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Boletim Letras 360º #579

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    DO EDITOR   Olá, leitores! Nesta semana chegamos ao fim das apresentações dos colunistas que publicarão no Letras a partir desse ano. Saiu o texto de estreia de Herasmo Braga. Na chamada divulgada no início de 2024, foram selecionados seis novos autores.  Fica o convite para que leiam os seus textos, comentem e compartilhem.   É urgente estabelecer a descentralização dos espaços de diálogo e as próprias discussões acerca dos objetos literários. É o mínimo que podemos fazer nesses tempos de largo obscurantismo marcado pela tendência para o raso e a imposição de modelos aquém dos valores artísticos que merecemos. Um excelente final de semana! Valter Hugo Mãe. Foto:  Lucilia Monteiro   LANÇAMENTOS   Um romance delicado e profundo de Valter Hugo Mãe sobre o amor fraterno e a necessidade de cuidar de alguém .   Pode o amor de um irmão ser divino igual ao amor de uma mãe? Como os pássaros, os irmãos Pouquinho e Felicíssimo vivem nas alturas,...

Filosofia e Literatura: diálogos formativos entre Ricœur e Dostoiévski

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Por Herasmo Braga Graeme Wilcox. Reflector (detalhe).   Importante nos atermos que a potência da fala só se tornará válida se produzir sentido, e este deve pertencer aos seres, atendendo tanto aos anseios particulares como os coletivos. Assim, no tocante a essa ideia, encontramos a ética como princípio e item primeiro da narrativa e dos seus compartilhamentos mediante as visões de Ricœur e Dostoiévski, como podemos ilustrar neste mais um fragmento de Memórias do subsolo ao referenciar que, “Repito, repito com insistência: todos os homens diretos e de ação são ativos justamente por serem parvos e limitados. Como explicá-lo? Do seguinte modo: em virtude de sua limitada inteligência, tomam as causas mais próximas e secundárias pelas causas primeiras e, deste modo, se convencem mais depressa e facilmente que os demais de haver encontrado o fundamento indiscutível para a sua ação e, então, se acalmam; isto é de fato o mais importante”. Observamos nas vertentes expressas que a autoconsc...

A oração do carrasco, de Itamar Vieira Júnior

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Por Guilherme de Paula Domingos   Dois livros são escritos quando o autor publica. Um é o livro propriamente dito, assinado por quem o escreveu. O outro é o livro que vai se desenhando e fica por bastante tempo no imaginário do leitor, com as questões que traz à tona.    O talento de Itamar Vieira Júnior em A oração do carrasco está em desenvolver através de alegorias temas que nos são dolorosos. Aqui há referências a navios negreiros, carrascos, tribos indígenas, como também diálogos com Clarice Lispector, Hannah Arendt, Arthur Bispo do Rosário, entre outros. A vida se tornou banal, assim como a maldade na tese arendtiana. Um carrasco não sabe mais quantas pessoas já matou porque a crueldade do seu serviço, travestida de ação necessária para livrar o mundo de atos piores, está aliada a um cálculo que o poder faz sobre o valor de cada vida.   Itamar nos traz a figura do carrasco personificada em vários tipos que atravessam nossa história desde tempos antigos. O carr...

Uma eficiente chantagem

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Por Ernesto Diezmartínez   Esta visão de um grande homem corroído por um passado que ele não considera especialmente glorioso, ou melhor, deve aceitá-lo, é uma desavergonhada e muito eficiente chantagem sentimental.   Perto da última parte de One Life (Reino Unido, 2023), a estreia cinematográfica do veterano diretor de televisão britânico James Hawes (que esteve encarregado de vários episódios de Doctor Who , Snowpiercer , Penny Dreadful , Black Mirror e toda a primeira temporada de Slow Horses ), o moderado e aposentado corretor da bolsa de valores Nicholas Winton (Sir Antonhy Hopkins, provando que com atores como ele, mais é menos) está sentado, como um convidado qualquer, no popularíssimo programa de televisão da BBC, That's Life .   Estamos em 1987 e acontece que quase meio século depois do então jovem investidor “Nicky” Winton ter sido uma peça fundamental no salvamento da vida de várias centenas de crianças da então Tchecoslováquia recém invadida pelos nazistas,...

Realismo mágico: de William Faulkner a Gabriel García Márquez sem clichês

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Por Agustina del Vigo Gabriel García Márquez e Mario Vargas Llosa na casa Agurto. Lima, 8 de setembro de 1967. Embora você possa não acreditar e não pareça, Gabriel García Márquez é um homem tímido. É 5 de setembro de 1967 e ele espera Miguel José Oviedo no lobby do Hotel Crillón, no coração do centro Lima: aceitou o convite para falar em público sobre o romance latino-americano e agora está arrependido. O diretor da Extensão Cultural da Universidade Nacional de Engenharia finalmente o encontra refugiado atrás de uma coluna. Como o seu convidado, o acompanha: estão chegando um pouco atrasados.   Oviedo e Márquez chegam à universidade e o auditório está lotado. Terão que abrir caminho entre a multidão. E embora o sucesso do recente romance do colombiano — Cem anos de solidão — seja total e avassalador, ainda há muitos em Lima que não o reconheceriam mesmo que acontecesse de passar ao lado deles.   O escritor então aproveita: esgueira-se por entre a juventude desfrutando do ano...

Escritoras argentinas: uma visão a partir das margens

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Por Sandra Lorenzano Ilustração: Liuna Virardi   “Por que é que um grande número de nomes, apesar do seu talento, ainda não consegue ultrapassar o limiar do regional, como vimos ao longo dos anos no projeto Hablemos, escritoras ?” Parto desta questão colocada por Adriana Pacheco Roldán no artigo “O termo boom feminino é inadequado e insuficiente” para deambular pelas margens da atual ficção narrativa argentina e parar em alguns nomes que considero especialmente interessantes e propositais.   Antes de tudo, gostaria de pensar que a notoriedade alcançada por um grupo de autoras argentinas pode iluminar também outra parte do imenso corpus da ficção narrativa escrita por mulheres neste país do sul da América. Considerando autoras como Tununa Mercado (1939), Luisa Valenzuela (1938) ou Tamara Kamenszain (1947-2021) que, sem dúvida, abriram uma fresta em tempos difíceis, parece-me hoje essencial que a curta memória do mercado editorial tende a cobrir com sua “paixão juvenil” as que...