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Sepulcros de vaqueiros: uma oportunidade única e fascinante

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Por Patricio Pron Rigoberto Belano, narrador de “Pátria” (o primeiro dos três textos que compõem Sepulcros de vaqueros [Sepulcros de vaqueiros]), recorda que quando era criança brincava com seus irmãos a “converter os momentos felizes em estátuas”; e enquanto foge de Santiago do Chile no carro de Patricia Arancibia, se descobre desejando que “alguém, um anjo que nos observasse do céu, convertesse [em estátua] a velocidade e a fuga”. Poucas literaturas são mais relutantes a adotar uma rigidez estatuária que a do seu autor, Roberto Bolaño; catorze anos depois de sua morte, essa obra nem sequer pode ser dada como concluída: de 1996 a 2003 (seus anos de maior visibilidade), Bolaño publicou 11 livros; desde esta última data até a atualidade publicaram 10, entre eles 4 imprescindíveis: 2666 (2004), A universidade desconhecida (2007), As agruras do verdadeiro tira e Bolaño por sí mismo [Bolaño por ele mesmo] (estes dois últimos de 2011). A existência de outros inéditos cuj...

Boletim Letras 360º #239

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Uma semana muito especial para a literatura brasileira: depois de quase uma década e de muitas promessas, enfim temos a data de apresentação do novo romance de Milton Hatoum [imagem]. Esta e outras informações que copiamos no mural do Letras no Facebook estão aqui reunidas.  Segunda-feira, 11/09 >>> Brasil: Lima Barreto pornográfico. O escritor teria assinado duas histórias picantes com o pseudônimo de Pelino Língua As mais recentes descobertas foram divulgadas pelo jornal  Folha de São Paulo . Os folhetos são provavelmente de 1912 e até então não se sabia qual nome o escritor havia utilizado para assinar as histórias. O autor assinou "O Chamisco ou o Querido das Mulheres" e "Entra, Sinhór!..." como Pelino Língua. Pelino, não custa lembrar, é uma personagem do conto "A nova Califórnia". Foi o pesquisador Felipe Rissato quem encontrou a novidade. Agora, dos folhetos nenhuma notícia do paradeiro; sabe-se da existência deles graças...

Matadouro 5: um soldado perdido no tempo

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Por Grace Morales Alemanha, fevereiro de 1945. A cidade de Dresden era um gigantesco hospital de guerra, seus edifícios convertidos em refúgio para os feridos da frente oriental. O abaste cimento de comida, cada vez mais escasso. Muitas fábricas já haviam sido destruídas pelas bombas dos aliados. Mas Dresden mantinha uma junção ferroviária que podia prejudicar os interesses soviéticos, cujo exército já se encontrava às portas da Silésia. A inteligência britânica decidiu reabrir a Operação Thunderclap de 44, render pelo ar as resistências do oeste, mas desta vez só as cidades mais importantes. Para acelerar no tempo o fim da guerra, decidiram bombardear Dresden, conhecida como a Florença do Elba pela enorme quantidade de museus e monumentos, uma cidade repleta de beleza. A noite de 13 de fevereiro, os pathfinders britânicos arrasaram Dresden em duas ondas de bombas incendiárias. Deixaram casas e seres vivos consumidos por uma chuva de fogo gigantesca que succionou o oxigênio ...

Avenida Niévski, de Nikolai Gógol

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Por Pedro Fernandes Apesar de só recentemente os estudos literários dedicarem alguma atenção sobre  o espaço enquanto categoria multiforme e portanto plurissignificativa no e para a narrativa literária, esta parece haver galgado a obsessão desde sempre. O conto de Nikolai Gógol é um exemplo disso: data de entre 1832 e 1842. Detalhe: trata-se de uma peça que integra um conjunto textos nos quais o escritor russo escolheu como mote criativo Petersburgo. A cidade era, então, capital do Império Russo, papel que exerceu até 1918, quando as instituições administrativas do governo mudaram para Moscou. Já a avenida que dá título ao texto é a via principal de Petersburgo. Logo, a escolha de Gógol em situá-la como protagonista da narrativa não é gratuita.  À maneira de um cronista seduzido pela importância, magnitude e imponência da avenida Niévski, o narrador, contrariando a crítica que faz à pintura russa, acusando-a de ser destituída de cores vivas e movimento, ...

De Mário Peixoto, é preciso virar a página

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Por Pedro Fernandes Repete-se com muita frequência que a geração com pés fincados no grande pântano das redes sociais tem se revelado portadora de um mal: tem muitos planos, aliás, é extremamente criativa, mas pouco ou quase nada torna-se realidade. E não porque não saiba o caminho das pedras através do qual possa concretizar suas ideias; é que, por alguma razão, tudo se adia um pouco e quando se percebe, a ideia está morta. A acusação tem alguma verdade, mas talvez seja necessário rever que este não é um mal de geração. É possível até que seja, agora, uma recorrência, mas ela independe do atual contexto. E entre o projeto e sua execução há mais elementos envolvidos que a mera inação de nosso tempo. A criatividade é, no geral, coisa que carece e muito de um amplo exercício de autocontrole e canalização das forças para um sentido em específico ou a vida inteira poderá não deixar de ser uma sucessão de devaneios. A bem da verdade, não há mal algum na não-realização de idei...

Marcelo Chiriboga, muito além de uma broma literária

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Se há um escritor do Boom que levou uma vida cheia de incógnitas e teve um fim misterioso é o equatoriano Marcelo Chiriboga. Foi o único equatoriano do Boom e o primeiro a utilizar o humor em sua obra. Seu primeiro romance, La línea imaginaria , é uma voluptuosa obra que exerce uma crítica ácida ao absurdo e a inutilidade do conflito entre Peru e Equador que resultou na guerra de 1941. Tudo isso é broma, claro. Porque Marcelo Chiriboga nunca existiu, ao menos não na vida real, só na ficção. Chiriboga já havia aparecido nos romances dos escritores José Donoso e Carlos Fuentes. Num dos livros do primeiro, Nueve novelas breves  escreve a contracapa da obra, esta aliás, uma recompilação póstuma de textos de seu criador. Num romance de Donoso, ele é o romancista mais aclamado do boom , aquele em que a personagem principal de O jardim do lado quer se parecer. Aquele que quer ser. No seu primeiro romance, os jovens soldados equatorianos se encontram em meio a selva...