Boletim Letras 360º #638


Cristina Peri Rossi. Foto: Cristina Gallego



LANÇAMENTOS
 
Dois livros apresentam a escritora uruguaia Cristina Peri Rossi, um dos principais nomes da literatura de língua espanhola do nosso tempo, Prêmio Cervantes em 2021.
 
1. De um lirismo contundente, seu primeiro livro de poemas, Evoé, lançado em 1971, Peri Rossi causou escândalo ao explorar o erotismo lésbico. No ano seguinte seus livros foram censurados e seu nome foi proibido nos meios de comunicação em seu país. Em outubro de 1972, às vésperas do golpe que implantaria a ditadura militar no Uruguai, fugiu para a Europa e exilou-se em Barcelona, onde vive até hoje. Consciente de que “O poeta não escreve sobre as coisas/ senão sobre o nome das coisas”, criou uma obra multifacetada, não dogmática, atravessada pelos temas do exílio, do desejo — em suas múltiplas dimensões — e por um anseio constante de transgredir toda ordem estabelecida pelo sistema patriarcal. A antologia Nossa vingança é o amor reúne — em edição bilíngue, com seleção e tradução de Ayelén Medail e Cide Piquet — 150 poemas de seus dezoito livros de poesia, além do discurso da autora para o Prêmio Cervantes e de um posfácio assinado por Ayelén Medail. Livro sai pela Editora 34. Você pode comprar o livro aqui.
 
2. A insubmissa é o romance de formação autobiográfico de Cristina Peri Rossi, premiada autora uruguaia e uma das mais proeminentes escritoras de língua espanhola. Nele, acompanhamos sua infância e juventude, contadas a partir da estranheza e da perplexidade diante de um mundo sempre em conflito com os seus desejos: usar calças, não comer animais, ter uma biblioteca, escrever, amar outras meninas. Através de experiências familiares, fabulações e do tempo de um dolorido amadurecimento, se desenha uma personalidade contestadora e determinada a viver os seus desejos mais profundos a despeito das interdições impostas ao comportamento e ao corpo de uma mulher. Tradução e posfácio Anita Rivera Guerra; publicação da Bazar do Tempo. Você pode comprar o livro aqui.
 
No ano do centenário de Dalton Trevisan (1925-2024), Rogério Faria Tavares reuniu 13 dos principais autores brasileiros contemporâneos para prestar homenagem ao vampiro de Curitiba.
 
Noemi Jaffe, Adelaide Ivánova, Luís Henrique Pellanda, Veronica Stigger, Marcelino Freire, Cristhiano Aguiar, Ana Elisa Ribeiro, Luci Collin, João Anzanello Carrascoza, Rogerio Pereira, Mateus Baldi, Carlos Marcelo e Caetano W. Galindo colocam Dalton para “viajar” pelo Brasil, seja por uma espelunca em Campina Grande ou pela cena literária de Belo Horizonte, ou mesmo em sua Curitiba natal, que parece indecisa entre seu passado provinciano e seus sonhos de modernidade. O vampiro está em todo lugar, com seus caninos afiados, para colecionar os traumas, as obsessões e as taras de uma sociedade insone e desigual. Os elefantes viriam pela manhã é a prova da enorme sombra que a obra de Dalton lançou na história da literatura do Brasil. E como aponta a crítica Eliane Robert Moraes: “Dalton Trevisan tem realmente o tamanho do mundo — e não é por outra razão que seu legado permanece para sempre vivo”. Publicação da Autêntica. Você pode comprar o livro aqui.
 
O novo título na Coleção Reserva Literária, projeto conduzido pela editora laboratório Com-Arte e Edusp.
 
Inicialmente publicado em 1922, como folhetim, no jornal O Paiz, o romance Uma paixão, de Chrysanthème, acompanha Maria Luísa, uma jovem que se vê em um dilema entre o desejo e a moralidade ao se apaixonar pelo cunhado Maurício, que vivia um casamento difícil com a meia-irmã da protagonista. A narrativa cotidiana, que se passa no Rio de Janeiro no início da década de 1920, é atravessada por debates feministas que abordam a luta por uma maior liberdade feminina no período e, principalmente, questionam o matrimônio como o principal ideal para a mulher. Nesta nova edição do romance, recupera-se cuidadosamente uma obra que, apesar de ter tido uma quantidade relevante de leitores em seu tempo, ficou em grande parte esquecida por ter sido considerada “escandalizante” pela crítica da época. Você pode comprar o livro aqui.
 
Neste segundo volume, os mosqueteiros abrem passagem para Louise de la Vallière, uma jovem dama de honra que conquista corações e vive as armadilhas do amor em um cenário político turbulento.
 
Traduzido pela primeira vez no Brasil, O visconde de Bragelonne, a tão aguardada última parte de Os três mosqueteiros, é repleta de conflitos e mudanças repentinas. Em um cenário onde o destino das nações está em jogo e cada vez mais afetado pela lógica burguesa em ascensão, D'Artagnan, Porthos, Aramis e Athos se sentem cada vez mais sem lugar. Neste segundo volume, a jovem Louise de La Vallière, considerada “a verdadeira heroína dessa história” e grande paixão de Raoul, rouba a cena numa trama centrada nos amores e intrigas por poder na corte em crise de Luís XIV. Apaixonada pelo rei, os encontros e desencontros amorosos entre Louise e Luís IX encenam disputas de poder e ambições que descortinam o quanto as paixões impactam nos bastidores políticos e militares da França. Com um tom mais romântico, mas sem renunciar aos típicos duelos, aventuras e reviravoltas dramáticas que marcam a saga, Dumas constrói um protagonismo feminino em toda sua força bela e trágica em uma época dominada pelo poder dos homens. Tradução de Jorge Bastos; publicação da editora Zahar. Você pode comprar o livro aqui.
 
Nesta aguardada coletânea de contos inéditos, a escritora argentina Samanta Schweblin, um dos maiores nomes da ficção contemporânea latino-americana, reitera seu domínio da narrativa breve com seis histórias que já nascem clássicas.
 
Em todas as histórias reunidas em O bom mal, personagens vulneráveis e profundamente humanas têm suas vidas transformadas de modo irreversível quando confrontadas com situações inquietantes que irrompem onde menos se espera: em plena ordem cotidiana. Discípula de Edgar Allan Poe na arte da construção atmosférica, Schweblin sugere mais do que afirma e, com isso, nos conduz a um clima de alta voltagem premonitória. Ao adentrar seu universo, sabemos que basta um ínfimo detalhe para que a tragédia se anuncie e o familiar se torne estranho, revelando-se toda a fragilidade do nosso pacto com o real. Como afirmou o escritor espanhol Enrique Vila-Matas, “há um antes e depois” da leitura de Schweblin, restando “a lembrança de algo que nunca nos deixará”. Os contos dão atenção a personagens que frequentemente não têm espaço na literatura. É o caso dos animais ― o coelho em “Bem-vinda à comunidade”, ou o cavalo de “Um animal fabuloso” ― e das mulheres mais velhas, inesquecíveis, de “William na janela” e “A mulher de Atlántida”. Sem sociologizar, Schweblin enfoca os atípicos (“O olho na garganta”) e outros aspectos de marginalidades sociais, como as atitudes do rapaz desajustado de “O Todo-Poderoso faz uma visita”. Talvez por isso as seis histórias deste livro sejam a um só tempo trágicas e venturosas, permeadas por culpa, solidão e luto, mas também por laços de família, amor e saudade. Através do insólito que desorganiza a vida, tudo se passa conforme o título anuncia: o mal é um bem necessário. Ou, ainda ― porque nas narrativas nada é o que parece ―, a bondade pode ser maléfica. Publicação da editora Fósforo. A tradução é de Livia Deorsola. Você pode comprar o livro aqui.
 
Autor de uma vasta obra que transita entre o romance e o ensaio, vencedor do Prêmio Goncourt em 1992, Patrick Chamoiseau é hoje uma das vozes mais expressivas e politicamente engajadas da literatura francesa. Livro de contos marca sua estreia entre os leitores brasileiros.
 
Herdeiro da tradição antilhana de Aimé Césaire e Édouard Glissant, o escritor martinicano, natural de Fort-de-France, se interessa por formas culturais e estéticas de sua ilha natal, em especial a oralidade poética das narrativas crioulas transmitidas por contadores populares. Um dos principais teóricos do movimento da “crioulidade”, sua escrita reflete a complexa realidade linguística e cultural caribenha, se conectando ainda às dinâmicas globais da afrodiáspora e da decolonialidade. Contos dos sábios crioulos, seu primeiro livro de narrativas curtas publicado no Brasil, remonta ao período escravagista das Antilhas. Associando elementos das culturas africana e europeia, e apresentando personagens humanos ou sobrenaturais, estas dez histórias dão voz a um povo que busca driblar a fome, o medo e a vigilância colonial, ao mesmo tempo em que, por desvios e astúcias, transmitem sua mensagem também aos senhores. Nessas narrativas de resistência, por vezes recriações da cultura oral popular, o “grito alçado das plantações” — retomando as palavras de Edimilson de Almeida Pereira no posfácio deste volume — ecoa aqui renovado, com a força de um poeta e pensador cuja matéria-prima, a linguagem, é forjada com precisão e criatividade sem iguais. Publicação da Editora 34. Você pode comprar o livro aqui.
 
Luiz Schwarcz reconstitui uma vida de amor ao livro e trata da capacidade única desse objeto de atravessar o tempo pela memória.
 
A quem pertencem as páginas de um livro? Se autores dominam o espaço com suas palavras, as margens em branco e as entrelinhas são o lugar real e simbólico em que leitores estabelecem uma conversa única com o texto, diálogo secreto e silencioso que lhes permite manifestar suas subjetividades. Dentre os possíveis leitores de um livro, o editor surge como o primeiro deles, numa tarefa delicada, privilegiada e discreta. Combinando ensaio e memórias, Luiz Schwarcz traz essas e outras reflexões para tratar de sua experiência como fundador e editor da Companhia das Letras, além de lembrar pessoas que foram essenciais ao longo de sua trajetória, como Caio Graco Prado, José Paulo Paes, Paulo Francis, Susan Sontag, Rubem Fonseca, Amos Oz, Oliver Sacks, Jô Soares, José Saramago e Jorge Zahar. Ao transpor as vivências passadas para o curso da escrita presente, o editor-autor presta homenagem àqueles que influenciaram seu trabalho e realiza uma imersão sensível no mundo dos livros. O primeiro leitor é publicado pela Companhia das Letras. Você pode comprar o livro aqui.
 
REEDIÇÕES
 
Nova edição da reunião de contos que se consagrou como uma das obras mais admiráveis do período da contracultura.

Lançado em 1975, O ovo apunhalado reúne 21 contos de uma das vozes mais contundentes e apaixonantes da literatura brasileira. Escrito entre 1969 e 1973, o segundo livro de Caio Fernando Abreu retrata de modo singular a violência, a fragilidade, as paixões e os anseios de personagens que têm como pano de fundo o Brasil dos anos de chumbo. No posfácio para esta nova edição publicada pela Companhia das Letras, Carol Bensimon observa o modo como o autor retrata o arco que começa na adolescência e segue até a vida adulta. Para ela, este livro foi escrito por “um Caio atormentado, cheio de dúvidas, visceral, autêntico, às vezes nostálgico, mas sempre fiel a seus desejos. Intenso”. Você pode comprar o livro aqui.
 
RAPIDINHAS
 
Pela primeira vez no Brasil, Marvel Moreno. A editora Moinhos prepara a estreia da escritora colombiana, nome singular na literatura latino-americana do século XX, com a publicação de dois romances: Em dezembro chegavam as brisas e O tempo das amazonas. A tradução é de Silvia Massimini Felix.
 
Nova tradução do único romance de Bertolt Brecht. Conduzida pela escritora Carla Bessa para a editora Lume, sai em maio Romance de três vinténs. A narrativa acompanha um criminoso conquistador que se casa com a filha do rei dos mendigos.
 
Ethan Frome. A mesma casa publica também neste mês o romance considerado por muitos a obra-prima de Edith Wharton e da literatura estadunidense do século XX. Com tradução de José Geraldo Couto.
 
Tom Ripley repaginado. A editora Intrínseca aproveita o sucesso alcançado com o novo projeto gráfico para a principal obra de Patricia Highsmith e apresenta os volumes 4: O garoto que seguiu Ripley e 5: Ripley debaixo d’água.
 
Seja Breve. É o nome de uma nova editora capitaneada por Cadão Volpato e Bernardo Ajzenberg. Na estreia, saem cinco títulos: Que não se repita, de Eugênio Bucci; O príncipe do boxe, de Fabio Altman; Lugares para chorar no Recife e outros, de DJ Dolores; Despaixão, de Paula Lopes Ferreira e Notícias do trânsito, de Cadão Volpato.
 
DICAS DE LEITURA
 
Na aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste boletim, você tem desconto e ainda ajuda a manter o Letras.
 
1. Criação, de Gore Vidal (Trad. Newton Goldman, Nova Fronteira, 672p.) Ciro, o neto do profeta persa Zoroastro, parte como embaixador em busca de novas riquezas e respostas para suas inquietações. A edição do monumental romance aqui recomendada tem apresentação de Carlos Heitor Cony. Você pode comprar o livro aqui
 
2. A escravidão na poesia brasileira: do século XVII ao XXI, org. Alexei Bueno (Record, 714p.) Para ampliar o seu repertório quando este tema não formou parte apenas da poesia de Castro Alves. Gregório de Matos, Tomás Antônio Gonzaga, Machado de Assis, Augusto dos Anjos, Murilo Mendes, Carlos Drummond de Andrade estão entre os vários nomes da poesia brasileira selecionados nesta antologia que registra uma marca indelével na história da formação brasileira. Você pode comprar o livro aqui
 
3. Objeto cintilante: história sulfúrea, de André Timm (Faria e Silva, 176p.) Através de três personagens, este romance examina a vida de uma família em que a aparente paz fixada pela entrega dos seus membros à vida virtual explode num registro perturbador e comovente de como a tecnologia tem condenado todos a uma escravidão interminável. Você pode comprar o livro aqui
 
VÍDEOS, VERSOS E OUTRAS PROSAS
 
Em março deste ano, conforme relembramos na edição n.362 deste Boletim, passou-se os 100 anos do nascimento de Flannery O’Connor. Nesta semana, editamos em nossa conta no Instagram uma post com a recomendação de três dos seus livros editados no Brasil. 
 
BAÚ DE LETRAS
 
Ainda que sua obra só agora desponte no Brasil, Cristina Peri Rossi não é uma desconhecida para os leitores do Letras. Em 2022, traduzimos este texto publicado inicialmente no jornal El País e dedicado ao convívio amoroso entre a escritora uruguaia e Julio Cortázar.
 
Neste domingo celebramos por aqui o Dia das Mães. Aproveitamos a data para relembrar esta lista apresentada em 2017 aqui: “Mães de tinta e papel” recomenda onze títulos que lidam de maneira diversa com a figura da mãe.
 
DUAS PALAVRINHAS
 
Só quem está vivo consegue escutar a voz do mundo, entender sua linguagem, seu rumor, os ermos e luminescências de suas palavras e por estar vivo é que consegue responder.
 
— Em O som do rugido da onça, de Micheliny Verunschk

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* Todas as informações sobre lançamentos de livros aqui divulgadas são as oferecidas pelas editoras na abertura das pré-vendas e o conteúdo, portanto, de responsabilidade das referidas casas.

 

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