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Machado de Assis, histórias sem data, papéis avulsos

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Por Pedro Fernandes Por vaidade, a mãe impede o casamento da própria filha. O drama do maestro que não consegue compor suas próprias músicas. A igreja em que os fiéis praticam o bem às escondidas. Histórias sem data  é um novelo de enredos machadianos publicado em 1884, no auge da maturidade intelectual do escritor brasileiro, dada a publicação de seu romance Memórias póstumas de Brás Cubas , de 1881, considerado a obra-prima e o divisor de águas na sua escrita. O debate em torno dos regimes políticos, dos bons e maus costumes – estes últimos, principalmente – da sociedade carioca e brasileira, acerca das fraquezas, tiques maníacos, loucuras e razões humanas; os ciúmes e a criação da célebre trama em torno de uma traição ou não – nunca se soube até hoje – em que é pintado a letra e papel a Monalisa brasileira, que semelhante à outra, a de Da Vinci que jamais se descobriu o enigma do seu sorriso, jamais se descobriu o enigma dos olhos de ressaca de Capitu; mesmo que depoi...

Itinerários da poesia de Zila Mamede

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Zila e eu* Por Manoel Onofre Jr.  Já conhecia Zila Mamede de nome quando tive com ela o primeiro contacto pessoal. Foi por volta de 1960. Trabalhava eu na Biblioteca da Faculdade de Direito de Natal, como auxiliar de bibliotecário, e Zila, já então diplomada em Biblioteconomia, aparecia por lá, vez ou outra, para orientar a diretora da biblioteca, D. Dudésia, uma senhora corpulenta, de voz e gestos dramáticos, rádio-atriz nas horas vagas. Eu guardava na gaveta um poema (?), o primeiro até então, único que cometera. Certo dia, criei coragem e mostrei-o a Zila. Precisava do aval da poeta, a festejada autora de “Rosa de Pedra” e “Salinas”. Ela ia passando, apressada, diante do meu birô, e mal se deteve para receber o “poema”; leu-o, rapidamente, e entregou-me de volta, com um reparo quanto à utilização da palavra “embalsamado”. Nada mais me disse, nem lhe foi perguntado. Minhas veleidades de poeta morreram naquele instante. Algumas décadas depois, eu volta...

O extraordinário e o subtil em Saramago

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Por James Wood O filósofo Bernard Williams escreveu um artigo, “O Caso Makropulos”, onde argumentava que a vida eterna seria tão entediante que ninguém a conseguiria suportar. De acordo com Williams, a monotonia que define um ser eterno representaria um infinito deserto de experiências repetitivas que o levaria a uma existência esvaziada de qualquer definição. Essa é a razão que leva, na peça de Karel Capek, da qual Williams retirou o seu título, Elina Makropulos (com os seus 342 anos de idade) a deixar de beber o elixir da eterna juventude, o que faz desde os seus 42 anos, optando por morrer. A vida precisa da morte para se realizar; a morte é o período negro que define a sintaxe da vida. Em “As Intermitências da Morte” (...), José Saramago, um escritor de longas e ininterruptas frases, produziu uma narrativa que funciona como uma experiência na área de Capek/Williams. (O romance não faz alusão a nenhum dos dois). À meia-noite de uma véspera de Ano Novo, num país sem nom...

70 anos de Vidas Secas

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Por Fabiano Mendes   Obviamente, o título deste artigo se refere ao livro de Graciliano Ramos, escrito em 1938. No mesmo ano em que se comemora o centenário de morte de Machado de Assis, aclamado o maior escritor brasileiro, comemora-se também os 70 anos de uma obra imortal: Vidas Secas, do alagoano Graciliano Ramos – para muitos igual em valor a Machado, mas que, diferentemente deste último, fundador da Academia Brasileira de Letras, ignorou a ABL e fez-se imortal ao aliar a profundidade de seus escritos a uma vida cheia de marcas das angústias, uma vida que foi até certo ponto também muito seca.   Graciliano Ramos de Oliveira nasceu em Quebrangulo  –  AL, em 1892 e morreu em 1953, no Rio de Janeiro. O conjunto de sua obra acompanha de perto a trajetória de sua vida. Afinal, como ele mesmo sentenciou, só escrevia o que via e só sentia o mandacaru. Assim, suas principais personagens e suas memórias e crônicas, todas de fortíssimo teor realista são o resultado dir...

Machado de Assis, memórias póstumas

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Por Pedro Fernandes Cena do filme  Memórias póstumas , de André Klotzel. Memórias póstumas de Brás Cubas , 1881, é a obra do auge da carreira literária do escritor brasileiro Machado de Assis: assim define sua crítica mais especializada. Autor da fina ironia, da fina análise da alma, da fina análise da sociedade e das relações sócio-burguesas, tudo isso me leva apropriar-se do título da obra de Machado para retomar alguns aspectos da vida do escritor que neste setembro de 2008, centenariza-se . Pode não ter tido o reconhecimento merecido ainda em vida – e até teve para sua época –, mas a obra de Machado de Assis é marco na literatura brasileira e eterniza-se ao lado dos grandes clássicos literários. Isso porque o escritor inaugura na língua portuguesa brasileira um estilo novo de se escrever romance num estilo novo de se usar a língua escrita. Machado, um mulato, foi uma criança pobre, neto de escravos alforriados – o Brasil só libertaria seus escravos em 1888, com a lei...

Era uma vez no oeste, de Sergio Leone

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Italiano resgata a grandeza dos westerns  clássicos com história de vingança influenciada pela ópera É curioso que um dos principais artífices do mais americano dos gêneros seja um italiano que nunca fez muita questão de aprender uma palavra de inglês. Apaixonado por westerns desde a juventude, Sergio Leone, fez fama com a trilogia spaghetti , composta por Um Punhado de Dólares (1964, refilmagem de Yojimbo , de Akira Kurosawa), Por uns Dólares a Mais (1965) e Três Homens em Conflito (1966), todos estrelados pelo então pouco conhecido Clint Eastwood e rodados na Itália. Sobretudo nos dois primeiros, a ação é ininterrupta e há pouco espaço para diálogos. Todos fizeram bastante sucesso nos Estados Unidos, o que levou a Paramount a oferecer ao diretor um grande orçamento para rodar um filme. Leone não queria fazer outro western: planeja trabalhar na adaptação de um livro que, anos depois, resultaria em Era uma Vez na América (1984), mas aceitou diante da possibilidade de c...