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Augusto Roa Bastos: entrecruzamentos do poder e da rebeldia

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Por Geney Beltrán Félix O nome de Augusto Roa Bastos – sua pertinência, sua posteridade – pareceria assentar-se de forma definitiva nas páginas de uma obra: Eu, o supremo . O autor paraguaio (Assunção, 1917–2005) chegou ao ponto mais alto de sua trajetória artística em 1974 com a publicação de um romance ambicioso e grandioso mas sobretudo anômalo. Quem o lia em 1953 com seu livro de estreia, os contos reunidos sob o título de O trovão entre folhas ou mesmo em 1960 com seu primeiro romance, Filho do homem , dificilmente haveria imaginado que dessa mesma pena sairia uma obra-limite de linguagem e imaginação como findou sendo o artefato verbal com que Roa Bastos tornou em alta matéria literária a figura do ditador paraguaio José Gaspar Rodríguez de Francia (1814-1840). E, se formos mais longe, tampouco haveria muito nos tratamentos anteriores da figura do ditador e da luta política na América Espanhola que poderiam adiantar os modos como Roa Bastos retrata e, mais exatament...

Boletim Letras 360º #241

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Na postagem 469 do Instagram do Letras oferecemos aos nossos leitores a opção de escolher dois títulos para integrar parte da próxima promoção a ser realizada pelo blog. Esperamos sua opinião. E em breve apresentamos a novidade no âmbito dos nossos 10 anos. Fique atento! O boom Margaret Atwood. A escritora canadense alcança o auge com a expressiva expansão da sua obra para a TV e a redescoberta de seus livros. No Brasil, depois de O conto da aia  é reeditado Vulgo Grace. Segunda-feira, 25/09 >>> Brasil: Reedição de Vulgo Grace , de Margaret Atwood Embalada pelo estrondoso sucesso de O conto da aia  (adaptado recentemente como um seriado), a Editora Rocco, amplia o gosto dos leitores que redescobrem a obra de Margaret Atwood com a reedição de Vulgo Grace . A obra também ganhará adaptação como série para TV. O romance foi escrito partir de um caso real ocorrido no Canadá na década de 1840 e conta a trajetória de Grace Marks, uma cr...

O conto da aia, o pesadelo de ser mulher numa teocracia

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Por Emilio de Gorgot Alguma vez teremos imaginado como seria viver sob o jugo de uma teocracia ensandecida? Pois se não sabe ao certo qual série ver a seguir eis The Handmaid’s Tale ( O conto da aia ); é a adaptação realizada por Hulu e MGM Televison¹ de uma obra publicada nos anos oitenta pela respeitadíssima escritora Margaret Atwood (ganhadora, entre outros vários prêmios, do Príncipe de Astúrias de Letras). Para vê-la, melhor escolher um dia bonito e quando estiver com as defesas altas, porque a história que conta, embora fictícia, é temerosa. A narrativa descreve um futuro distópico em que os Estados Unidos, depois de sofrer uma série de calamidades ambientais, caiu numa ditadura que arrastou toda a sociedade ao terrífico estado de autoritarismo puritano, em que cada âmbito da vida é regido por uma interpretação insana da Bíblia. Uma epidemia de infertilidade tornou poucas mulheres capazes de conceber bebês em “aias”, uma classe social especificamente adestrada p...

Múltipla escolha, de Alejandro Zambra

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Por Pedro Fernandes Ao falar sobre avaliação que dava acesso à universidade no Chile, o narrador de um dos textos que compõem Múltipla escolha diz que esta era produto de sistema educacional falido; bastava ao estudante “entrar no jogo e adivinhar a pegadinha”. Esta observação recupera a natureza do livro de Alejandro Zambra, uma dentre as experiências literárias mais radicais das criações deste início de século. Este livro é uma encenação da falibilidade da literatura numa era quando à forma e à estrutura não escapam outras alternativas de reinvenção. Marcado pelo discurso fatalista da impossibilidade da narrativa, discurso aliás do qual seguramente o escritor trata de zombar, é uma obra construída como provocação à ordem. Uma ode ao caos e a variabilidade das formas e estruturas estéticas e sociais. O escritor chileno se apropria de uma estrutura não-literária, um certame objetivo muito em voga no seu país até meados do início deste século – no Brasil, esta avaliaçã...

Rodin, de Jacques Doillon

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Por Pedro Fernandes Rodin é uma das figuras mais importantes da arte moderna. De formação clássica e contra esta não ensaiou quaisquer movimentos de rebeldia político-estética, como foi comum a muitos artistas modernistas de seu tempo, preferiu demonstrar a virulência do gênero através da construção de uma obra se tornou revolucionária. Que o escultor francês seja uma referência, uma das mais importantes figuras das artes no entre-séculos XIX e XX, gênio marcado pela sensibilidade inscrita num trabalho que é a um só tempo uma ousada releitura dos temas tradicionais das artes clássicas e uma alegoria celebrativa do corpo ou da genialidade dos homens de seu tempo, ninguém duvidará. Agora, que sua biografia seja dotada dos grandes eventos dramáticos, comuns a quase todos os gênios criadores, é algo a se verificar e, uma das possibilidades, encontra-se no filme de Jacques Doillon. E a questão é, fora as implicações pelo reconhecimento, os arroubos temperamentais e os embat...

Sierguéi Iessiênin, o último poeta da aldeia

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Por Jorge Teillier Uma tarde antes do Natal de 1925 um soturno viajante pedia alojamento no Hotel Angleterre de Leningrado. Durante três dias tranca-se no quarto e cai num estado de embriaguez. Finda por se afogar, não sem deixar escrito com seu próprio sangue um poema que termina dizendo: “Adeus amigo, sem mãos nem palavras / Não faças um sobrolho pensativo. / Se morrer, nesta vida, não é novo, / Tampouco há novidade em estar vivo!”*. Quem se mata aos trinta anos de idade deixando como testamento estas linhas é Sierguéi Iessiênin, considerado juntamente com Maiakóvski e Boris Pasternak o mais importante poeta russo-soviético, sendo os três considerados como destaca Sophie Laffitte “figuras mitológicas contra o fundo apocalíptico da Revolução”. A vida de Iessiênin começa como uma espécie de conto de fadas. Nasceu no centro da Rússia, na aldeia de Konstantinovo, próximo de Riazán. Filho de camponeses, seus pais o haviam destinado a ser professor primário, mas se ...