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Boletim Letras 360º #630

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DO EDITOR   Olá, leitores! Aproveito o destaque desta edição para lembrá-los que estamos procurando apoiadores do Letras que queiram concorrer a um exemplar de Morte em pleno verão , outro livro de escritor japonês a ganhar tradução inédita direta do seu idioma recentemente entre nós. O lembrete está aqui, neste comentário, mas está também à esquerda desta página. Saiba todos os detalhes de como participar aqui . Um excelente final de semana para vocês! Yuko Tsushima. Foto: Horst Tappe Fondation.   LANÇAMENTOS   A chegada da obra de Yuko Tsushima entre nós. Agora, o romance que saiu pela primeira vez na revista literária Gunzō entre os anos de 1978 e 1979 e foi vencedor do prestigiado prêmio Noma .   Uma mulher recém-separada do marido aluga um apartamento em Tóquio para morar com a filha pequena. A nova casa tem janelas voltadas para todas as direções: a qualquer hora do dia, uma luz exuberante inunda o lugar. Enquanto isso, em seu íntimo, diante da nova vida que s...

V. e os rododendros

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Por Mauricio Montiel Figueiras V. Woolf com o cocker spaniel Pinka, Monk's House, 1931.   “L. está podando os rododendros.” Esta é a última entrada que Virginia Woolf rabisca em seu diário. A data é segunda-feira, 24 de março de 1941.   Quatro dias antes de encher os bolsos com pedras e partir em direção ao Rio Ouse, ela vê seu marido Leonard cuidando dos arbustos. O rododendro, do grego rhódon (rosa) e dendron (árvore), floresce na primavera. Todas as suas partes são tóxicas e até mortais se ingeridas.   Leonard Woolf poda esses arbustos potencialmente letais quatro dias antes de sua mulher se afogar no rio. A morte zumbe no ar. Será que Virginia Woolf verá, segundos antes de sua vida ser irremediavelmente interrompida pelas águas do Ouse, como as rosas se metamorfoseiam em pedras em seus bolsos? Pensará que ao afundar na água finalmente se libertará da pedra de Sísifo representada pelas vozes que enchem como favos de mel as entrâncias de sua cabeça?   “Não creio ...

Por dentro (e por fora) de Úrsula

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Por Renildo Rene Dalton Paula. Maria Firmina dos Reis . MASP (Reprodução)   “O nosso romance, gerou-o a imaginação, e não o soube colorir, nem aformosentar. Pobre avezinha silvestre, anda terra a terra, e nem olha para as planuras onde gira a águia.”   As primeiras palavras lidas em Úrsula , no Prólogo, afirmam o poder da criação. Criar é contornar o estilo do século e deslocá-lo em sentidos diversos, afirmando a identidade nacional ao mesmo tempo que se pretende miná-la. Maria Firmina dos Reis especializa a vanguarda ficcional da literatura abolicionista ao conceber no exercício da escrita uma tarefa de dar existência ao território obliterado do Brasil. Sem quaisquer dúvidas disso, o romance sai ineditamente em 1859 sob o título autoral que facilmente acompanha seu nome: “Uma maranhense”, simples e adjetivo, e ainda mais acertado porque ela conturba “a conversação dos homens ilustrados”.   A conturbação vem logo no primeiro capítulo, “Duas almas generosas”. A fisionomia ...

Anora, Cinderela sem sapatinho

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Por Carlos Rodríguez   Trabalho sexual é trabalho, diz uma frase que se repete insistentemente na tentativa de dar dignidade à atividade de troca econômica por sexo. De certa forma, o slogan adere à ideia, já um tanto capciosa, e esta ao filme, de que o trabalho dignifica o homem. À primeira vista, Anora esquece seu trabalho como stripper e acompanhante e se apaixona por um de seus clientes quando ele também se apaixona por ela. As diferenças entre os dois não importam, pelo menos no começo. Não importa que ele seja um pouco mais novo que ela. Nem que seja russo, filho de uma família milionária, e ela seja uma garota que aluga um apartamento pouco atraente no Brooklyn. Por que viver para trabalhar se viver pode ser uma fantasia?   Para falar do cânone da prostituta no cinema, devemos pensar em Anora (2024). Mas Anora não é tão ingênua quanto a jovem Julia Roberts em Uma linda mulher (1990), nem tão desconfiada e assustadiça quanto Holly Golightly (Audrey Hepburn) em Bonequi...

Acerca de um conto de Marques Rebelo

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Por Henrique Ruy S. Santos Marques Rebelo. Foto: Alécio de Andrade / Acervo IMS   O conto “Em maio”, de Marques Rebelo, se inicia com um “Boa tarde!” que demarca o fim de um ato comunicativo, um cumprimento final entre dois conhecidos que se despedem. Após a separação, o narrador do conto se dirige às ruas do Rio de Janeiro em um domingo “límpido de maio”, onde terá a oportunidade de observar o desenrolar cotidiano da vida no subúrbio da cidade, com o movimento dos bondes e a circulação de seus tipos característicos. O texto destoa, de maneira decisiva, do expediente literário que Rebelo tão bem demonstrou dominar em seu livro de estreia, Oscarina , de que “Em maio” faz parte como terceiro conto.  Algumas das narrativas mais marcantes do livro, como o conto homônimo e “Na Rua Dona Emerenciana”, se destacam pela perspectiva inquieta de seus narradores, que a todo tempo transitam entre diferentes focos narrativos, recolhendo fiapos de histórias de cada personagem que atravessa s...

Escritoras à sombra

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Por Agata Sala   Nunca perdem a oportunidade de dizer que as mulheres devem largar as canetas e remendar as meias dos maridos.   — Rosalía de Castro, em “As literatas, carta a Eduarda”   Gabriel Metsu, Elegant Lady Writing at Her Desk  (detalhe)   Ser mulher nunca foi uma tarefa fácil. E ser mulher e escritora, ainda pior. Houve um tempo em que elas não escreviam nem liam. A literatura era um campo reservado exclusivamente aos homens; às mulheres era esperado apenas que tivessem filhos, cuidassem das tarefas domésticas, mas nunca se dedicassem ao trabalho intelectual. Entretanto, apesar dos impedimentos em um mundo que não tinham direitos, algumas escritoras desafiaram as convenções e conseguiram encontrar maneiras de publicar seus escritos. Esconder-se sob um pseudônimo masculino, assinar anonimamente e escrever em segredo foram alguma das estratégias utilizadas por muitas mulheres antes de fazer com que suas vozes fossem ouvidas em público e, mais tarde, uma ...