Postagens

Dogville, de Lars Von Trier

Imagem
Quando Dogville  estreou em 2003, dois aspectos ganharam destaque. O primeiro, formal, é introduzido desde a primeira cena. Em um cenário composto de pouquíssimos elementos, Dogville, uma cidade fictícia do Colorado, é mostrada de cima. Em vez de casas, portas, muros e árvores, divisões estilizadas e simbólicas indicam que se trata de uma cidade. Os limites entre as residências são traçados no chão e apontamentos feitos com giz apresentam outros elementos da narrativa. Assim, por exemplo, sabe-se que há um cão porque a palavra "dog" está escrita e não porque o animal aparece. A fala de um narrador reitera o tempo todo que se trata de uma encenação. Sob essa estrutura formal, ecoam as propostas desmistificadoras do chamado teatro épico formulado pelo dramaturgo alemão Bertolt Brecht. E a certeza de que o cinema de Von Trier não seguia mais com rigidez o Dogma 95, movimento fundado por ele e Thomas Vinterberg que se pautava por mandamentos como proibir filmagens em cenár...

Encontrar Maria Valéria Rezende

Imagem
Por Pedro Fernandes O meu encontro com a escritora se deu por ocasião de uma conferência de encerramento para o III Encontro Nacional sobre Literatura Infanto-juvenil e Ensino (ENLIJE), realizado de 02 a 04 de junho de 2010, na Universidade Federal de Campina Grande. É a segunda vez que vou ao evento. Este, teve um caráter mais plural porque vem retomar minhas aproximações para com a literatura saramaguiana, posta na estante, desde que, fui para a leitura da obra de Chico Buarque e de outros escritores. Sobre tais obras de Chico e de outros escritores postarei comentários por aqui mais adiante.  Maria Valéria Rezende só veio justificar aquele conceito que eu já elaborei para palestras com escritores: são as melhores e mais lúcidas falas acerca de literatura que um estudante da área pode ouvir. Pensando no tema formação do escritor, a escritora deixou claro três coisas: há, pelo menos no caso dela, uma certa inclinação do sujeito para a escrita já desd...

Princípe da Pérsia, de Mike Newell

Imagem
Por Pedro Fernandes Não é um filme. É um misto de cinema e videogame. Inspirado mesmo num jogo  de videogame criado por Jordan Mechner ainda na década de 1980, Príncipe da Pérsia não engana nem a gregos e nem a troianos essa sua raiz. As personagens estarão todas à beira de algum precipício, de alguma peripécia, em saltos e acrobacias que, ao vermos, mais parece estarmos diante de um daqueles filmes japoneses de artes marciais, embora pouco tenha de artes marciais por aqui, e não num filme épico - tom forçado que seus criadores quiseram imprimir. Entretanto, a direção do filme peca. E peca muito. Há um certo artificialismo que vai, como as toneladas de areia que rolam durante todo o filme, amarelecendo aquilo que chamamos de realidade da ficção. Na verdade, o caso é tão grave, que, até as interpretações dos atores soa como teatro infantil. É, entretanto, um filme de energia coreografada. Quanto a beleza estética e ao enredo, ...

Jesus falava palavrão, de Eloésio Paulo

Imagem
Está aí um perfeito texto este do professor Eloésio Paulo. Vejo nele um apanhado de todos os posts que já publiquei por aqui cujo alvo estava o discurso religioso e suas imagens toscas. Notifico por este espaço porque, como Eloésio Paulo, creio que estamos – no atual desrumo – prestes a montar colônias de desmiolados. É que o poder da religião tem se metamorfoseado a ponto de atingir o reino da palavra – essa que pode tanto construir quanto destruir. É um poder superior ao da Inquisição porque é um poder sutil e cerceador. E esse poder está nas mãos não dos católicos, que se engalfinharam de vez no mercantilismo a ponto de não sabermos mais onde que termina a religião e onde que começa o capitalismo; esse poder está nas mãos de evangélicos, ou aquilo a que denominei de neo-cristãos. Esses são piores do que qualquer Inquisição. São cegos. Donos únicos da verdade. E acham que o mundo está dividido, incisivamente, entre Deus e o Diabo. Sendo que ao Diabo vão to...

A necessidade humana de expressão artística – parte I

Imagem
Por Pedro Fernandes Bisão, na Caverna de Altamira Se fizermos uma pequena viagem pelo que chamamos evolução da pintura, desde a Pré-História à contemporaneidade, teremos a oportunidade de algumas observações acerca da Arte que talvez nos ajude a melhor compreensão de alguns dos seus “problemas” antigos e modernos. Digo isso porque, apesar de não me ligar diretamente ao terreno das artes plásticas, mas em específico ao da literatura, (a literatura é uma forma de arte e como forma arte é influenciada por movimentos semelhantes aos que ocorrem noutros campos artísticos, como o das artes plásticas) ouço muitas vezes certos desaforos acerca de alguma obra de arte. Não quero, contudo, discutir aqui a questão “o que é arte”, mesmo sabendo que ela é inerente. Os desaforos de que falo (e esse é um dos problemas que perpassa toda a trajetória de constituição da arte) são aqueles do tipo “Como pode uma bobagem destas obter tanto valor no mercado?” ou “Isto, até eu faço! Mas, se fosse ...

Quincas Berro d'Água, de Sérgio Machado

Imagem
Por Pedro Fernandes É sempre necessário louvar iniciativas como as da Companhia das Letras, agora responsável pela obra de Jorge Amado, de trazer ao público a completa reedição de uma obra que não pode nunca se deixar perder nos labirintos do esquecimento. Jorge Amado é um dos nossos pilares mais importantes, tanto que as obras que escreveu tiveram, em grande parte, uma ou mais adaptações para diversos gêneros televisivos e sempre com o mesmo efeito de audiência e público. É por causa desse trabalho editorial que reapareceu em 2008 uma irreverente obra do escritor,  A morte e a morte de Quincas Berro D'água . Possivelmente tenha sido essa reedição o que terá levado Sérgio Machado a trazer o texto de 1961 para a grande tela. Mas, antes de escrever duas notas sobre adaptação é preciso logo colocar em questão sobre o porquê de sublinhar o título original da obra. Não é apenas para lembrar ao leitor / espectador que está diante de um texto que antes do cinema é uma obra ...