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Isaac Bashevis Singer. O prêmio Nobel mais sozinho

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Por Rafael Conte Isaac Bashevis Singer. Foto: Yousuf Karsh.   A última e, por enquanto, a mais persistente tentativa de reafirmar a literatura em sua vocação de eternidade foi durante o último século o Prêmio Nobel de Literatura. E fê-lo através de duas características — a sua dimensão e a sua independência — que veio a adquirir, ainda que de forma bastante desigual, uma relevância que, apesar do seu prestígio, parece por vezes beirar o patetismo, dissolvido entre o súbito impacto da sua concessão e a efemeridade de suas propostas. Algumas propostas que nem sequer sobrevivem nas habituais disputas daquelas perguntas e respostas caprichosas com as quais nossas televisões tentam falsamente se convencer (e aliás a nós mesmos) de que cumprem uma função cultural, pois bem. Pois bem, nossa contradição fundamental é que a abundância de informação se autodestrói em uma pressão onde a densidade da atualidade leva à pura e simples aniquilação da cultura, pela falta de descanso, valorização e...

O silêncio de Hofmannsthal

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Por Rafael Narbona Hugo von Hofmannsthal. Foto: Arquivo Sociedade Hofmannsthal.   Hugo von Hofmannsthal (1874-1929) foi um escritor precoce. Nascido em Viena e descendente de italianos, compôs toda a sua obra lírica entre os dezessete e os vinte e cinco anos. Durante esse período, ele também escreveu algumas peças dramáticas curtas, como Ontem , O louco e a morte e O pequeno teatro no mundo , nas quais a influência do teatro espanhol do século XVII e, mais especificamente, de Calderón de la Barça é notada. É a época em que ele se relaciona com Stefan George e sua revista Folhas para a arte , embora nunca tenha chegado a subscrever plenamente a ideologia estética desse círculo poético. Durante esses anos, viaja pela Europa, visitando Paris e Veneza. Como outros autores que cresceram na severa profundidade da cultura germânica, ele ficará deslumbrado com a luz do Mediterrâneo, onde a beleza não é produto de meditação ou esforço, mas algo que se manifesta espontaneamente, como um dom...

Boletim Letras 360º #478

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    DO EDITOR   1. Caro leitor, eis o terceiro número deste Boletim no mês de abril. Aqui estão parte das notícias divulgadas durante a semana em nossa página no Facebook e outras que poderão ainda aparecer por lá ou são exclusivas aqui.   2. Reitero, o convite para o sorteio do mês de maio no clube de apoios ao Letras. Desta vez, três livros da editora-parceira Companhia das Letras: romance O avesso da pele , de Jeferson Tenório; o livro de contos Gótico nordestino , de Cristhiano Aguiar; e o romance Ossos secos escrito pelo coletivo formado por Luisa Geisler, Marcelo Ferroni, Natalia Borges Polesso e Samir Machado de Machado.   3. Para se inscrever é simples. Envia R$25 através do PIX blogletras@yahoo.com.br ; finalizada a operação, envia neste mesmo endereço (nosso e-mail) o comprovante. O sorteio está previsto para o dia 29 de maio. A escolha dos títulos desta vez sublinha o Dia da Literatura Brasileira (celebrado no primeiro dia do próximo mês) e a plurali...

Mimesis e a sua importância para o estudo da Literatura

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Por Lucas Pinheiro Rafael Sanzio. Escola de Atena , 1509-1510 (afresco/ detalhe)   Estudar a arte é refletir a competência que o ser humano possui ao expressar alegoricamente o abstrato. E se existe um vínculo entre o sentimento, a comoção, e a obra, é possível assimilar tais vínculos entre a realidade da obra literária, e a realidade do autor — baseada naquilo que consideramos como nossa realidade, demarcada pela passagem do tempo histórico e convívio social, além de outros fundamentos que podemos enfatizar para evidenciar a realidade.   Sintetizar esse primeiro conceito que foi abordado, é necessário para entendermos que a questão entre criador e criação não se aparta, porque o criador de uma obra é envolto por determinada fenomenologia para que seja possível a inspiração ocasionar a criação da obra, digo isso concernente às obras literárias, ilustrações, esculturas ou qualquer outra forma de expressão artística.   Contudo, nesta análise da Poética, mais especificamente...

O Modernismo por metástase

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Por Pedro Fernandes   O Modernismo acabou. O Modernismo continua. Lidas separadamente é possível perceber apenas o valor contraditório de uma afirmativa em relação a outra. Mas, multiplicando o complexo de contradições, elas juntas designam bem o destino de um acaso que se expandiu mesmo fora das suas fronteiras, além de assinalar que este se fez do inadiável fim do espírito de uma época marcado ora pela sua autoconsciência, ora pelo interesse centrado sempre no passo mais adiante.   Entre nós a aventura modernista tomou como marco um evento articulado entre um grupo de inquietos espíritos e um grupo abastado interessado em suprir sua deficiência cultural pela abastança do capital, visto que, desse lado do Atlântico nem sempre as duas coisas coincidem. Mas quando paulistas e fluminenses se reúnem no Teatro Municipal de São Paulo graças à intervenção do baronato do café, o moderno estava disperso variadamente pelo mundo e já por um Brasil sempre aberto às novidades trazidas do...

Cesária Évora, de Ana Sofia Fonseca

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Por Solange Peirão Cesária Évora. Foto: Eric Mullet.   A diva dos pés descalços   Foi assim que ficou mundialmente conhecida a cantora cabo-verdiana Cesária Évora. Nascida na Ilha de São Vicente em 1941, lá faleceu em 2011, com setenta anos.   O festival brasileiro É tudo verdade incluiu, em sua programação de 2022, um belo documentário sobre ela, a Cize, como era tratada carinhosamente pelos amigos. Esperemos que, em breve, esteja disponível nos cinemas e nas redes do streaming .   A língua dominante no documentário é o crioulo, dos habitantes de Cabo Verde, muitas vezes mesclado ao português, com narradores ocasionais em francês.   A intenção maior do filme é contar a vida de Cesária, de cantora local aclamada, a “rainha sem vintém”, como aqui a chamavam, que ascende ao estrelato internacional, só a partir dos seus 47 anos. E, evidentemente, homenagear, essa que foi a grande cantora das mornas e coladeiras, estilos musicais típicos de Cabo Verde. Cesária fo...