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A raiz das metamorfoses

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Por Marcelo Moraes Caetano O estudo do sânscrito, tão relevante aos filólogos, tem uma inevitável fronteira com o conjunto sapiencial védico, de mais de 6000 anos de idade, inscrito nos livros mais antigos de que o ser humano tem notícia. O pensador britânico William Jones, em 1786, na confraria denominada “Sociedade de Calcutá”, contribuiu enormemente para desvelar a cortina de fumaça que escondia o elo perdido entre línguas como latim, o grego, as línguas eslavas e germânicas, entre outros troncos linguísticos supostamente díspares, ao demonstrar que suas raízes se fundavam numa protolíngua cujo nome é “Indo-Europeu” – pois o sânscrito veio da Índia e se deflagrou pela Europa; e vice-versa! O idioma sânscrito, como ensinam os mestres, deve ser estudado como fórmulas matemáticas revestidas de poesia, pelo fato, já mencionado, de ser oriundo da tradição védica, cuja busca é a desconstrução das fantasias que semicerram olhos e olhares das sociedades. Inicio esta pequena leitura de A lei...

A madeleine de Proust era originalmente uma fatia de torrada

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Por Mitchell Abidor Ilustração: David Richardson.   Em 1949, a sobrinha de Marcel Proust, Suzy Mante-Proust, entregou ao editor Bernard de Fallois alguns papéis que seu tio havia deixado para seu pai, o irmão mais novo do autor, Robert. Ela pediu que ele desse algum tipo de ordem aos papéis. Fallois conseguiu organizar dois livros póstumos, Jean Santeuil (1952), a primeira tentativa muito grosseira de um romance semiautobiográfico, e, Contre Sainte-Beuve (1954), uma coleção de textos ensaísticos e narrativos, que Fallois chamou de “o sonho de um livro, ideia de livro”.   Em seu prefácio ao Contre Sainte-Beuve , Fallois também escreveu sobre a existência de “ soixante-quinze feuillets ” — 75 folhas — do texto manuscrito da versão mais antiga de Proust para À la recherche du temps perdu . Mas quando um grande número de manuscritos que Marcel deixou para Robert foi doado por Mante-Proust à Biblioteca Nacional da França, essas páginas não estavam entre eles.   Essas páginas...

Boletim Letras 360º #438

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DO EDITOR   1. Olá, como se diz, continuamos a passar o chapéu para arrecadar fundos para custeio do domínio do blog por mais um ano online. Como nos últimos quatro anos, vendemos alguns livros neste bazar . Você pode não se interessar pelos livros, mas ajuda compartilhando esta post com os amigos. 2. Nesta semana, abrimos também a possibilidade de receber doações avulsas via PIX. Para ajudar com qualquer valor basta nos contatar pelo e-mail blogletras@yahoo.com.br ou por uma das nossas redes sociais. 3. A todos que de alguma maneira nos ajudaram até aqui, reiteramos publicamente nossos agradecimentos. E, continuamos. Boas leituras! Joseph Conrad. Foto: The Granger Collection / Forum   LANÇAMENTOS Obra pouco conhecida de John Milton, mas igualmente grandiosa, ganha tradução e edição no Brasil .   Composta em versos trágicos à moda clássica, a peça dramática de Milton acompanha as últimas vinte quatro horas do herói bíblico Sansão, já cego após ter sido traído por D...

La Fontaine, quatrocentos anos de “Era uma vez...”

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Por Marta Ailouti Ilustração: Henri Galeron   “Muitas vezes encontramos nosso destino nos caminhos que tomamos para evitá-lo”, dizia Jean de La Fontaine. Pai da fábula moderna, o francês reescreveu muitas das histórias de Esopo e Horácio, mas também das tradições orientais, adaptando-as ao seu tempo, com um estilo mais refinado em forma de poesia. São dele as versões de “A cigarra e a formiga”, “O gato e o rato” ou “A raposa e o busto” que todos conhecemos hoje, contos de moral, máximas de sobrevivência e instrumentos pedagógicos de primeira ordem nos anos em que a cultura popular ainda era plenamente oral.   Escritor fundamental da literatura francesa, Flaubert disse que ele era o único capaz de compreender e dominar as texturas da língua gaulesa. Quando se cumprem 400 anos após o nascimento do escritor, um dos mais traduzidos e lidos do mundo, a editora Libros del Zorro Rojo publica uma edição comemorativa de suas fábulas, ilustradas por outro artista virtuoso, Marc Chagall,...

Notas para uma definição do leitor ideal, de Alberto Manguel

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Por Pedro Fernandes Alberto Manguel. Foto: Bruno Simão. Na nota em modo de preâmbulo a estas Notas para uma definição do leitor ideal , Alberto Manguel diz: “Cada livro, cada história pode ser, assim como para Sherazade, uma estratégia contra a morte; pode ser também um projeto para uma vida melhor, como Dante imaginou, ou pelo menos um pouco mais justa, como sonhou D. Quixote. Acho que é apenas isso, com ligeiras variações, o que venho repetindo nos meus textos desde o princípio, há muito tempo.” Esses instantes de alumbramento se fazem recorrentes ao longo dos ensaios reunidos neste livro — prefiguram o que poderíamos designar como uma segunda voz, a de um leitor, atento à tarefa de inferir sobre o que assevera o ensaísta, muitas vezes, assumindo-se parte própria da constatação. Esta é uma maneira interessante de demonstrar que a ensaística, pelo menos nesse caso, se organiza sob um duplo par de olhos, o do escritor e o do leitor; é a transferência para o convívio interno do tecido t...

Extraordinários e malditos

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Por Laura Fernández Stanley Elkin. Foto: Marion Ettlinger   É uma noite de inverno em Nova York. No reservado de um pequeno bar subterrâneo na North Square, que serve coquetéis com o nome da mulher que urbanisticamente salvou Manhattan, Jane Jacobs, A. M. Homes, a escritora, fala sobre sua filha adolescente e Stanley Elkin. Ela diz sobre sua filha que está preocupada porque não sabe realmente o que se passa em sua cabeça. É um mistério, diz. E algo complicado, porque tem amigos complicados. Sobre Stanley, diz que também era um cara complicado, mas o que fazia ia me agradar porque era “muito engraçado”. “Ele era do Brooklyn”, diz. “Como Gilbert Sorrentino”, acrescenta também. Quase nunca ouvi falar de nenhum deles.   Pesquiso-os. Compro todos os livros de cada um deles que consigo encontrar. Descubro que o primeiro nasceu em 1929 e que o segundo nasceu um ano depois. Imagino suas mães cruzando-se com eles em carrinhos de bebê pelas ruas do Brooklyn. Fantasio que se viram t...