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Lincoln, de Steven Spielberg

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Por Pedro Fernandes Quando as identidades entram em crise é natural que os mantenedores do poder simbólico entrem em cena para – com os fragmentos – engessar coisa que ainda a sustente. Parece ser repetir pela enésima vez isso com os estadunidenses. Se em todos os setores há uma constante reafirmação do statos quo da potência responsável pelo provimento do bom andamento da ordem mundial, também no cinema, os reforços não passam despercebidos até do observador mais leigo. Evidentemente não ser isto algo inédito. Mas, as produções de meados de 2012 para início de 2013 – uma olhada na lista dos concorrentes ao Oscar de Melhor Filme será suficiente para entender – deram uma lapidada nos cacos e reforçaram cada uma à sua maneira as formas de bendizer o seu país. Lincoln , de Steven Spielberg é um deles. E não seria blasfêmia acreditar que este é o grande favorito ao Oscar de Melhor Filme, mesmo estando concorrendo com outras produções muito mais significativas e dispensa...

Anotações sobre o bom e o mau leitor

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Por Pedro Fernandes ilustração: Mateus Di Mambro Não é de hoje que andei pensando sobre as questões que vou enumerar a seguir: os que estão do lado da crítica têm certa facilidade para dizer se um escritor é bom ou ruim. Temos cá certas ressalvas que nos faz decidir por uma via ou por outra; com o tempo a prática se torna tão corriqueira que se torna técnica e somos mesmo capazes de dizer que um escritor é ruim sem nem mesmo sentar-se para ler integralmente algum escrito seu. Para a via contrária é impossível. E aí pode parecer que eu esteja caindo num paradoxo. Mas não. Há determinados fatores externos ao da leitura obrigatória e integral de um escritor que são definidores para dizer se ele é bom ou ruim, como a sua relação com a leitura, a sua forma de leitura do mundo, expressas em ocasiões como entrevistas, conversas informais etc. Mas, bons ou ruins escritores, não é sobre isso o que iremos tratar aqui. É que, da mesma forma que existem os bons e maus escritores haverá ...

Lorca entre marinheiros e máscaras

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Lorca com Pablo Neruda e outros amigos vestidos de marinheiro. Bueno Aires, 1934 Em seu livro  Lorca: The Drawings and Their Relation to the Poet’s Life and Work ,  Helen Oppenheimer analisa a figura do marinheiro em desenhos de Lorca e sua relação com sua escrita a título de verificar como na lide com a palavra o poeta traduz a natureza de sua identidade durante os anos de proximidade com Salvador Dalí. Na leitura, a autora ressalta o  caráter simbólico e útil da figura do marinheiro para a compreensão de jogo de representações identitárias. Oppenheimer lê o marinheiro como um símbolo de liberdade sexual, tanto no que se refere ao amor e à paixão quanto a liberdade criativa que em Lorca vê-se entrelaçada como uma forma de sua expressão sexual. Muitas vezes a palavra "amor" aparece nos desenhos com  marinheiros e eles podem servir para ilustrar essa associação vista pela pesquisadora. Há de se convir, entretanto, que o marinheiro não repres...

Ronald de Carvalho

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Cândido Portinari. Retrato de Ronald de Carvalho (detalhe), 1929. Exatamente num 15 de fevereiro de 1935, morreu, no Rio de Janeiro, o poeta Ronald de Carvalho. Talvez mais que um poeta, dada sua importância no trânsito diplomático entre Brasil e Portugal, onde passou a viver em 1914, tendo antes passado por Paris, onde estudou Filosofia e Sociologia e onde compôs seu trabalho de estreia, Luz gloriosa , com forte incidência da poesia de Paul Verlaine e Charles Baudelaire. Luz gloriosa foi ofertado, através de Luís de Montalvor, ao poeta Fernando Pessoa, que teceu uma breve apreciação ao livro e conselhos ao Ronald: Luz gloriosa “é dos mais belos que recentemente tenho lido. Digo-lhe isto para que, não me conhecendo, me não julgue posto a severidade sem atenção às do seu livro. Há em sei o com que os poetas fazem. De vez em quando a mão do escultor faz falar as curvas irreais da sua matéria. E então é o seu poema sobre o Cais e a sua impressão do Outono, e este e aquele verso, ca...

Só dez por cento é mentira

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Há várias maneiras sérias de não dizer nada mas só a poesia é verdadeira Manoel de Barros Apresentado no Festival de Cinema do Rio de Janeiro, Só dez por cento é mentira , roteirizado e dirigido por Pedro Cezar, é um original mergulho cinematográfico na biografia inventada e nos versos fantásticos do poeta sulmatogrossense Manoel de Barros. Na sinopse de apresentação do filme – elogiado pela crítica e premiado várias vezes em festivais como II Festival Paulínia de Cinema 2009 e o V Fest Cine Goiânia 2009 – entende-se que seja este um videodocumentário que “ultrapassa as fronteiras convencionais do registro documental. Utiliza uma linguagem visual inventiva, emprega dramaturgia, cria recursos ficcionais e propõe representações gráficas alusivas ao universo extraordinário do poeta”. O filme se constrói alternando sequências de entrevistas inéditas do escritor, versos de sua obra e depoimentos de “leitores contagiados” por sua literatura compondo, des...

Maurice, de James Ivory

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Por Pedro Fernandes O filme é de 1987; é uma adaptação de Maurice , de E. M. Forster e um dos que revelaram para o cinema o ator Hugh Grant, que dividiu o prêmio de Melhor Ator no Festival de Veneza, no ano seguinte. Talvez seja clichê dizer que estamos diante de uma narrativa sobre os limites do amor, sua existência e a superação deles. Maurice, depois de apresentado por Risley para participar de um dos clubes privados de discussões muito comuns nas universidades europeias de meados do século XIX, se aproxima de Clive Durham. A princípio, os dois desenvolvem uma amizade fora do comum; das amizades em que ambos são capazes de alterar suas rotinas e planos do dia para estarem juntos. A intimidade dos dois chega ao limite de se perceberem que, mais que a amizade, há entre os dois uma natureza variada de sentimentos, como desejo, paixão, amor carnal. Nesse instante instala-se o drama: a atitude de Maurice em assumir seu amor por Clive, o repúdio de Clive e depois a assunção ...