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A rosa do povo, de Carlos Drummond de Andrade

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Por Pedro Fernandes Fac-similar da 1ª edição de A rosa do povo . A rosa do povo é quase sempre lido por grande parte da crítica literária brasileira como um dos mais importantes da bibliografia de Carlos Drummond de Andrade; extensa bibliografia, por sinal. Além da poesia, sabemos que escreveu em quantidade semelhante, crônica. E a posição de cronista, o espectador do mundo, quase sempre é convertida em matéria de poesia. Apesar de não conhecer integralmente a obra do poeta mineiro e nem (e isso nunca aconteceria ainda que vivesse um século para a leitura de poesia) a literatura do gênero dos grandes nomes da república mundial das letras, ousaria colocar este livro no rol dos mais importantes para a poesia brasileira e, porque não me contento com bairrismos, entre os mais significativos da poesia do século XX. Sobre o reconhecimento do poeta como um dos mais interessantes para a poesia contemporânea no mundo, aposto que seja mesmo apenas uma questão de tempo; é preciso reconhecer ...

Conferência sobre o romance e o filme “Ensaio sobre a Cegueira”

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Por Pedro Fernandes Capa da edição brasileira de Ensaio sobre a Cegueira  e cartaz de divulgação de Blindness , adaptação do romance de José Saramago feita pelo cineasta Fernando Meirelles. Ensaio sobre a Cegueira é, certamente, uma das mais potentes alegorias sobre a atual condição da civilização Ocidental ou é uma leitura pungente sobre o acelerado processo de degradação dessa civilização ao longo de sua história. Sim, esta é uma das maiores civilizações que habitaram o planeta, mas, no ritmo em que se encontra, não tardará muito seu fim. Sobretudo porque temos exercido em grande nível a incapacidade de ver o que está nas aparências e vimos aos poucos nos tornando também no aparente. Publicado em 1995, tão logo José Saramago saiu de Lisboa para ir morar na ilha de Lanzarote, no arquipélago das Canárias, este romance é reconhecido pela crítica como um dos mais importantes da segunda metade do século XX. E, além de dizer tanto do que nos tornamos, é este um romance que deposita ...

Essa segunda língua que supomos

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Por Pedro Fernandes Recentemente esteve pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), onde cursei minha graduação e hoje curso mestrado, a professora Gladis Barrios, da Universidade de Tolima, Colômbia. Ela contava, na rápida conversa que manteve com os alunos do mestrado, dada a extensa agenda de compromissos na instituição, que, no seu país, os alunos de graduação são todos bilíngues; que em se tratando de mestrado e de doutorado os trabalhos de conclusão dos respectivos cursos, dissertação e tese, devem ser defendidos em versões na língua mãe, o espanhol, e na língua estrangeira, o inglês. O país, entretanto, padece de uma taxa de 70% de analfabetos.  Pergunto, para que serve tanto rigor por parte das instituições diante dessa lastimável estatística. Daí, aplica-se bem aquele ditado popular de que tudo demais é veneno. Mas, a questão que me leva a essa pergunta está num outro fato: o dela ter mencionado, e mencionado bem, do atual poder de que o Brasil dispõe frent...

O Homem Rlefante, de David Lynch

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em cena Anthony Hopkins e John Hurt O Homem Elefante conta a história de Jonh Merrick (John Hurt), um homem de aparência muito desagradável, com o corpo todo deformado devido a uma doença, neurofibromatose múltipla. Seu comportamento, no entanto, é de um cavalheiro contido, adequado à época e ao local onde viveu: a Inglaterra da era vitoriana. Em virtude de suas feições causarem horror, o que lhe restou na sociedade foi trabalhar em circos exibindo-se como monstro. Com muita dificuldade de falar, também por causa da doença, era considerado um débil mental. No entanto, resgatado pelo médico Frederick Trevez (Anthony Hopkins), consegue se desenvolver e se integrar um pouco mais ao mundo. No hospital, conhece a senhora Kendal (Anne Bancroft), uma conhecida atriz, que o ajuda a construir alguma autoestima. O filme é baseado nas memórias escritas (reais) do médico Frederick Trevez. O início da película, que explora as cenas de Merrick no circo, parecem a introdução de...

Arthur Miller, a consciência do teatro estadunidense do pós-guerra

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Por Juan Bravo “Considero o teatro um negócio sério, que faz ou deveria fazer o homem mais humano, isto é, menos sozinho”. São palavras de Arthur Miller, um dos grandes dramaturgos do século XX – “o melhor”, escreveu o tcheco Vaclav Havel. Nasceu em Nova York, a cidade que serviu de inspiração para toda sua obra, no dia 17 de outubro de 1915.  Em seu legado figura um punhado de obras para o teatro que marcaram o futuro da cena internacional: “Todos eram meus filhos”, “A morte de um caixeiro-viajante”, “As bruxas de Salém”, “Um panorama visto da ponte”, “O preço”, as que deram origem ao roteiro do filme Os desajustados . O mesmo se pode dizer de sua vida pessoal, marcada pelas relações com figuras como Marilyn Monroe e com a fotógrafa Inge Morath. Arthur Miller é o “grilo falante” na consciência estadunidense do pós-guerra, um dos mais precisos dissecadores da alma humana e um hábil fabulador de histórias. Sua máquina de escrever se aloja na consciência como se...

Fernando Pessoa, o drama em gente

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Sinto-me múltiplo. Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas. — Fernando Pessoa Fernando Pessoa, 1928. Foto: Acervo Casa Fernando Pessoa.   O texto em epígrafe é só uma das muitas possibilidades de síntese sobre Fernando Pessoa, criador que viveu ficcionalmente todo o drama da modernidade, feito de negações ao princípio da unidade subjetiva e outras unidades. Se o amigo Mário de Sá-Carneiro sofreu puramente esse drama, figurado na singular imagem do sujeito preso no labirinto do qual nunca conseguiu sair, ele buscou encontrar saídas fazendo-se, para tanto, outros. A tentativa pode ter falhado, mas o que ela gerou contribuiu para uma revolução na literatura do século XX.   Fernando Pessoa é o poeta que antecipa (ou ressuscita, se considerarmos a inovadora atitude da poesia grega) a validade do texto com material de pura significação. Falseando-se em muitos findou p...