias, André Dahmer visita lembranças da infância e da adolescência para fazer um acerto de contas com o presente. Estão aqui as descobertas do amor e do sexo, da paixão e do fim da paixão, da morte e do medo da morte: “e sei que todos os erros são para sempre/ a bicicleta/ o violão/ o casamento/ tudo o que a gente ama/ um dia precisará de conserto”. Com lucidez melancólica, humor afiado e impressionante franqueza, Dahmer usa experiências da própria vida como matéria-prima para seus versos – ora cômicos, ora brutais. Impressão sua revela a sensibilidade desconcertante de uma das mentes mais contundentes e brilhantes da atualidade: “as grandes mágicas/ não são feitas por mágicos”. Impressão sua é publicado em março pela Companhia das Letras.
 
Uma mostra da obra narrativa do poeta, dramaturgo e ficcionista peruano, César Vallejo, é traduzida pela primeira vez no Brasil.
 
Esta antologia foi publicada em Madri, em 1931, e só lançada no país natal de Vallejo, em 1957, quase vinte anos após a morte do autor, ocorrida em Paris, em 1938, onde era reconhecido como um dos nomes decisivos da literatura latino-americana. Ao longo das últimas décadas parte da obra em prosa do criador peruano tem sido reavaliada, como é caso de Tungstênio, que adquiriu uma relevância explícita depois de reconhecido pela crítica como um marco literário da narrativa indigenista, antecipando inclusive um autor como José María Arguedas. Trata-se da tentativa veemente de Vallejo de denunciar a exploração não só das riquezas minerais como do povo peruano. Em simultâneo, alerta para o tratamento desumano das populações indígenas, com a complacência das oligarquias locais, suplantando dessa maneira tempo e espaço, e fixando sua narrativa com a força da atemporalidade. Tudo decorre na região serrana de Colca, onde se situam as minas de tungstênio, metal que o Peru chegou a produzir em larga escala até a pouco tempo. Uma empresa norte-americana — a Mining Society — é a responsável pela extração do metal, que envia para os Estados Unidos, prestes a entrar na Primeira Guerra Mundial. Para o efeito, emprega uma legião de indígenas e a população mais desvalida, cujo trabalho se efetua sob o regime de semiescravidão. Os representantes do poder local colaboram com todas as injustiças praticadas, e Vallejo delineia tais personagens de maneira intensa, sem poupar os traços mais obtusos do caráter humano, descrevendo desde um estupro coletivo, até o assassínio da população que tenta fazer um levante após presenciar a morte de um indígena em plena prefeitura. Dessa maneira, Colca se torna o microcosmo de um continente, e todos os ataques sofridos ao longo da história e dos séculos se ressignificam simbolicamente aqui. Ao contrário da poesia do autor, sua ficção transita sobre os aspectos mais crus da realidade que marcou — ainda marca — o Peru e, por extensão, a América Latina. Vallejo intensifica sua paleta, expondo os abusos, os crimes e a intolerância, que são reproduzidos com a tensão contínua. Por essa razão, a crítica que atravessa o livro garante sua atualidade, revelando um autor consciente, mas distinto do poeta que trabalhou os aspectos oníricos e a densidade vanguardista do discurso poético. Com Tungstênio, Vallejo funda uma voz atemporal que continuará a ecoar para além destas páginas. A tradução de Jorge Henrique Bastos é publicada pela editora Iluminuras.
 
Quase 70 anos depois de ser escrito, chega ao Brasil o romance inédito de Simone de Beauvoir com uma história fundamental para a formação de uma das mais importantes intelectuais do século XX.
 
Escrito em 1954, cinco anos após a publicação de O segundo sexo, As inseparáveis é o romance autobiográfico que conta a história da amizade passional que uniu Sylvie (Simone de Beauvoir) e Andrée (Élisabeth Lacoin, a Zaza). Sylvie e Andrée se conhecem aos 9 anos no colégio Desir, numa Paris em meio à Primeira Guerra Mundial. Andrée é divertida, impertinente, audaciosa; Sylvie, mais tradicional e tímida, logo se sente irremediavelmente atraída por ela. No entanto, por trás da postura rebelde, Andrée tem de lidar com uma família católica fervorosa que, com suas tradições muito rígidas e ambiente opressor, está disposta a esmagar qualquer expressão de individualidade. Juntas, elas trilham o caminho para se libertar das convenções de sua época e das expectativas asfixiantes, mas não fazem ideia do preço trágico que terão de pagar pela liberdade e pelas ambições intelectuais e existenciais. As inseparáveis relata as experiências que fundamentaram a revolta e a obra da grande filósofa francesa: sua emancipação e o antagonismo entre intelectuais e conservadores. Também retrata e denuncia uma sociedade hipócrita e fanática. Essa história catártica de Simone de Beauvoir, publicada com fotos pessoais e cartas trocadas entre as duas amigas, além de introdução de Sylvie Le Bon de Beauvoir, constitui um verdadeiro evento literário. A tradução de Ivone Benedetti é publicada pela Editora Record.
 
Os caminhos percorridos pela chamada Ideologia Francesa.
 
Neste livro, o filósofo Paulo Arantes, um dos mais destacados intelectuais brasileiros da atualidade, guia o leitor pelos caminhos percorridos pela chamada Ideologia Francesa, conjunto prestigioso de ideias que reuniu pensadores como Foucault, Derrida e, na sua variante franco-brasileira, Gérard Lebrun. Sua hegemonia atingiu o ápice no final dos anos 1980, quando, dentro do sistema universitário americano, misturou-se à Teoria da Ação Comunicativa de Habermas e ao neopragmatismo de Richard Rorty. Para o autor, esse cruzamento de conceitos em que predomina a noção de discurso revela na verdade transformações históricas reais, como, por exemplo, o papel legitimador que involuntariamente essas ideias tiveram na atual fase do capitalismo. O livro tem posfácio de Giovanni Zanotti e é parte na Coleção Espírito Crítico editada pela Editora 34 e Editora Duas Cidades.
 
Livro publicado postumamente, é um dos documentos literários mais significativos e tocantes sobre a exploração feminina e o racismo no século XX.
 
A antilhana Françoise Ega trabalhava em casas de família em Marselha, na França. Um de seus pequenos prazeres era ler a revista Paris Match, na qual deparou com um texto sobre Carolina Maria de Jesus e seu Quarto de despejo. Identificou-se prontamente. E passou a escrever “cartas” — jamais entregues — à autora brasileira. Nelas, relatava seu cotidiano de trabalho e exploração na França, as dificuldades, a injustiça nas relações sociais, a posição subalterna (e muitas vezes humilhante) a que eram relegadas tantas mulheres como ela, de pele negra e originárias de uma colônia francesa no Caribe. Aos poucos, foi se conscientizando e passou a lutar por seus direitos. Quando morreu, em 1976, era um nome importante na sociedade civil francesa. Cartas a uma negra, publicado postumamente, é um dos documentos literários mais significativos e tocantes sobre a exploração feminina e o racismo no século XX. Concebido como um conjunto de cartas, datadas entre 1962 e 1964, o texto vai ganhando profundidade e variedade estilística à medida que a autora mergulha no processo de escrita — a ponto de o livro poder ser lido como um romance. Entre seus personagens, além das babás, empregadas domésticas e faxineiras, estão também as autoritárias (e tacanhas) patroas e seus filhos mimados. A tensão principal se dá na relação entre patroas e empregadas: a atitude imperial de umas e a completa falta de direitos das outras. São histórias por vezes chocantes de trabalhadoras sem acesso a saúde, férias ou mesmo a uma moradia minimamente confortável. Tudo isso é relatado de forma pungente e expressiva, tendo como “leitora ideal” a escritora brasileira, que, ao longo de sua trajetória, teve experiências semelhantes. Pois ambas, Ega e Carolina, lutaram pelo mais básico: a dignidade na vida e na literatura. A tradução é de Vinicius Carneiro e Mathilde Moaty. O livro é publicado em março pela editora Todavia.
 
Neste romance finalista do prêmio Pulitzer, acompanhamos o amadurecimento de uma jovem universitária nos anos 1990 que se descobre como escritora enquanto vive as agruras e as delícias do primeiro amor.
 
Selin, filha de imigrantes turcos, começará seu primeiro semestre em Harvard. O ano é 1995 e a internet, uma novidade. Ela se inscreve em matérias de que nunca ouviu falar, faz amizade com a carismática e cosmopolita colega sérvia, Svetlana, e começa a se corresponder por e-mail com Ivan, um estudante de matemática húngaro, mais velho. Selin falou pouco com Ivan, mas a cada e-mail que trocam, o ato de escrever parece assumir significados novos e cada vez mais misteriosos. No final do ano letivo, Selin vai passar um tempo na Europa, mas o verão lá não lembra em nada o que ela já ouviu falar sobre as experiências típicas de estudantes universitários americanos. Trata-se de uma jornada mais profunda para dentro de si mesma: enfrentar a inefável e estimulante confusão do primeiro amor, acompanhada da crescente consciência de que está predestinada a se tornar uma escritora. Com impressionante sensibilidade emocional e intelectual, humor mordaz e um estilo sem reparos, Elif Batuman dramatiza as incertezas da vida prestes a entrar na idade adulta. A tradução é de Odorico Leal. A idiota é publicado pela Companhia das Letras.
 
Das leituras indispensáveis para entrar no universo da obra de Homero.
 
O texto escrito é um dos grandes marcadores do conhecimento humano. Ao ser estabelecido, consolida-se como versão da história capaz de atravessar os séculos e se firmar como verdade absoluta, ou quase. Até que outros indícios, descobertas e métodos de pesquisa e análise sejam reunidos para contestá-lo. Contestar, nesse caso, significa aprofundar a análise, o debate e a reunião de argumentos capazes de fazer balançar as bases daquele arcabouço. Quando Gregory Nagy se debruça sobre os textos clássicos atribuídos a Homero, é isso o que ele traz: evidências, argumentos e uma interpretação nova, sólida, mas disruptiva, levando as bases da cultura clássica — a Ilíada e a Odisseia — atribuídas ao talento de um notável historiador, Homero, para o campo do enigma: terão sido escritos por este autor ou são o resultado de décadas de transmissão oral? Um mistério que renova ainda mais o brilho e a importância, se isso é possível, a essas duas obras-primas da cultura humana. Questões homéricas, com tradução de Rafael Rocca dos Santos, ganha edição pela editora Perspectiva.
 
O fechamento da premiada trilogia Wolf Hall, de Hilary Mantel.
 
“Não se pode lutar contra os mortos.” A frase, pronunciada por um dos personagens de O espelho e a luz, poderia servir de epígrafe à jornada de Thomas Cromwell, desde suas origens miseráveis até os píncaros do poder na Inglaterra do século XVI — uma saga de intrigas, reviravoltas e custosos triunfos, narrada de forma magistral pela grande romancista Hilary Mantel. Trata-se, claro, de uma epígrafe trágica: desde que o encontramos pela primeira vez, Thomas Cromwell vem tentando precisamente lutar contra os mortos e impedir que continuem determinando o presente e o futuro dos vivos. Em Wolf Hall e Tragam os corpos, assistimos à ascensão desse plebeu, filho de um ferreiro de Putney, que se tornou o principal ministro de Henrique VIII, ajudando-o a se divorciar de Catarina de Aragão e guiando a Inglaterra em seu rompimento com a Igreja de Roma. Transcorrido entre 1536 e 1540, O espelho e a luz começa no ponto exato em que o segundo volume acabou: no cadafalso ensanguentado onde jaz o corpo de Ana Bolena. Após auxiliar o rei a se livrar de mais uma esposa indesejada, Cromwell alcança o auge de sua glória — e até os nobres, que antes o desprezavam, agora precisam cortejar seu favor. Mas há velhas sombras e novos obstáculos em seu caminho. No Norte da Inglaterra, rebeldes marcham em defesa do catolicismo; no exterior, os inimigos do rei conspiram para destroná-lo. Além de frustrar esses planos, o múltiplo ministro de Henrique VIII precisa lidar com o caótico temperamento do monarca, que fica mais feroz conforme o corpo envelhece. O maior adversário de Cromwell, contudo, será sua própria consciência. À medida que sua aventura se aproxima do fim, ele terá de arcar com o peso das vidas que destruiu (e dos princípios que escamoteou) em sua missão de reformar a Inglaterra. À noite, os mortos habitam seus sonhos. “Eu fui justo? Não. Fui prudente? Não. Fiz a melhor coisa pelo meu país? Sim”, diz Cromwell para si mesmo. O leitor poderá aceitar ou rejeitar esse juízo — o certo é que não conseguirá tirar os olhos da página até que o destino desse fascinante personagem, misto de sábio, mercenário e idealista, finalmente se consuma. A tradução de Heloísa Mourão e Ana Ban é publicada pela editora Todavia.
 
Novo livro de Afonso Cruz no Brasil.
 
Em plena Guerra Fria, a CIA engendra um plano batizado Jazz Ambassadors para cativar a juventude do leste europeu para a causa americana. É nesse pano de fundo que conhecemos Erik Gould, pianista exímio, capaz de visualizar sons e de pintar retratos nas teclas do piano. A música está tão entranhada no seu corpo quanto o amor pela única mulher da sua vida, que desapareceu repentinamente. E será o filho de ambos, Tristan, cansado de procurar a mãe entre as páginas de um atlas, que encontrará um caminho para recuperar a alegria. Nem todas as baleias voam é publicado pela editora Dublinense e amplia a Coleção Gira, dedicada a autores portugueses contemporâneos.
 
Livros reúne textos decisivos na formação do pensamento de Frantz Fanon.
 
Recém-formado, em 1953 Frantz Fanon deixa a França para chefiar a ala psiquiátrica de um hospital na Argélia, encontrando um país em combustão social. No ano seguinte, eclode a guerra pela independência. Mergulhado na situação dramática vivida pelo povo argelino e africano em geral, ele adere ao movimento revolucionário como intelectual e militante da Frente de Libertação Nacional. Por uma revolução africana é uma bússola do percurso de Fanon, oferecendo um panorama privilegiado do desenvolvimento de sua obra e de suas teses políticas, filosóficas e psicanalíticas. Escritos entre 1951 e 1961 — anos decisivos em que produziu os clássicos Pele negra, máscaras brancas e Os condenados da terra — e agora reunidos nessa poderosa coletânea de artigos, ensaios e cartas, seus textos políticos dão prova da potência transformadora e original que fez de seus pensamentos e ações um modelo paradigmático do intelectual ativista. Médico, filósofo político, teórico do colonialismo e das possibilidades de superá-lo, militante da independência africana, o psiquiatra martinicano foi antes de tudo um revolucionário, inspiração central para os movimentos negros e de direitos civis no mundo. Por meio de uma profunda análise da situação do colonizado — que pode diagnosticar através de sua experiência médica diária —, Fanon disseca a opressão imperialista e o efeito psicológico devastador causado pelo racismo, examinando questões como o panafricanismo, os sentidos da negritude na África e no Caribe e a atitude da esquerda francesa diante da Guerra da Argélia. Autor incontornável, Frantz Fanon nos dá as chaves para compreender os mecanismos da estrutura racista e colonial que segue nos assombrando. O livro tem prefácio de Deivison Faustino, professor da Unifesp e especialista na obra de Fanon. A tradução é de Carlos Alberto Medeiros e é publicada pela editora Zahar.
 
O retorno de Marçal Aquino à cena literária, dezesseis anos depois do sucesso de Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios.
 
O ano é 1973, um dos períodos mais duros da ditadura militar no Brasil. É num ambiente contaminado pela paranoia que se move Miguel, um agente do setor de Inteligência da polícia civil cuja especialidade é se infiltrar em quadrilhas sob investigação. Numa das operações, ele se aproxima de um grupo de ladrões de carga, tornando-se íntimo de Ingo, o chefe, que não só apadrinha sua entrada no bando como lhe apresenta a irmã, Nádia, com quem Miguel inicia um relacionamento que tem no sexo seu ponto de combustão. Profissionalmente vaidoso, Miguel acredita que, na hora adequada, não terá dificuldades para romper os laços surgidos durante a operação. Mas as coisas não saem como ele imagina: apaixonado por Nádia, o policial se vê surpreendido por dúvidas sobre de que lado irá ficar quando o cerco se fechar sobre a quadrilha. Com uma prosa ágil e intensa, Aquino confirma seu nome entre os melhores da ficção brasileira contemporânea. O mundo do crime nunca foi tão sensual quanto em Baixo esplendor.
 
Uma das mais poderosas e belas peças literárias sobre os perigos do desejo, um retrato brilhante da luta constante de um homem contra as forças que ameaçam destruí-lo.
 
Geoffrey Firmin, ex-cônsul britânico, vive na cidade de Quauhnahuac, no México. Seu mal-estar debilitante é a bebida, uma atividade que tomou conta de todos os aspectos de seu cotidiano. No Dia dos Mortos de 1938, sua esposa, Yvonne, chega à cidade para tentar reatar o casamento, imaginando uma vida a dois longe do México e das circunstâncias que levaram seu relacionamento à beira do colapso. Contudo, sua missão se torna ainda mais difícil pela presença de Hugh, meio-irmão do cônsul, e de Jacques, um amigo de infância. Enquanto Firmin se afoga em mescal, os demais personagens assistem, impotentes, sua trágica figura. Conforme o dia passa, fica claro que Geoffrey deve tomar uma atitude drástica. Com tradução de José Rubens Siqueira, Debaixo do vulcão é publicado pela editora Alfaguara.
 
Peça de Marcia Tiburi e Rubens Casara discute polarização ideológica no Brasil.
 
A peça trata da disputa de duas tendências: uma concepção racionalista e comprometida com as liberdades e o pensamento democrático representada pela psicanalista e uma concepção irracional típica da personalidade autoritária crescente na sociedade brasileira representada pelo personagem do fascista. A peça se propõe a mostrar que enquanto a intelectualidade se limita a ridicularizar e menosprezar o fascismo, ele cresce entre a população. Trata-se de um duelo em que a personagem da psicanalista está fadada a perder em um momento de empobrecimento da subjetividade. Para além da tragédia e do drama, a proposta é de que o espectador se perceba e se assuste com sua simpatia pelo fascista. A personagem da psicanalista mostra a fragilidade da consciência, e a ingenuidade do intelectual, diante do fascismo e seu esforço de resistência. A psicanalista (como a sociedade ilustrada) primeiro acha o fascista, que chega ao seu consultório, um sujeito tosco e inofensivo, meio engraçado, e depois percebe o seu perigo. Ela começa professoral e didática e passa a ser irônica; aos poucos se percebe assustada. Ele começa como um bonachão e depois acirra o ânimo, torna-se cada vez mais cínico. O tom de sua fala é de um canastrão, o que cativa o público e é sempre meio autoritário. Em vários momentos ele mistura convicção com deboche. Ele é meio burro e bastante convicto. Há notas afetadas em seu modo de falar. Em um primeiro momento ela adota uma postura tipicamente lacaniana, depois ela se torna mais debochada e por fim ela chega ao desespero. Trata-se de enfrentar esse “elemento de desespero” que está oculto diante do que vem acontecendo no Brasil. Um fascista no divã é publicado pela editora Nós.
 
Ariano Suassuna para jovens e todas as idades.
 
Ariano Suassuna era um excelente contador de histórias. Das aulas-espetáculo aos “causos” que ouvia e incorporava a seus livros, os exemplos são tantos que poderíamos dizer que sua vida foi pautada por divertidas ― e inacreditáveis ― histórias. Pensando no jovem leitor, Carlos Newton Júnior selecionou algumas que foram publicadas no Almanaque Armorial, uma coluna que Ariano mantinha no Jornal da Semana, e em outros periódicos. São lembranças de juventude, acontecimentos vividos e narrados por seus irmãos e mais algumas inusitadas narrativas de personagens como o médico Noel Nutels e o escritor Rubem Braga. As ilustrações primorosas de Manuel Dantas Suassuna, em cores intensas e traços singulares, completam esta bela e inédita antologia. A pensão de Dona Berta e outras histórias para jovens é publicada pela editora Nova Fronteira.
 
Livro-referência para o debate sobre os limites da razão.
 
Um juiz alemão relata a própria experiência com a loucura. Desde que serviu de base para o clássico Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia, de Freud, o livro ganhou edições mundo afora e segue como referência para o debate sobre os limites da razão. Esta edição, além de contar com introdução e tradução de Marilene Carone, traz ainda dois ensaios que ampliam a compreensão do caso Schreber e atestam sua atualidade: um escritor por Elias Canetti e outro por Roberto Calasso. O livro é publicado pela editora Todavia.
 
Novo título na coleção de latino-americanos da editora Mundaréu.
 
Garotos brincam às margens de um canal e descobrem um cadáver putrefato, que lhes sorri. É a Bruxa, ou Bruxa Menina, figura icônica e temida em La Matosa. A partir daí, em uma torrente narrativa intensa, Fernando Melchor recompõem os fatos que levaram ao crime com base nos relatos de alguns dos envolvidos, criando um retrato visceral de uma cidadezinha perdida no México e de seus terrores, um lugar dominado pela pobreza, superstição, misoginia e homofobia, preconceito, violência institucional e doméstica. O lirismo brutal de Melchor faz desta história policial uma análise social e um tour de force literário. Temporada de furacões logo conquistou público e crítica nos países em que foi publicado, catapultando Fernanda Melchor à posição de uma das mais promissoras vozes latino-americanas da atual geração. Prêmio Anna Seghers 2019, Haus der Kulturen der Welt 2019, e Finalista do International Booker Prize 2020. A tradução de Antonio Xerxenesky é publicada pela Mundaréu.
 
Um novo livro de Tatiana Salém Levy.
 
Estamos em 2014. Euforia no Brasil e especialmente no Rio de Janeiro. Copa do Mundo prestes a acontecer, Olimpíadas de 2016 à vista. Autoestima da cidade nas alturas. Sensação de que o país havia encontrado um novo caminho. Júlia é sócia de um escritório de arquitetura que está planejando alguns projetos na futura Vila Olímpica. No dia de uma dessas reuniões com a prefeitura, Júlia sai para correr no Alto da Boa Vista, um enclave de Mata Atlântica no meio da grande cidade. A certa altura, alguém encosta um revólver na sua cabeça e a leva para dentro da mata, onde é estuprada. Deixada largada no meio da floresta, ela se arrasta para casa, onde uma amiga lhe presta os primeiros socorros. O rosário de dor, sensação de imundície e “culpa” é descrito com crueza e qualidade literária poucas vezes vistas em nossa ficção. Assim como os percalços junto à polícia para tentar encontrar o criminoso numa sociedade em que basta ser pobre para parecer suspeito. Mas nem tudo é horror e escuridão. A história é narrada para os filhos da protagonista anos depois do terrível episódio. Os fatos retrocedem e avançam no tempo. Temos o início de namoro de Júlia, sua lua de mel numa praia paradisíaca, a gestação. São momentos em que habilmente a autora constrói outra visão do corpo e da sexualidade de Júlia como uma prova, para quem cometeu a violência e para si mesma, de que ela é ainda a dona da própria história. Vista chinesa é publicado pela editora Todavia em março.

Romance premiado da escritora colombiana Cristina Bendek ganha edição no Brasil.
 
O retorno a San Andrés faz com que Verónica Baruq questione sua relação com a ilha. A foto perturbadora de seus tataravós e o raro encontro com Maa Josephine, uma idosa raizal que ela conhece em frente à Primeira Igreja Batista, são alguns dos gatilhos que começam a revelar detalhes de suas origens. Seu passado não só a coloca em contato com a história desconhecida da ilha, mas também com os movimentos sociais que, entre o zouk e o calipso, celebram a identidade raizal, fazem reduções do pensamento, resistem. Os cristais do sal foi vencedor do Prêmio Nacional de Novela Elisa Mújica 2018, da Idartes e Laguna Libros. O livro é publicado pela Editora Moinhos com tradução de Silvia Massimini Félix.
 
O novo de Djaimilia Pereira.
 
Esta é a história de Celestino, um homem cujo passado de brutalidade e violência atrozes é substituído, no crepúsculo da vida, por um amor delicado e cuidadoso pelo seu jardim. Nesta meditação sobre o bem e o mal, e sobre como a natureza parece indiferente à nossa moralidade, Djaimilia construiu um romance que encanta pela beleza de suas frases e fascina pela profundidade com que Celestino é desenhado. A visão das plantas é publicado pela editora Todavia no mês de março.
 
REEDIÇÕES
 
Em novo projeto gráfico, Insônia reúne treze contos em que estão presentes a secura emotiva e a economia vocabular, características que convivem com a precisão psicológica de Graciliano Ramos.
 
Publicado originalmente em 1947, Insônia é o sexto livro de Graciliano Ramos. A obra reúne treze contos ― “Insônia”, “Um ladrão”, “O relógio do hospital”, “Paulo”, “Luciana”, “Minsk”, “A prisão de J. Carmo Gomes”, “Dois dedos”, “A testemunha”, “Ciúmes”, “Um pobre-diabo”, “Uma visita” e “Silveira Pereira” ―, nos quais temas muito caros ao autor se evidenciam, como morte, envelhecimento e injustiça social. "Insônia" mostra como o ser humano reage a situações diversas, revelando suas fragilidades e angústias. As histórias desta obra estão repletas de inquietudes existenciais que oferecem ao leitor a possiblidade de confrontar a própria realidade, acompanhado sempre do estilo que consagrou Graciliano Ramos como um dos maiores autores brasileiros, e que já é conhecido dos leitores: a economia vocabular, a secura emotiva e a precisão psicológica. O livro é publicado pela Editora Record.
 
Editora reedita traduções de João do Rio para textos de Oscar Wilde.
 
Publicado em 1891, no ensaio A decadência da mentira, Oscar Wilde põe em cena duas personagens que dialogam sobre arte: Viviano e Cyrillo. Viviano apresenta ao amigo algumas das ideias que compõem um artigo que está escrevendo. São quatro ensaios antológicos, em que estão presentes as paixões e humores da imaginação e da vida do espírito. Cada uma das artes possui um crítico que lhe é destinado. Uma coleção interessante uma reunião da visão espirituosa, desconfortável, paradoxal e satírica de Oscar Wilde. O livro é publicado pela Editora Principis. A tradução de Intentions é a realizada por João do Rio e traz texto de introdução escrito pelo cronista brasileiro.
 
Nova edição de Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, é o novo título na coleção de clássicos da editora Antofágica.
 
O que define o Brasil, afinal? Para descobrir as tradições mais genuínas da nossa terra, marche atrás do major Policarpo Quaresma. Mas não se espante se descobrir que o destino é a loucura. Ilustra a desordem, João Montanaro. Escrevem sobre o improgresso, Criolo e Ferréz. Qualquer um reconhece de longe que major Policarpo Quaresma é um nacionalista genuíno. Suas idas diárias à padaria francesa e óculos em estilo europeu não abalam sua fama. Nem mesmo o fato de que seu título de major não se deu por mérito militar, e sim por costume. Não há nada ou ninguém capaz de impedi-lo de se proclamar o bastião dos mais tradicionais costumes de nossa terra. Se o violão é o mais brasileiro dos instrumentos, e as modinhas, o mais nacional dos ritmos, serão essas as novas obsessões do major. Se os Tupinambás choravam ao encontrar pessoas queridas para demonstrar saudades, nada mais natural que encontrar Policarpo aos prantos. Pensando bem, por que é que não estamos tendo essa conversa em nossa língua original, o tupi-guarani? É isso que vai defender Policarpo Quaresma perante o Congresso Nacional. Publicado originalmente em folhetim, em 1911, esta obra de Lima Barreto é essencial para compreender um Brasil que, embora buscasse criar uma identidade nacional para a recém-declarada República, trazia intactas muitas das características da antiga sociedade colonial. A nova edição da Antofágica, além de ilustrações de João Montanaro e apresentação de Criolo, contou com posfácio e notas de Jorge Augusto de Jesus (IFBA), além de texto da especialista em literatura negro-brasileira Fernanda Felisberto (UFRRJ) e um ensaio poético de Ferréz, expoente da literatura marginal no país.
 
OUTRAS NOTÍCIAS
 
Livrarias francesas recebem em março livro com manuscritos inéditos de Marcel Proust.
 
Trata-se de uma compilação feita a partir do arquivo de Proust que estava em mãos do editor Bernard Fallois e legado à Biblioteca Nacional da França depois da sua morte, em 2018. Os textos reunidos em mais de sete dezenas de páginas datam de 1908, quando o escritor francês começava a escrever o grande romance que o fez entrar para o rol dos seletos que ampliaram a forma romanesca ocidental. Parte do material, inclusive, foi aproveitada na escrita de Em busca do tempo perdido, tal como destaca a editora Gallimard, responsável pela publicação. Já em 2019, a editora Fallois havia publicado Le Mystériux Correspondant et autres nouvelles inédites ― uma edição com textos que foram descartados por Proust quando publicou seu primeiro livro em 1895.
 
DICAS DE LEITURA
 
1. Sol artificial, de J. P. Zooey. Este nome apareceu primeiro como um pseudônimo inspirado numa personagem de J. D. Salinger. Mas, não foi por isso que seu livro de estreia chamou atenção de grande parte da crítica e dos leitores em seu país. Foi a galeria de personagens inusitadas presas a circunstâncias existenciais numa era marcada pela onipresença da tecnologia. Antes de chegar ao Brasil, o livro do escritor argentino já circulava por aqui de alguma maneira: em 2009, foi adaptado para o teatro por Luiz Felipe Reis. Traduzidos por Bruno Cobalchini Mattos, os contos radicais de Zooey são um exemplo do vigor criativo de uma literatura que não nos deixa de surpreender. Sol artificial foi publicado aqui pela DBA Editora.
 
2. Jean Santeuil, de Marcel Proust. Agora em 2021, passam-se, como lembrado noutra passagem deste boletim, o 150º aniversário do escritor francês, marco na literatura francesa e ocidental depois de Em busca do tempo perdido. E chega às livrarias nesta semana um livro que já apareceu há alguns meses numa edição outra do BO Letras 360º. Trata-se do primeiro romance de Proust; começou a ser escrito em 1895 e nunca chegou a ser concluído. Mesmo assim, o livro foi publicado três décadas depois da morte do escritor. Espécie de romance de formação, a narrativa acompanha as memórias da infância, os anos de adolescência e a transição para a vida adulta da personagem que dá título ao livro. É uma boa porta para os que ainda, por algum medo, não se aventuraram em avançar sobre a obra máxima de Proust. A tradução é de Fernando Py e é publicada pela editora Nova Fronteira.
 
3. Vermelho fogo, de Regina Azevedo. O nome da poeta aparece na antologia As 29 poetas hoje, organizada por Heloisa Buarque de Hollanda e recomendada por aqui na edição anterior deste Boletim. Mas, nem precisava. Marcelino Freire diz bem quando apresenta a poeta como uma voz que nasceu pronta. E tem se aperfeiçoado desde sua estreia. O livro aqui recomendado é o quarto título de Regina e reúne poemas escritos entre 2017 e 2020 com temas que vão da própria escrita ao amor, da angústia ao desejo de luta.
 
 
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
 
1. A revista dirigida por Fernando Pessoa e Ruy Vaz está agora disponível online.

O período fui curto. A Athena ― Revista de Arte durou menos de um ano. Pensada como uma publicação mensal, saíram cinco números entre outubro de 1924 e fevereiro de 1925. Foi neste veículo que circularam trabalhos nas artes plásticas de autores como Almada Negreiros e na literatura como Mário de Sá-Carneiro (publicações póstumas), Luiz de Montalvor, Raul Leal e Mário Saa. Nele, Fernando Pessoa expandiu a publicização dos trabalhos seus (incluindo a tradução de escritores estadunidenses, como Edgar Allan Poe) e dos seus heterônimos; encontra-se na Athena, por exemplo, o “Livro primeiro” das Odes de Ricardo Reis, “O guardador de rebanhos” e “Poemas inconjuntos 4 e 5”, de Alberto Caeiro e textos ensaísticos de Álvaro de Campos, como “Apontamentos para uma estética não-aristotélica”. Todo este material fica agora disponível online através neste endereço. A página disponibiliza outros documentos de arquivo: manuscritos relacionados ao contexto de publicação da revista e o fac-similar da primeira entrevista de Fernando Pessoa veiculada no Diário de Lisboa de 3 de novembro de 1924 que trata sobre o projeto da Athena.

2. Em 2013, a TV Pública da Argentina em parceria com a Biblioteca Nacional, transmitiu um curso ministrado por Ricardo Piglia acerca da vida e obra de Jorge Luis Borges. São cinco horas divididas em três encontros nos quais o escritor discorre e amplia leituras sobre a obra de Borges. O material está disponível no YouTube e foi transcrito online na revista Penúltima. Aqui 

3. Neste 13 de fevereiro de 2021 passa-se o 90.º aniversário de José Lino Grünewald. Integrante do Grupo Noigandres, formado pelos criadores da Poesia Concretista, ele é autor de vasta obra, incluindo ensaios e poesia. No blog da revista 7faces, alguns dos seus poemas. 
 
BAÚ DE LETRAS
 
1. Ainda sobre aniversariantes. No dia 10 de fevereiro passou-se o aniversário Bertolt Brecht. Reconhecido como dramaturgo, pelas contribuições com a inovação do teatro moderno, foi também autor de prosa e poesia. Recordamos três posts no Letras sobre o criador e sua obra: a) este breve perfil biográfico; b) aqui, a relação da obra de Brecht com o cinema; c) e o este texto sobre o episódio de perseguição e censura nos Estados Unidos, país para onde havia se mudado depois de um longo périplo de exílios devido a ascensão do nazismo no seu país natal.

2. No domingo, 14 de fevereiro de 2021, quem alcança o 90.º aniversário é outro nome da poesia concretista: Augusto de Campos. Na semana seguinte, o blog publicará um texto sobre o poeta que segue inovando ao ampliar a ruptura das convenções da poesia. Mas, aqui está a tradução de um texto que ressalta o lugar de elevada importância de Augusto de Campos para a poesia contemporânea.

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