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Golpes de versos afro-potiguares do poeta Antonio Eliano

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Por Ciro Leandro Costa da Fonsêca O escritor angolano Ondjaki tece em suas obras uma imagem da escuridão com um viés belo e positivo, pensamento presente, por exemplo, no título da sua obra Uma escuridão bonita (2013). A escuridão para esse autor revela um lugar na história, um espaço que permite o tempo narrativo. Nessa obra a escuridão está relacionada à proteção de um jovem garoto ao faltar nas ruas de Luanda capital de Angola, criando uma oportunidade para o diálogo com sua amiga. Essa discussão sobre o autor angolano se constrói como bastidor para que cheguemos aos poemas do jovem potiguar Antonio Eliano Juvêncio da Silva, um poeta e compositor que lançou no ano de 2015 o seu primeiro álbum intitulado Ecdemomania e que se assume negro versando sobre a sua identidade. Natural de Pau dos Ferros, no interior do Rio Grande do Norte, onde faz mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, é descendente dos povo...

Boletim Letras 360º #283

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Fechamos mais uma dezena de boletins e somamos quase três centenas de semanas desde quando passamos a organizar esta post fixa de sábado. E antes de passarmos às notícias que copiamos em nossa página no Fecebook, vamos lembrá-lo que nesta mesma rede se pode acessar a um conjunto de títulos que colocamos à venda; é o que carinhosamente chamamos de Sebinho do Letras . Em 2019,  Grande sertão: veredas  em nova casa editorial. Mais detalhes ao longo deste Boletim. Segunda-feira, 16/07 >>> Brasil: Caixa reúne a versão original de 77 contos dos Irmãos Grimm Coletados há mais de duzentos anos, os contos e lendas dos irmãos Grimm vêm encantando geração após geração e chegaram aos dias de hoje incrivelmente populares. Eles já foram traduzidos para mais de 160 línguas e ganharam diversas versões ao longo dos anos, em livros ilustrados, desenhos animados, peças, filmes e histórias em quadrinhos. Muitos detalhes, porém, foram amenizados ness...

Félix Krull e o jogo de identidades

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Por Rafael Kafka Thomas Mann é um autor que muito agrada ao meu existencialismo. Há nele uma grande atenção às manifestações de ser mais elementares e minuciosas do ser humano. Para focar em tais manifestações, Mann se utiliza de uma narrativa focada no romance de formação e em elementos de contraposição entre escolhas do eu e do ambiente circundante. Nesse sentido, podemos dizer que em seus romances mais célebres o autor alemão coloca como protagonista a indefinição da condição humana e a consequente angústia daí oriunda. Em alguns textos como Sua Alteza Real , Mann mostra como elementos da liberdade humana são sacrificados aos poucos no sentido de construção da identidade de dado complexo existencial. Para a construção do ser-para-reinar é necessária a morte do ser-para-si com sua liberdade de escolha e projeção dentro da mundanidade cotidiana. A contraposição entre a subjetividade e a objetividade do indivíduo gera uma dimensão de existir puramente voltada para o mundo ...

A única história, de Julian Barnes

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Por Pedro Fernandes “Romance: uma pequena história, geralmente de amor.” Não é um exercício gratuito o de Julian Barnes estabelecer como epígrafe de A única história , esta definição de Samuel Johnson encontrada em A dictionary of the English language , de 1755. Embora seja apenas uma entre as várias proposições cunhadas em quase quatro séculos de história, a essencialidade do romanesco jamais perdeu essa pitada adquirida no momento glorioso da forma. Não apenas por isso; o escritor inglês contorna com as tintas do tempo o tema do enlace amoroso, do seu nascimento quase sempre ao acaso à ruína, quando o sentimento, paredes-meias com o ódio a abjeção, ganha caminhos inesperados para os amantes. Em A única história reforçam-se mesmo alguns estereótipos da narrativa clássica: o amor impossível, a dedicação exacerbada dos amantes e a renovação da ideia de que mesmo ante a possibilidade de amar mil vezes, uma só experiência é a que marca em definitivo a vida dos amantes. Des...

O último suspiro, de Daniel Roby

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Por Pedro Fernandes Um leitor de Ensaio sobre a cegueira , de José Saramago, não deixará de estabelecer, à primeira vista, uma relação entre esta obra e o filme de Daniel Roby. É que aqui, como no romance do escritor português, estamos diante uma modificação radical e casual do mundo qual o conhecemos pela instauração de uma situação-limite capaz de conduzir a humanidade a uma profunda revisão de seu estágio e de sua condição. Num dia qualquer, um tremor de terra favorece o aparecimento – ao menos é este o diagnóstico primeiro apresentado pelas autoridades – de um pesado nevoeiro branco que cobre até certa altura quase toda Paris. A princípio os sobreviventes são aqueles que moram em lugares mais altos, os que conseguem se refugiar para o telhado ou pessoas como Sarah, a filha do casal Mathieu e Anna, quem, devido a uma rara doença precisa viver presa a uma câmara estéril. Com este grupo, Daniel Roby depositará o fio de esperança despontado no final da narrativa e abr...

A arte do romance

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Por Antonio Muñoz Molina Terminei de ler The other house e fiquei um tempo com o livro nas mãos, sem fazer nada, deixando que o romance se fixasse em mim, como quando termina um filme no cinema e alguém ainda está tão tomado pelo que viu que não se move do seu assento e não tem vontade de se levantar nem de sair logo à rua. (Deveria existir momentos assim num concerto, ao final de uma obra, parêntesis respeitosos de silêncio, antes do frenesi algo exibicionista dos aplausos). Depois de terminar Ther other house e de ficar paralisado por um tempo voltei ao começo e me concentrei de novo na leitura, agora com a clareza da segunda vez, que me permite dar conta de todos indícios que Henry James vai insinuando desde a primeira página. Sempre se está distraído quando se começa um romance. É como entrar da rua num lugar em penumbra. Há pormenores fundamentais que não se ver logo de primeira: motivos que se enunciam rapidamente, mas que o ouvido não sabe distinguir. Por iss...