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O homem sem doença, de Arnon Grunberg

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Por Pedro Fernandes A reinserção de Arnon Grunberg entre as obras mais recentes publicadas no Brasil corrige um grave desvio que colocava leitores em condição distanciada de uma das melhores prosas da literatura contemporânea. Desvio porque, depois dois primeiros títulos editados por aqui – Dor fantasma e Amsterdã Blues – já passara uma década que a obra do escritor holandês não era traduzida. Nessa correção, O homem sem doença veio depois de Tirza . E, argumentos não faltam para justificar a grandiosidade da obra de Grunberg, mas um é suficiente: trata-se de uma literatura que dialoga proximamente com universos como os de Franz Kafka, Samuel Beckett ou os de Herman Broch, que são atmosferas envoltas pela mesmidade da instituição burocrática, do onírico, do homem preso na tessitura de suas próprias ambições e incapaz de romper com o acaso e seus desdobramentos. Isto é, o homem nos seus piores pesadelos e condenado a neles permanecer porque, queira ou não, a vida não é...

Milena Jesenská, muito além de namoradinha de Franz Kafka

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Por Juan Bonilla Milena Jesenská e Staši Jílovská, em 1925. Eis um livro maravilhoso: emocionante, perturbador, difícil de esquecer. Foi escrito por Margarete Buber-Neumann e a edição mais recente publicada no Brasil data de 1987. Intitula-se Milena ; nome, portanto, mais adequado que o Milena, a amiga da Kafka , com que foi publicado noutras traduções ao redor do mundo. Aliás, não haveria título mais injusto para uma obra em que Kafka aparece apenas num capítulo – comovedor, sem dúvida – apesar de Milena ser correspondente do escritor, de quem traduziu sua obra para o tcheco e com quem manteve uma relação sentimental que ele, por temer a vida, por sentir-se “perdido no abismo de Milena”, tratou de não levar adiante. Os leitores, entretanto, desprovidos do nome famoso justaposto ao de Milena, construirão uma imagem melhor elaborada dessa personagem, sobre sua vida, sua garra, sua escrita, por si só significativos ao ponto de Buber-Neumann ter-lhe dedicado este ...

J. R. R. Tolkien, o mito desconstruído

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John Ronald Reuel Tolkien, o escritor que entreteve gerações de leitores do mundo inteiro com o seu Legendarium (assim descreveu sua mitologia sobre a Terra Média) nasceu em 3 de janeiro de 1892 em Bloemfontein, Sul da África. Essa data nunca passará despercebida às suas legiões de fãs. Se para a maioria dos críticos modernos o mito é sinônimo de mentira ou falsidade, para o autor de O Hobbit , O senhor dos anéis e O Silmarillion é a única maneira de certas verdades transcendentes poderem ser expressas de um modo tangível. Essa fantasia que parte da realidade, que consegue prender o leitor na narrativa e a assuma como verdadeira, é a chave mestra da obra de Tolkien, marcada por enredos enraizados na natureza humana: o eterno embate entre o Bem e o Mal; a irresistível tentação pelo Poder; a amizade, lealdade e idealismo; e a elevação dos sujeitos mais humildes à categoria de heróis. Aos três anos de idade, Tolkien se mudou com sua mãe, Mabel, e seu irmão para a Inglat...

Juan Goytisolo em seu amargo final

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Por Francisco Peregil Há três anos Juan Goytisolo contava apenas com poucas condições para subsistir. Era impossível custear os estudos de seus três afilhados, algo que havia se convertido na razão de sua vida. Faltavam-lhe as forças para escrever uma grande obra e em abril de 2014 escreveu a seguinte declaração: “Minha decisão de recorrer à eutanásia a fim de não prolongar inutilmente meus dias obedece a razões éticas de índole pessoal. Desaparecida a libido e com ela a escrita, comprovo que já disse o que tinha de dizer. Tampouco meu corpo dá para mais. Cada dia constato sua deterioração e antes que esse declínio afete minha capacidade cognitiva prefiro antecipar minha ruína e despedir-me da vida com dignidade”. E continuava: “A outra razão da eutanásia é a de assegurar o futuro dos três meninos cuja educação assumo. Parece-me indecente gastar de maneira errada os recursos limitados que disponho, e que diminuem diariamente, em tratamentos médicos custosos ao invés de dest...

Notas para uma História das Artes Plásticas em Mossoró

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Por Márcio de Lima Dantas (Agradeço a Vicente Vitoriano e a Cid Augusto o material gentilmente me fornecido) O universo da produção pictórica mossoroense é mais rico e complexo do que fomos acostumados a representar e a repetir, sobretudo nas mídias, que acabam por nos influenciar a imprimir os contornos da imagem que fazemos de nós e da cidade na qual vivemos. Enquistada nas terras quentes do oeste, equidistante de dois grandes centros, Natal e Fortaleza, permanece no imaginário como uma polis isolada e sem maior acesso a determinadas tradições da história da arte. Porém, a comarca da arte não se rege pela gramática da política ou da economia. A arte ocupa no humano um lugar mental, que se manifestará de maneira relativamente autônoma com relação ao entorno do grande teatro do mundo. Ou seja, a arte é uma espécie de imanência, uma necessidade humana, para servir de contraponto ao que convencionamos chamar de realidade. Não dizem que a poesia existe por que o real não...

Boletim Letras 360º #225

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Esta é mais uma edição do Boletim Letras 360º, uma publicação deste blog cujo interesse é reunir todas as notícias sobre o nosso universo de interesse divulgadas durante a semana em nossa página no Facebook . Domingo, 04/06 >>> Morreu o escritor Juan Goytisolo O escritor nasceu em Barcelona em janeiro de 1931. Formado em Direito, mudou-se para Paris ainda nos anos cinquenta onde começa a trabalhar com assessor literário da importante Gallimard. Na década seguinte trabalha como professor de literatura em universidades da Califórnia, Boston e de Nova York, atividade que continuou ao longo de sua vida. Autor de uma extensa e variada obra narrativa e ensaística, foi censurado na Espanha pela ditadura franquista. Escreveu reportagens, literatura de viagens e memórias. Foi crítico implacável do mundo contemporâneo. Vivia entre Marraquexe, Paris, Estados Unidos e Espanha. Seus primeiros romances se inscrevem nas tendências do realismo social. No Brasil, ...