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Um planeta chamado Clarice Lispector

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Por Emma Rodríguez  Para falar sobre Clarice Lispector haveria que inventar novas palavras, comprar um dicionário do sublime, utilizar um novo alfabeto. É o que primeiro me vem para iniciar essa passagem pela obra de uma escritora especialíssima; tão especial que me atreveria a dizer que em certos momentos, enquanto a leio, tenho a louca ideia de que não é deste mundo, que parece ter vindo de distâncias inimagináveis para contar-nos histórias e para falarmos do que nos é mais profundo. Se toda leitura exige do leitor uma adequação, uma mudança de registro que o permita adaptar-se ao tom, à maneira, ao ritmo e ao tempo do que transcorre nos universos da ficção, no caso da escritora brasileira poderia falar-se de metamorfose. Há que mudar de pele para segui-la. Há que desejar e esperar que seja ela a que outorga a permissão para entrar em seus lugares desconhecidos, em suas atmosferas flutuantes, nesse rio de emoções que apenas os que estão dispostos a sentir, vibrar, pod...

Boletim Letras 360º #166

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Um extenso arquivo sobre Gabriel García Márquez está online. É a Gaboteca. Mais informações ao longo deste boletim. Últimos dias para se inscrever no sorteio de um exemplar do livro do ano: Todos os contos , de Clarice Lispector. Para saber todos os detalhes basta acessar este link de nossa página no Facebook; é por lá que a promoção é realizada até o dia 1º de maio. Recado dado, vamos às notícias que estiveram em destaque em nossas redes sociais durante mais uma semana online. Segunda-feira, 18/04 >>> Brasil: Uma coleção de bolso para publicação de poesia é apresentada a partir do mês de maio Pela Companhia das Letras. O selo Poesia de bolso tem confirmado obras como A teus pés , de Ana Cristina Cesar, Me segura qu’eu vou dar um troço , de Waly Salomão e Caprichos e relaxos , de Paulo Leminski; os três autores tiveram nos últimos anos a publicação de sua obra completa no gênero. De Ana C. - homenageada da Festa Literária Internacional de Paraty em 20...

Polifonia e sectarismo em A Brincadeira

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Por Rafael Kafka A Brincadeira, de Milan Kundera, é um romance construído de forma bastante engenhosa e que se caracteriza por reunir alguns temas recorrentes na obra do escritor tcheco. Temos presentes neste romance os jogos de amor, as questões existenciais ligadas ao ego e à identidade e a crítica aos regimes totalitários de esquerda que encabeçados pela União Soviética dificultaram demais a vida dos habitantes do leste europeu. A história gira em torno de Ludvik, um homem que quando jovem pertenceu ao quadro Partido Comunista. Todavia, em dado momento, ele faz uma brincadeira de aparência inocente e fútil em uma carta enviada a uma antiga namorada. A peça consiste em citar uma frase de Trotski, inimigo mortal dos comunistas stalinistas, o que é descoberto por membros da comunidade acadêmica da qual Ludvik faz parte. Levado a juízo, é expulso do partido e tem o direito de seguir os estudos negado, tornando-se uma espécie de pária na sociedade tcheca. O relato de L...

Shakespeare, o inesgotável

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Por Marcos Ordoñéz Peter Ackroyd, que escreveu uma vivaz (e volumosa) biografia sobre Shakespeare, o descreve metaforicamente como uma esponja que absorvia tudo o que estava ao seu alcance. Aprendeu das reações do público e dos atores, das histórias escritas há vários séculos (as célebres Crônicas de Inglaterra, Escócia e Irlanda , de Holinshed, publicadas em 1577, seu livro de cabeceira) e do que acabava de apresentar-se, os diálogos cortesões de John Lily e as tramas sangrentas e enlouquecidas de George Peele, e sobretudo, das exuberantes tragédias de Christopher Marlowe, seu primeiro ídolo.  “Ampliou e aprofundou enormemente seu léxico”, conta Ackroyd, “à medida que experimentava com as diversas formas da arte dramática. Estava em total sintonia com a linguagem que lhe rodeava – os poemas, as funções, os panfletos, os discursos, a fala das ruas – e devorou o que lhe apareceu pela frente. Talvez não tenha existido maior assimilador na história do teatro”.  ...

De mim já nem se lembra, de Luiz Ruffato

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Por Pedro Fernandes Há na literatura contemporânea uma diversidade de formas, estéticas, vozes e temas cuja natureza produz no leitor mais afeito à compreensão de que as obras estejam sempre tomadas por uma estética pura e simples, dotada de características determinadas se pergunte em qual escola poderíamos filiar este ou aquele escritor. Essa não é uma reflexão vazia; ela nasce de uma convenção formada naturalmente quando se estuda literatura no Ensino Médio, quando os professores muitas vezes reduzem a leitura ao deslindar de escolas literárias e esquecem ora do contínuo exercício de escritores (e mesmo outros leitores) contra a fixidez que um dia já serviu à definição das obras literárias. Também é isso um reflexo da presença e da força da história na sedimentação da compreensão sobre nossa realidade e o imperativo do didatismo com o qual tem-se reduzido as questões mais complexas. Essa diversidade muitas vezes é recorrente mesmo no conjunto da obra de um mesmo escr...

Miguel de Cervantes: uma vida de papel

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Por José Manuel Lucía Megías Miguel de Cervantes, de El Greco. Miguel de Cervantes, como a maioria dos escritores do Século de Ouro, tem criado uma personagem de si mesmo ao longo e à altura de sua obra. Duas imagens cervantinas valem mais que mil palavras. Em 27 de março de 1615, o funcionário Márquez Torres assina em Madri a aprovação que permite a publicação da segunda parte do Quixote . Depois de mil louvores, termina seu texto com uma anedota que dá conta de seu sucesso na Europa. Alguns cavaleiros franceses, ao escutar o nome de Miguel de Cervantes, "começaram a elogiar, encarecendo a estima em que, assim na França como nos reinos seus confinantes, se tinham suas obras: a Galateia , que algum deles tem quase de memória a primeira parte desta e as Novelas ".  E do êxito de suas obras a querer conhecer detalhes da vida do seu autor é só um passo. Ao perguntar-lhe sobre sua idade, profissão, quantidade e qualidade, Márquez se viu obrigado a dizer que era ...