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Os escritores e suas fotos

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Por Cristian Vázquez   Foto: Vasco Szinetar. Selfie com Gabriel García Márquez.  1 Por que as capas de quase todos os livros incluem uma foto do autor? Desde quando existe esse costume? Talvez seja importante conhecer o rosto de alguém que decidiu que sua ferramenta, sua matéria-prima, são as palavras impressas?   A foto do autor não é essencial no livro, isso é claro. Na verdade, ainda existem editoras e coleções que a omitem. Imagino que sua presença no livro esteja relacionada à predominância do visual em nossa cultura. E também com a sensação de que conhecemos melhor alguém se vimos seu rosto. Como se um certo lombrosianismo sobrevivesse nos leitores: o desejo de encontrar em seu olhar dirigido ao infinito, na mão que toca o queixo, na coqueteria mal disfarçada, as chaves para melhor compreender suas obras.   O fato é que as fotos estão quase sempre lá. E de maiores dimensões quanto mais vorazes sejam os apetites comerciais dos editores. Em muitos best-sellers, a...

José Juan Tablada: há orgias de sálvia na floresta

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Por José Homero José Juan Tablada, 1920?21  Não é curioso que os antigos haijin, monges zen errantes, se caracterizassem pelo movimento e que o introdutor do haikai — termo preferido pelo poeta ao hoje mais popular do haiku — e da sensibilidade poética japonesa no México, José Juan Tablada (1871-1945), o definisse como movimento? Numa carta de 1919 dirigida a José María González de Mendoza, ao tratar sobre as novas tendências visuais e literárias que havia encontrado durante sua estada em Paris, Tablada argumenta que aceitar a inovação ou apegar-se à tradição responde a uma concepção de arte. Desnecessário dizer, de uma poética:   Tudo depende do conceito que você tem de arte. Há quem a considere estática e definitiva; eu acredito em movimento perpétuo e em renovação contínua como as estrelas e como as células do nosso próprio corpo. A vida universal pode ser resumida em uma única palavra: movimento. A arte moderna está em curso, e dentro dela a obra pessoal também está em si...

Gustave Flaubert diz à mãe por que escritores sérios não devem se preocupar com empregos formais

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Por Colin Marshall Gustave Flaubert. Ilustração: Wesley Merritt Nós somos o que fazemos — ou em outras palavras, somos o que escolhemos gastar nosso tempo fazendo. Por essa lógica, um “músico” que passa um quarto de seu tempo com seus instrumentos e três quartos com Excel, embora não seja menos humano por isso, deveria por direito se chamar de fabricante de planilhas e não de criador de música. Essa visão pode parecer dura, mas tem seus adeptos, alguns deles artistas bem-sucedidos e respeitados. Podemos ter certeza de que nada menos que um criador do que Gustave Flaubert, por exemplo, certamente o teria aceitado, se levarmos a sério as palavras de uma carta que escreveu à mãe em fevereiro de 1850.   Embora ele tivesse finalizado vários livros na época, Flaubert, então com 28 anos, ainda não havia se tornado um homem de letras. No entanto, viajou bastante nessa época de sua vida, compondo essa correspondência em particular durante uma estada no Oriente Médio. Parece que mesmo do out...

Boletim Letras 360º #481

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DO EDITOR   1. Caro leitor, aqui está parte do conteúdo que fez a semana do Letras nas demais redes sociais mais as seções de costume. Agradeço sua companhia por aqui. Sempre tenha um bom e rico fim de semana, com descanso e boas leituras.    Mário de Andrade. Foto: João Mussolin.   LANÇAMENTOS   O erotismo de Mário .   A obra de Mário de Andrade é atravessada por uma profunda inquietação em torno do sexo. Pulsante e permanente, essa inquietação se traduz tanto na exploração do domínio erótico, de notável amplitude, quanto na incessante busca formal que o tema lhe impõe sem descanso. Na tentativa de reconhecer a silhueta de Eros nas tantas faces que o próprio escritor se atribuiu, sua produção literária se vale dos mais diversos recursos formais para dar conta de uma dimensão que parece continuamente escapar. Daí que o sexo venha a ser alçado ao patamar das suas grandes interrogações, onde se oferece na obscura qualidade de incógnita. Foi a partir dessas co...

Tradução de “Uma cena de Fausto”, de Aleksandr Púchkin

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Por Joaquim Serra   Nesta cena de Fausto , temos um exemplo do empréstimo que Aleksandr Púchkin faz da literatura mundial. O pacto selado entre Fausto e Mefisto, para o escritor russo, adquire traços do tédio que faria um longo caminho pela literatura do século XIX. E Púchkin, que não leu a segunda parte da tragédia de Goethe, já identifica no assunto fáustico a destruição que vai tomar lugar principalmente em Fausto II .     Aquele fomentador, criador visionário, que ironicamente vislumbra o mundo da igualdade quando está cego, aqui está preocupado com a monotonia dos dias, ganhando aspectos da própria aristocracia ao redor de Púchkin. O leitor de Púchkin sente falta nesta Cena daquele narrador intruso, que remexe na vida e na alma de suas personagens em Eugênio Onêguin . Esse componente essencial que enforma o modo próprio do autor em narrar a vida russa, dá lugar aqui ao diálogo por vezes cínico entre Fausto e Mefisto.   Para esta tradução, optamos por uma versão...