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Galveias, de José Luís Peixoto

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Por Pedro Fernandes Este romance de José Luís Peixoto é um rico painel de um Portugal profundo; aquele que se calhar só resiste – não com todas as cores – em Galveias. Este título é muito sugestivo, visto ser mais comum o leitor encontrar romances cujo nome é de uma personagem relevante para a narrativa e não o nome de um lugar; constatação esta que só nos faz concordar com uma linha de raciocínio: o espaço, não o único onde transcorre as ações das narrativas que enformam o romance, é a personagem principal. Não é o espaço único onde se passam as ações porque o escritor, mesmo embebido de certa verve realista e mesmo buscando desenhar figuras que são personagens de Galveias, acompanha aquelas que já ganharam as fronteiras fora da freguesia ou estão em trânsito pelas redondezas ou aí chegaram para firmar moradia, como é o caso da brasileira Isabelle, mineira emigrada para Portugal pela relação construída com uma portuguesa que lhe fez cair no mundo dos negócios com o co...

Das ficções e confissões radicais: "A gênese do Doutor Fausto"

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Por Alfredo Monte Após a Companhia das Letras ter colocado em circulação uma nova edição de  Doutor Fausto , seria bem oportuno o relançamento do livro que Thomas Mann publicou em 1949 sobre sua obra-prima: A gênese do Doutor Fausto 1 . Nele, o fato biográfico mais importante é uma intervenção cirúrgica delicada que o grande escritor alemão (então vivendo exilado nos EUA) sofre aos 70 anos. Após passar pela experiência, ele afirma: “O romance:  durante todas essas semanas ímpares e aventurosas, mantive-o próximo ao coração, fazendo na mente um rol de correções necessárias e diversos planos para o prosseguimento. Minha conduta de paciente exemplar, a ligeireza da minha recuperação, espantosa na minha idade, todo esse desejo de sobrevivência, essa verdadeira persistência em vencer a provação inesperada e tardia, não havia por trás disso tudo um secreto ‘Para quê?’ Não foi tudo a serviço da obra, não foi a partir do inconsciente que a tudo superei para er...

Franz Kafka e Milena Jesenská

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"As pessoas praticamente nunca me enganaram, mas as cartas sempre". A frase é de um conjunto de cartas de Franz Kafka pouco citado na história das missivas de escritores. São correspondências que ele manteve com Milena Jesenská. E quase todas estão tão carregadas de frases que são quase aforismos que a tentação é pegar um punhado delas à própria sorte e não dizer nenhuma palavra a mais. "O medo é verdadeiramente estranho, suas leis internas não as conheço, só conheço sua mão em minha garganta, e isso é realmente o mais horrível que já me aconteceu ou que jamais poderá ocorrer". Mas, há uma história que marca essa relação e que merece ser contada. O conjunto das cartas de Franz a Milena (as respostas de Milena a Franz estão desaparecidas) foram reunidas e publicadas originalmente em alemão ainda em 1952, pelas mãos de Willy Haas que por conta própria decidiu ocultar algumas passagens; em 1986, outra edição trouxe as missivas em sua versão integral e a...

Casa na duna, de Carlos de Oliveira

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Por Pedro Belo Clara Eis um nome de excelência do neo-realismo português. Dadas as anteriores discussões que neste espaço tivemos, sobre o autor e alguns dos seus trabalhos ( ver o final desta post ), a adjectivação não poderá constituir uma assombrosa surpresa. Apesar da obra publicada em prosa ser escassa, facto também agravado pelo precoce desaparecimento do autor, o seu nome será certamente um desses que adquirem uma dimensão somente justificada pelo génio que lhes assiste, sublinhado posteriormente no simples exercício material do mesmo.   Editado pela primeira vez em 1943, Casa na duna , um romance, poderemos dizê-lo, de “tenra idade”, apresenta-se como uma agradável surpresa aos olhos do leitor. Ainda que a versão tida por “definitiva” tenha surgido só em 1980, um ano antes da morte do autor, na sétima edição da publicação orientada pela Livraria Sá da Costa Editores, a narrativa encerra já linhas de notável maturidade. Carlos de Oliveira tinha apenas, ...

Boletim Letras 360º #141

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Salvador Dalí (1960-1?) A fundação responsável pelo arquivo do pintor divulga a descoberta de 11 fotografias inéditas. A aprovação, em junho deste ano, da lei que institui o 31 de outubro como o Dia Nacional da Poesia, levou-nos a um feito inédito: celebrar a data duas vezes em 2015. No antigo dia 14 de março e hoje. Quem nos acompanha no Facebook viverá um dia de celebração ao livro A rosa do povo . Justa escolha: 31 de outubro é também dia do aniversário de Carlos Drummond de Andrade, o autor do livro em questão, publicado em 1945. Por falar no poeta, ainda sorteamos dois exemplares de Nova reunião de poesia . Saiba tudo o que fazer para concorrer, aqui . Segunda-feira, 26/10 >>> Brasil: Todos querem saber da vida de Mário de Andrade. Outra biografia do poeta pode vir a público em breve Painel das Letras informa que com a mudança do acervo do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (IEB-USP) para o novo prédio concluída, documentos in...

O erótico que está em nós

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Por Pedro Fernandes Eliane Robert Moraes, organizadora da edição Antologia da poesia erótica brasileira Quando se fala em poesia erótica brasileira, o leitor deverá logo se lembrar de peças da poeta Hilda Hilst e da obra de Carlos Drummond de Andrade que casou certo reboliço na cena literária nacional quando publicada, O amor natural , livro que veio a lume em 1992, cinco anos depois da morte do poeta. Mas, o fato é que, de maneira diversa, toda obra poética terá, em alguma ocasião flertado com esse mistério que está numa dimensão mais acentuada da relação amorosa. O que tanto espanta é um enrubescimento do leitor, ou a censura desbragada praticada sobre textos dessa natureza, sobretudo, numa sociedade que se diz tão aberta para os desígnios do corpo ou mesmo uma sociedade que canta a plenos pulmões as letras malfeitas da música chula que reafirmam o poder do homem sobre a mulher ou rebaixa esta ao limite de objeto de disputa, coisa a ser usada ou movida à réde...