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Dylan Thomas

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Por Jorge Brash Dylan Thomas. Foto: Arquivo Hulton Uma árdua disciplina de testar seus escritos em voz alta repetidamente levou este poeta, ficcionista e roteirista galês a alcançar efeitos incomuns na língua inglesa. Ele levava seu rigor musical a tal ponto que, entre as novas tendências da poesia, denunciava o que chamou de “a morte da audição”:   “A maior parte do trabalho de Pound, grande parte do trabalho de Auden e Day Lewis, e de todos os discípulos de Pound: Ronald Bortrall, [William] Carlos Williams etc., soa terrivelmente mal. Esta falta de audição, esta degradação de uma arte que depende principalmente da união musical de vogais e consoantes, poderia ser explicada falando dos efeitos da nossa civilização barulhenta e mecânica sobre o delicado mecanismo do ouvido humano. Mas a razão é mais profunda. Muita da poesia atual é plana, monótona, impressa na página: um amálgama de palavras em preto e branco criado por inteligências convencidas de que um poema deve, única e exclu...

“A estranha comédia da vida”: um, nenhum, cem mil espelhos

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Por Ana Rosa Gómez Rosal   Já o dissemos outras vezes e não nos cansaremos de repetir: dar ao original um sentido unívoco de novidade é um erro. Algo mais comum do que gostaríamos, mas que é a realidade, teimosa, insistente no seu velho e feio hábito de não se adaptar ao que esperamos dela. Talvez tenha sido daí que surgiu a ficção, numa tentativa muito ambiciosa de encontrar as reviravoltas possíveis, de tentar sair de uma situação que não nos era totalmente agradável, do alívio que os finais alternativos nos proporcionam. As coisas ficam complicadas quando descobrimos que esse monstro ao qual supostamente demos vida também é caprichoso e gosta de mostrar que somos seus escravos. Mas isso é algo que não cabe a nós lidarmos neste momento.   Por enquanto, fiquemos com o fato de que o original remete (surpresa...) às origens e que no final a ficção nos ajuda, pois é o centro gravitacional do último filme distribuído pela Alfa Pictures e dirigido por Roberto Andò, A estranha comé...

Thomas Bernhard: o riso (desesperado) de um hater

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Por Rebeca García Nieto Thomas Bernhard. Foto: Brigitte Hellgoth É incomum que alguém comece a sua autobiografia com uma referência sobre a taxa de suicídios que ocorrem na cidade onde cresceu: “Duas mil pessoas todos os anos no Land federal de Salzburgo tentam acabar com as suas vidas, e uma décima parte dessas tentativas de suicídio têm um resultado fatal.” Seus personagens se enforcam, se jogam pela janela, e quem não “escapa da vida” pensa continuamente em suicídio. Pelo que ele disse em Uma criança , seu próprio avô pensava em suicídio o dia inteiro, e ele próprio pensava em se matar “a todo momento”. Não é de surpreender que, quando ele morreu, tenha sido dito que ele havia recorrido ao suicídio assistido. Apesar do exposto e do “profundo pessimismo existencial” que todos os seus romances destilam, devo admitir que poucos livros me fizeram rir tanto quanto os de Thomas Bernhard. E eu não sou a única. Javier Marías o considerava um comediante e Agota Kristof apresentava Sim a to...

Italo Calvino: uma rede para pegar o universo

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Por Paola Dada Italo Calvino. Foto: Arquivo Rcs.   De modo especial, a literatura de Ítalo Calvino é espiralada. Foi um escritor versátil que trabalhou o romance, o conto, o ensaio, a crônica e o jornalismo. Apesar de ter utilizado diferentes métodos literários, sua escrita é uma linha contínua e interminável que, como uma grande teia de aranha, tenta apreender o universo. “A obra literária é uma dessas mínimas porções nas quais o existente se cristaliza numa forma, adquire um sentido, que não é nem fixo, nem definido, nem enrijecido numa imobilidade mineral, mas tão vivo quanto um organismo”, escreve em Seis propostas para o próximo milênio (1988). 1   Neste livro se apresenta cinco das seis conferências que proferiria para a Universidade de Harvard, no ciclo “Charles Eliot Norton Poetry Lectures”. Ele morreu pouco antes de fazer a viagem em 19 de setembro de 1985. 2   Antes de completar sessenta e dois anos, Calvino consegue nestas propostas resumir qual foi a sua obra...

Boletim Letras 360º #556

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Machado de Assis. Arquivo Fundação Biblioteca Nacional. LANÇAMENTOS   Uma coleção recupera toda obra de Machado de Assis publicada em vida .   Da estreia, em 1861, com a peça Desencantos , ao último romance, Memorial de Aires , de 1908, passando por obras como Contos fluminenses , A mão e a luva , Papéis avulsos , Histórias sem data , Quincas Borba , Dom Casmurro , Poesia completa e Esaú e Jacó , a coleção reúne 25 volumes, em ordem cronológica, que permitem observar o percurso de Machado até se tornar o autor de alguns dos maiores clássicos brasileiros. Há também um volume extra, Terras , testemunho de seu trabalho como servidor público, função que exerceu por mais de quarenta anos, tratando de questões cruciais para o país. Com texto estabelecido a partir de edições revistas pelo autor e apresentações inéditas para cada livro, a caixa condensa um trabalho editorial de rara envergadura, resultado de um intenso processo de pesquisa e edição que durou quatro anos e foi desenvo...

A insustentável leveza do ser, de Milan Kundera

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Por Sérgio Linard Milan Kundera. Foto: Václav Chochola   A vida é repleta de imprecisões e de incertezas que fazem com que levemos um bom tempo dela buscando criar algum tipo de constância e/ ou de rigidez para um material que — tardamos a perceber — é naturalmente maleável. Diuturnamente, escolhas precisam ser feitas e suas devidas consequências acabam por ganhar aspectos que julgamos positivos e/ ou negativos, como se todo o ser fosse somente uma disputa constante entre esses dois polos.   Dentro dessa disputa entre o ser bom e o ser ruim, o ser leve o ser pesado, o ser fácil e o ser difícil, rachaduras imaginárias vão se consolidando e separando aquilo que moral e socialmente elencamos como inadequado ou adequado e assim o fazemos de forma repetida e constante. A bem da verdade, tem-se o fato de que nunca saberemos como teria sido algo “se” fizéssemos de maneira distinta ou por caminhos diferentes, tudo o fora disso é simples especulação. Para nossa sorte, porém, temos a o...