Helio Pellegrino




Helio Pellegrino é mineiro, de Belo Horizonte. Nasceu no dia 05 de janeiro de 1924. Quatro anos mais tarde conhece ninguém menos que Fernando Sabino (escritor que outro dia falamos sobre ele por aqui); Helio torna-se amigo de Sabino, ainda no jardim-de-infância. Amizade essa que seria levada para a vida toda.

É em 1939 que começa a escrever seus primeiros poemas, fortemente inspirado pelas leituras de Carlos Drummond de Andrade. O estreitamento dos laços de amizade com outra leva de escritores mineiros em 1940, tais como Otto Lara Resende e Paulo Mendes Campos é motivo para a formação do que na cena literária brasileiro ficou conhecido como os Quatro Mineiros. Por essa época ele publica um poema, o seu primeiro, no jornal O Diário. Mas não é ainda como literatura que Hélio passa a viver somente; em 1942 incentivado pela família ingressa na Faculdade de Medicina, também na capital mineira e vai ao curso contra sua vontade, porque segundo ele dizia entre os amigos, queria mesmo era fazer Filosofia.

Em 1943, já decidido pelo ramo da Psiquiatria, Pellegrino viaja com Fernando Sabino a São Paulo; desta viagem conhece Mário de Andrade. No ano seguinte, ao lado de Wilson Figueiredo, Simão Vianna da Cunha Pereira, Otto Lara Resende, Francisco Iglésias e Darci Ribeiro, edita o combativo jornal clandestino Liberdade. É um dos fundadores da União Democrática Nacional - UDN. Foi depois de participar do I Congresso de Escritores, no Teatro Municipal de São Paulo que passa a colaborar regularmente com o suplemento de literatura O diário, no Rio e chega a concorrer pela UDN ao cargo de Deputado Federal.

Depois do contato com o poeta Murilo Mendes, publica um único número da revista Nenhum; ao lado do grupo Wilson Figueiredo, Autran Dourado e Sábato Magaldi, publica num livreto dois poemas, "Poema do príncipe exilado" e "Deixe que eu te ame". Mais tarde, em 1953, Pellegrino inicia análise didática com Iracy Doyle e passa a trabalhar como redator do jornal O Globo. É por essa época também que colabora no semanário Flan, onde conhece o escritor Nelson Rodrigues. Depois da morte de seu companheiro de análise didática, Pellegrino reinicia nesse trabalho apenas mais tarde, em 1958, agora ao lado de D. Catarina Kemper, com o propósito de se formar psicanalista, o que ocorre em 1963.

De 1966 até 1968, Hélio colabora com o jornal Correio da Manhã - point de vários nomes da literatura. Nesse ano de 1968 participa de um congresso em Santigo, no Chile, onde apresenta a sua tese O pacto edípico e o pacto social, tese esta de grande repercussão no meio psicanalítico. Com a instituição do AI-5, Pellegrino chega a ser, em 1969, preso por dois meses acusado de ser líder comunista.

Em 1978, publica nos "Ensaios de Opinião" o volume 7, A dialética da tortura: direita versus esquerda. Por esse ano incia sua colaboração de dois anos em O Pasquim. No ano seguinte colabora por cinco meses no Jornal da República. Ainda na leva das colaborações, mais tarde, passa a colaborar por três anos, inclusive, no Jornal Folha de São Paulo; quinzenalmente na página 11 do Jornal do Brasil.

No ano de 1985, Lya Luft e Hélio Pellegrino se encontraram num congresso de escritores em São Paulo. Conheciam-se apenas de nome; depois, por cartas. Nove meses mais tarde, iniciava-se o casamento entre os dois mitos. Uma mulher disposta a começar tudo de novo. Um homem "em sua melhor fase; fascinado pelo mistério: de Deus, da vida, das pessoas, da natureza". O casamento acontece em 1986. Dois anos mais tarde, o escritor morre.

Depois de doados seus manuscritos, em 1993, e organizados por Humberto Wernek, é publicada uma seleção de poemas pela Editora Rocco Minérios domados (amostra abaixo). Cinco anos mais tarde a coleção Perfis do Rio, da Editora Relume Dumará, lança Helio Pellegrino, a paixão indignada, de Paulo Roberto Pires. Em 2003, a Editora Planeta publica o livro Meditação de Natal. Noutro ano, a Editora Bem-Te-Vi publica Arquivinho de Helio Pellegrino. Sai, também, pela editora Planeta Lucidez Embriagada, organização de Antônia Pellegrino, neta do autor.

Três poemas de Helio

ALGUMA COISA

Para Guilhermino César

Alguma coisa resta: um gesto
nos tendões da mão engelhada.
Uma efusão inacabada
na ferrugem da pele-resto.

Alguma coisa que é da raça
dos minerais, insubornável,
além do amargo e do caroável,
do que perdura — e do que passa.

Alguma coisa inscrita: um grito
no fulgor do dedo anular.
Um puro incêndio sem queimar
— como um segredo afinal dito.

Porto Alegre, 8/11/86 


MAR ALTO

Esta água é todas as águas,
sem porto, nome ou naufrágio.
Rendada de espuma ao vento,
sem dor nem contentamento.

Esta água — lugar nenhum —
é perdição sem loucura.
Nela se dissolvem mágoa,
memória, tempo, aventura.

Sem lei nem rei, sem fronteiras,
além de verbo e silêncio,
esta é a pátria procurada:
incêndio de tudo  — nada.


A CEGUEIRA DE ÉDIPO

Caminha errante o velho rei da terra,
sangrando a cada passo o seu desterro.
Pesa-lhe luz demais, ausência de erro
e de noite — montanha que o soterra.

Cego de sua verdade, desenterra
do peito transfixado não o ferro
que o punge por inteiro, nem o berro
que lhe sobe das entranhas, enquanto erra.

Com sua garra terrosa de mendigo,
busca arrancar da carne não a morte
que o rodeia na treva, vinho forte

desde sempre provado. O desabrigo
que o atormenta é outro: sol candente
que vara a sua cegueira — e o faz vidente. 


*Via portal Releituras e Jornal da Poesia




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