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Como Flaubert transformou Madame Bovary numa pessoa e outros segredos do seu êxito

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Por Winston Manrique Sabogal Madame Bovary. Charles Léandre, 1931.   “Madame Bovary sou eu”, disse Gustave Flaubert. Somos todos Madame Bovary. Madame Bovary está em cada pessoa, o que acontece é que só ela teve coragem de ser fiel a si mesma indo atrás de seus sonhos, de seu ideal sem razão. Puro impulso romântico.   Gustave Flaubert recriou o extraordinário jogo cervantino em que a imaginação e os desejos do personagem colonizam sua vida real e rompem a realidade com a ficção, neste caso indo atrás do amor que acaba sendo para ela uma miragem.   “De Flaubert sempre me surpreendeu sua enunciação mítica ‘Madame Bovary c’est moi’ e o que ele teve que enfrentar quando se ‘feminizou’ literariamente”, explica a escritora porto-riquenha Mayra Santos-Febres.   Aquela “Madame” que o habitou e que por meio dela falou em seu romance, acrescenta Santos-Febres, “começou, junto com Anna Karenina e outros romances fundacionais do romantismo e da modernidade, a entrada do sujeito ...

Literatura e exílio. As vozes do naufrágio da Europa

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Por Andrés Seoane Ilustração: Darién Sánchez   “De quantas coisas e quantas vezes nós, exilados, emigrantes, tivemos que nos despedir!”, exclamou o escritor austríaco Stefan Zweig em 1939 no funeral de outro paradigma do habitante de fronteiriço, seu amigo Joseph Roth. Apenas três anos depois, fugindo de tudo no Brasil, ele próprio faria a última viagem devorado pela angústia.   Anedotas como essa, assim como a história de seus próprios protagonistas, a reconstrução de um mundo à deriva e a necessidade de todos esses protagonistas, os mais brilhantes escritores e intelectuais do século XX europeu que não cumpriram a profecia anunciada por María Zambrano — “O exilado é o devorado pela história” — são as fibras com as quais a ensaísta e crítica literária Mercedes Monmany (Barcelona, ​​1957) tece Sin tiempo para el adiós (Sem tempo para o adeus, em tradução livre), um volume monumental e abrangente em que ela condensa a história do que outro viajante, o poeta León Felipe, chamou...

As pontes possíveis. Identidades à deriva em “De amor e trevas”, de Amós Oz

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Por André Cupone Gatti Amós Oz. Foto: Leemage   I.   Quando o escritor israelense Amós Oz publicou, em 2002, o seu romance De amor e trevas , já era um autor de renome, premiado e com uma obra sólida. A dimensão testemunhal desse livro, no entanto, bem como a sua trama multívoca e bem tecida entre passado e presente, memória e invenção, História e subjetividade, fez dele uma espécie de súmula ou síntese do universo que permeia toda a obra de Oz. Romance que se vai desfolhando em temas variados e complementares, De amor e trevas trança, propositadamente, os traumas de um menino aos traumas de uma nação recém-nascida, as frustrações e alegrias de ambos, e, acima de tudo, as suas profundas contradições. O romancista nos mostra quão imensuráveis são as esferas internas e externas da existência, e como elas se continuam e se confundem.   Não só os anos 1940 e 1950 em Eretz-Israel, mas toda uma sorte de paisagens do leste europeu dos séculos XIX e XX são reconstruídas no roman...

Boletim Letras 360º #504

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    DO EDITOR   1. Caro leitor, até o mês de novembro, lembrarei aqui sobre o sorteio que agora o blog realiza com o apoio da Editora Trajes Lunares. A casa disponibilizou dois Kits de livros para sorteio entre os participantes do nosso clube. Este clube de apoios é uma das alternativas para ajudar este blog com o pagamento das despesas anuais de hospedagem na web e domínio.   2. Para participar dos sorteios é simples. Envia um PIX a partir de R$15 a blogletras@yahoo.com.br; para saber mais sobre os livros da Trajes Lunares disponíveis e sobre outras formas de apoiar, visite aqui . E lembro que: a aquisição de qualquer um dos livros pelos links ofertados neste Boletim garante a você desconto e ajuda ao blog sem pagar nada mais por isso .   3. Um rico final de semana com boas leituras! Marcel Proust. Foto Researchers RM.   LANÇAMENTOS Os dois primeiros volumes da nova tradução para a obra-prima de Marcel Proust 1.  Para o lado de Swann  é o prime...

Agustina Bessa-Luís, a inteligência do incomensurável

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Por Silvina Rodrigues Lopes * Agustina Bessa-Luís. Foto: Egidio Santos.   Agustina Bessa-Luís nasceu em Vila Meã, Amarante, em 15 de outubro de 1922, e faleceu no Porto em 2019. Publicou o seu primeiro livro, Mundo Fechado , em 1948, tendo escrito e publicado posteriormente alguns contos extraordinários, várias dezenas de magníficos romances, alguns dos mais interessantes textos sobre literatura e diversas crónicas, reunidos respetivamente em Contemplação Carinhosa da Angústia e A Alegria do Mundo . Essa vasta e intensa obra compõe um movimento transformador da literatura, que se não prende a fórmulas ou modelos e que não deixa de inventar o passado, devolvendo-o à dispersão, que é o seu modo de tocar o presente. Na verdade, não há em Agustina uma tradição da história do romance ou das ideias em que a sua escrita se integre. Percebe-se que o que escreve é diálogo com um mar sem fim de leituras — em que o mais antigo não desaparece sob a exigência da atenção à atualidade —, onde se...