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Dossiê James Joyce: peças para um retrato do artista (II)

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Viúvo a quase um ano, Joyce, por puro acaso, conheceu uma moça de vinte anos, filha de um pedreiro beberrão separado da mulher, que se mudara para Dublin. Nora Barnacle estava longe de Joyce em termos de formação, abandonara os estudos ainda aos treze anos. Ainda assim, nasce entre os dois um relacionamento que duraria para todo o resto da vida. Três meses depois de se conhecerem, ambos decidiram sair da Irlanda, fixaram-se em Pola (Croácia hoje) e depois em Trieste (Itália hoje), cidades estas que faziam parte da Áustria-Hungria. James Joyce e Nora Barnacle. Instalados em Trieste, Joyce passa a trabalhar numa escola como professor de inglês. Já por aí, Nora engravidara. Perdida, por está num país em que não tinha noção nenhuma do idioma e ainda com o hábito de beberrão de Joyce, Nora teve de se resignar. Estado que alivia quando da chegada de George Joyce, em 1905, que apesar das alegrias, trouxe mais complicações financeiras. Na esperança de arranjar alguma estabilidade, ...

Dora Ferreira da Silva

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Por Pedro Fernandes Há duas coisas que como acadêmico de Letras tenho vício, duas não, três: da biblioteca, fuçar o que me pareça novidade, conhecer daquilo que ninguém ainda falou - pelo menos pra mim; da internet, buscar leituras interessantes sobre literatura (diria que semelhante atividade ao primeiro vício) e, por fim, ler - uma reunião dos dois outros vícios. Recentemente tenho começado alguns incursões pelo universo poético, colocando por um instante a prosa na estante - se bem que não funciona bem assim, há mesmo um intercalar de prosa e poesia constante. Mas, o fato é que a metade maior do tempo tenho ido por esse universo do poema, resultado, agora, de um minicurso que ministrarei com uma minha amiga de versos no curso de Letras. O curso sai, acredito, em setembro. Somando-se estas duas atividades, os vícios e o estudo da poesia para o minicurso, encontro com a obra de uma escritora até agora uma desconhecida para mim: Dora Ferreira da Silva. Uma poeta, diria, sem d...

Dossiê James Joyce: peças para um retrato do artista (I)

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Quando a obra clássica de Joyce chega ao Brasil é por volta de 1966, por iniciativa de Enio Silveira. Trata-se da edição traduzida pelo filólogo, escritor e acadêmico Antonio Houaiss. Em 2005, chega a tradução feita por Bernardina Pinheiro, uma iniciativa sua, que se dedicou a essa tarefa ao longo de mais de sete anos, tudo para atingir um objetivo que ao seu modo de ver não se via na edição do Houaiss: recuperar o tom da linguagem coloquial do romance, uma de suas principais características. A tradutora concordava que a versão de Houaiss era bastante rebuscada. Bem, se este objetivo foi ou não logrado, isso é outra história porque a verdade é que Ulysses , tal como um Grande sertão: veredas , de Guimarães Rosa,   apresenta dificuldades até para os leitores na sua língua original. *** James Joyce nasceu em 1882, numa Irlanda que se debatia com as conseqüências de uma longa história de domínio inglês, fortalecido a partir do século XVI. Além do calhamaço de divisões políti...

João Cabral de Melo Neto: influências de Sevilha e o lirismo contido

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" Há que sevilhizar a vida . Há que sevilhizar o mundo ." (J.C. de Melo Neto) Em 1956, João Cabral é novamente removido para Barcelona, agora como cônsul adjunto e autorizado a morar em Sevilha para fazer pesquisas no Arquivo das Índias. Foi então que Cabral se descobriu na cidade e descobriu totalmente a cidade. Saiu dos bairros turísticos, dos grandes monumentos, que representam um Sevilha mais aparente e mais exterior e foi para a Sevilha íntima que não se oferece facilmente. Caminhou por todos os bairros populares como Macarena e Santa Maria la Blanca descobrindo seus becos, tabacarias e praças; participou de tertúlias no bairro taurino de São Bernardo onde sempre via os toureiros como os irmãos Pepe Luiz, Antonio e Manolo Vasquez; conheceu os bailadores de flamenco do bairro cigano de Triena; fez longos passeios pela Calle Ciertes até La Campana e passou a traduzir todo esse mundo fascinante em sua poesia. "Sevilha é uma cidade íntima. ...

João Cabral de Melo Neto: o ambiente cultural, as primeiras poesias e o poeta diplomata

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Apesar de ser primo, pelo lado paterno, do poeta Manuel Bandeira e, pelo lado materno, do escritor sociólogo Gilberto Freire, até os quinze anos de idade João Cabral não havia demonstrado interesse pela literatura, mas sim pelo futebol. Em 1935 jogava pelo juvenil do América, seu time de devoção. Depois tornou-se campeão pernambucano ao participar do Campeonato Juvenil pelo Santa Cruz. O interesse pelo poesia só viria em 1936 quando descore uma antologia de poetas modernos e entra em contato com os poemas de Manuel Bandeira, Jorge de Lima e Carlos Drummond de Andrade. Os anos trinta foram de especial importância para a literatura brasileira e caracterizou-se pela literatura regionalista de Graciliano Ramos e Guimarães Rosa e pela poesia de Cecília Meirelles e do mineiro Carlos Drummond de Andrade. O movimento modernista de 1922, que insurgiu contra o parnasianismo, criou espaço para o aparecimento desta importante geração de escritores. Quem se iniciava na literatura na dé...

João Cabral de Melo Neto: o poeta e a poesia visual

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Falar da estética poética de João Cabral é retomar a didática classificação dele enquanto poeta precursor do Movimento Concretista no Brasil. Sem dúvidas, como dissemos noutra post, a poesia cabralina é um marco para a literatura brasileira, porque sua obra desencadeia uma revolução formal das mais importantes na história da poesia em nosso país, representando a maturidade das conquistas mais radicais do século XX. Opondo-se ao principal curso da poética nacional que sempre fora o do sentimental, retórico, ornamental, João Cabral de Melo Neto constrói uma poesia não-lírica, não-confessional, presa à realidade e dirigida ao intelecto. Apesar de pertencer cronologicamente à Geração de 45, formada por nomes como Péricles da Silva Ramos, Geraldo Vidigal, Ciro Pimentel entre outros, João Cabral não se enquadra esteticamente nesta geração. A Geração de 45 propunha um retorno às formas tradicionais do verso, como o soneto e negava o experimentalismo dos Modernistas de 22. João Cabral é ...